Física “Desfeita”?!
Cientistas anunciaram oficialmente nesta sexta-feira (a astroPT anunciou na quinta-feira, dia 22 de Setembro) que partículas subatómicas chamadas neutrinos podem ter passado o limite da velocidade máxima, a velocidade da luz. Mas, de acordo com a teoria especial da relatividade de Einstein, nada pode ultrapassar essa barreira. Assim, ou as medições estão incorretas, ou então muita da Física terá que ser revista. Aqui estão as mais importantes.
Relatividade Especial
A velocidade da luz representa a espinha dorsal da teoria de Einstein (1905) da relatividade especial. Essa lei acaba com o conceito de velocidade absoluta, e em vez disso diz que o movimento é relativo. Exceto para a luz. Todos os observadores, independentemente da sua própria velocidade, irão medir a velocidade da luz numa constante de 299 792 458 metros por segundo. Esta velocidade representa o mais rápido que qualquer coisa pode viajar, um limite máximo absoluto do movimento.
As novas descobertas ameaçam derrubar esta lei confiável. “De acordo com a relatividade, é preciso uma quantidade infinita de energia para que algo se movimente mais rápido que a luz”, disse o físico Robert Plunkett do laboratório Fermilab. “Se estas coisas estão a mover-se mais rápido que a luz, então estas regras tem de ser reescritas. “
Inclusive, teorias que já foram descartadas teriam que ser reconsideradas.
Viagens no Tempo
A relatividade especial afirma que nada pode viajar mais rápido que a velocidade da luz. Se algo vier a exceder este limite, seria retroceder no tempo, de acordo com a teoria.
A nova descoberta levanta todo tipo de perguntas espinhosas. Se os neutrinos estão realmente a viajar mais rápido que a luz, então devem ser viajantes do tempo. As partículas poderiam, teoricamente, chegar em algum lugar antes de partir.
Causa e Efeito
A lei fundamental da física, na verdade, de toda a ciência, é a causalidade: que toda a causa sempre precede um efeito. Esta regra foi aceite na Física Clássica (Newton), e a teoria da relatividade especial teve o cuidado de preservar o Estado, apesar da relatividade do movimento de um objeto.
Mas se algo pode viajar mais rápido que a luz, pode viajar para trás no tempo, de acordo com a teoria. Neste caso, um “efeito” pode viajar de volta para um ponto antes de sua “causa” ocorrer – por exemplo, um bebê balançando antes que ele recebe um empurrão. Tal resultado seria heresia científica, certamente exigindo algum apressado reescrever das leis para preservar a causalidade.
“A maior parte da estrutura teórica que foi erguido no século 20 tem contado com esse conceito de que as coisas tem que são mais lentas que a velocidade da luz”, disse Plunkett. “Pelo que entendi se tiver algo a viajar mais rápido que a velocidade da luz pode ter coisas acontecendo antes de suas causas.”
O Modelo Padrão
O Modelo Padrão é o nome da teoria reinante da física de partículas, que descreve todas as partículas subatómicas conhecidas que compõem o nosso universo.
Mas se a regra da velocidade da luz, e a teoria da relatividade são reescritas, este modelo também pode necessitar de ajuste.
“Um dos fundamentos do Modelo Padrão é a relatividade especial”, disse Stephen Parke, diretor do departamento de física teórica no Fermilab. “Se começar a abanar a fundação, terá que começar a abanar com a casa também no topo. “
Teoria das Cordas
A teoria das cordas é a ideia de vanguarda de que todas as partículas fundamentais são realmente pequenas vibrações de laços de corda. Esta suposição acaba por ter implicações de grande alcance, incluindo a possibilidade de que nosso universo tem dimensões mais do que as conhecidas (três dimensões do espaço e uma de tempo).
A teoria das cordas é incrivelmente difícil de testar, e não há nenhuma prova de que está correta. Mas, se as medições dos neutrinos estiverem corretas, alguns físicos revelam que a teoria das cordas pode oferecer a melhor explicação.
Ou seja, os neutrinos não estão a viajar ao longo de uma linha reta, mas podem saltar numa das dimensões extra prevista pela teoria das cordas, obtendo um atalho para o seu destino. Se eles viajaram numa distância mais curta no tempo medido, então sua velocidade real pode não ter sido superior à da luz.
Neutrinos
Talvez a nova descoberta não significa que qualquer coisa pode viajar mais rápido que a luz, mas apenas os neutrinos. Se for esse o caso, então há definitivamente algo especial que os cientistas não sabiam sobre estas partículas.
Os neutrinos são estranhos: são neutros; partículas sem massa com massa extremamente reduzida*; quase que raramente interagem com a matéria comum; há em vários tipos, chamada de sabores, e eles estranhamente parecem ser capazes de mudar de um sabor para outro. Então é possível que sua habilidade de ser mais rápida que a luz seja também uma característica única.
*Com efeito a massa dos neutrinos não podem ser medidos diretamente. Estima-se que seja, respetivamente, <2,2 eV para o neutrino eletrónico, <170 keV para o neutrino muónico, e 15,5 MeV para o neutrino taónico (valores equivalentes para os seus pares anti-).
Taquiões
Na década de 1960 os físicos sugeriram que podem existir partículas que viagem mais rápido que a luz. Estas partículas, taquiões, só foram teorizadas, nunca detetadas. Por causa das propriedades controversas, incluindo a possibilidade de que violaria a regra da causalidade, muitos físicos consideraram os taquiões uma opção marginal.
No entanto, se a nova descoberta é confirmada, os cientistas podem querer dar uma olhada na teoria dos taquiões.
Supernova 1987A
Uma das peças mais contraditórias de prova para as novas descobertas vem a partir de observações da supernova SN1987A, que fica a cerca de 168.000 anos-luz da Terra, na Grande Nuvem de Magalhães. Observações, dessa estrela morta, realizadas pelo experimento Kamiokande II, no Japão descobriu que a luz e os neutrinos, que partiram da supernova chegaram à Terra com poucas horas de diferença (primeiro a luz e três horas mais tarde os neutrinos). A diferença deveu-se, em primeiro lugar, porque os neutrinos formaram-se no colapso do núcleo da estrela e iniciaram a sua viagem nesse momento, atravessando a estrela quase sem interagirem com a matéria nas camadas exteriores. Por outro lado, a primeira luz proveniente da explosão só foi emitida algumas horas depois, quando a onda de choque gerada pelo colapso do núcleo, e que se propagou pela estrela, atingiu a sua superfície. Na realidade, se os neutrinos viajam a uma velocidade superior à da luz, deveriam ter chegado à Terra ainda mais cedo.
No entanto, as novas descobertas não estão de acordo com este resultado. Sugere-se, em vez disso, que os neutrinos realmente superam a velocidade da luz em 60 nanossegundos, ao percorrer pouco mais de 730 quilómetros.
Parece que uma revisão, quer da medição da supernova, ou os resultados do s neutrinos, colocará tudo em ordem.
Evolução dos Primórdios do Universo
Muitos outros aspetos da astronomia também poderão ser afetados se a nova descoberta se mantiver. Algumas ideias importantes sobre a história do universo, na verdade, são baseados em medições de neutrinos e teorias.
“Neutrinos são abundantes no início do universo e se comportam de maneira diferente, isso afeta os cálculos da evolução do universo primordial, a nucleossíntese e as sementes de formação de estrutura”, o astrónomo Derek Fox, da Pennsylvania State University escreveu em um email enviado para LiveScience.
Além disso, os neutrinos são produzidos nas reações de fusão nas estrelas, por isso, se essas partículas se comportam de maneira diferente do que se pensava, os modelos dos mecanismos relativamente às estrelas poderão ter que ser revistos.
—
Traduzido e Adaptado de LiveScience, de várias ideias trocadas no mural da astroPT e de emails no facebook.
“And god said let there be neutrinos, but there were already neutrinos.” Tom Dykes
21 comentários
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Se nada pode ultrapassar a velocidade da luz, como conseguimos medi-la? A própria possibilidade de medir a velocidade da luz torna-se um paradoxo. Indica que o tempo é mais rápido
Não entendi.
Se eu coloco um detetor de luz onde eu estou e outro detetor a 100 metros de mim. Se quando ligo a luz, vejo a hora. Depois desloco-me ao outro e vejo a hora que o outro detetor recebeu a luz. Como isso faz o tempo ser mais rápido?
Author
Ao que tudo indica será o Fermilab a ter essa tarefa de confirmar (depois de sofrer uma atualização para diminuição dos erros e incertezas).
O João Magueijo propõe que a velocidade da luz não é uma constante e sim que variou consoante a evolução do universo. O objectivo dele era dar uma alternativa à teoria da inflacção cósmica, que a meu ver tem mais lógica. Agora, esta situação dos neutrinos acho que não deve ser levada com tanta euforia. Novas experiências deverão ser feitas para comprovar a sua veracidade e a reformulação da física. Mas que é uma descoberta fenomenal, ai isso é!
A Teoria das Cordas seria uma delas?
Abraço.
Não me parece que isto tenha a ver com a Teoria das Cordas… 😛
“(…) Os neutrinos são estranhos: são neutros; partículas sem massa”
Heinhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh, como assim? Partículas sem massa?!
Author
Muitos dos cientistas desprezam-na por ser extremamente reduzida e estimada, pois não é possível fazer uma medição direta da sua massa. Mas, não pode ser desprezada nesses efeitos relativísticos.
Obrigado pela atenção. Já está corrigido no texto.
O texto representa algumas ideias, loucas ou não, de teorias que foram abandonadas ao longo dos tempos e que esta experiência voltou a levantar.
Muitas delas são discutíveis, outras não.
A Teoria das Cordas seria uma delas?
BTW, os neutrinos (tipo electrão) têm massa. Este facto resulta de imediato da existência do mecanismo de mudança de sabores (entre os 3 sabores de neutrinos: neutrino electrão, neutrino muão e neutrino tau). Não foi possível medi-la com precisão mas será certamente muito pequena.
Author
Com efeito a massa dos neutrinos não podem ser medidos diretamente. Estima-se que seja, respetivamente, <2,2 eV para o neutrino eletrónico, <170 keV para o neutrino muónico, e 15,5 MeV para o neutrino taónico (valores equivalentes para os seus pares anti-).
Olá José,
só uma pequena correcção. Os neutrinos da supernova 1987A chegaram à Terra horas **antes** da luz proveniente da mesma. Isto não se deveu ao facto de os neutrinos serem mais rápidos do que a luz. De facto, os neutrinos formaram-se no colapso do núcleo da estrela e iniciaram a sua viagem nesse momento, atravessando a estrela quase sem interagirem com a matéria nas camadas exteriores. Por outro lado, a primeira luz proveniente da explosão só foi emitida algumas horas depois, quando a onda de choque gerada pelo colapso do núcleo, e que se propagou pela estrela, atingiu a sua superfície.
Na realidade, se os neutrinos viajam a uma velocidade superior à da luz, deveriam ter chegado à Terra ainda mais cedo.
Author
Exato. Daí as dúvidas realtivamente à velocidade com que os neutrinos se deslocam.
Mas no artigo escreveste:
“…descobriu que a luz e os neutrinos, que partiram da supernova chegaram à Terra com poucas horas de diferença (primeiro a luz e três horas mais tarde os neutrinos).”
😉
Author
Correções feitas! Obrigado Luís 🙂
Não concordo nada com algumas das coisas que disseste 😛
“partículas subatómicas chamadas neutrinos podem ter passado o limite da velocidade máxima, a velocidade da luz.”
O artigo fala em atravessar a barreira ou fala somente que elas viajaram mais rápido que a luz?
Parece-me o segundo…
“Esta velocidade representa o mais rápido que qualquer coisa pode viajar, um limite máximo absoluto do movimento.”
Não, parece-me que representa somente uma barreira, já há muito tempo.
“A relatividade especial afirma que nada pode viajar mais rápido que a velocidade da luz.”
Onde?
O que me parece que a Relatividade diz é que tu, ou qualquer objecto com massa, não pode ir aumentando de velocidade indefinidamente e atingir a velocidade da luz. Porque ao atingir essa velocidade, teria massa infinita e precisaria de energia infinita.
Não me parece que diga nada sobre já se estar acima da velocidade da luz.
“Se algo vier a exceder este limite, seria retroceder no tempo, de acordo com a teoria.”
Porquê?
Se eu chegar a Proxima Centauri (que está a 4 anos-luz) em 2 anos, viajei a velocidades superiores à da luz… mas fiquei mais velho 2 anos, e não mais novo.
Aliás, o próprio Einstein considerou isso:
http://www.astropt.org/2009/01/31/teoria-da-relatividade-dilatacao-do-tempo/
Precisamente porque não existe Tempo Absoluto Universal… se calhar foi este o problema da experiência, os cientistas acharem que medem o Tempo Absoluto nos “relógios” deles.
“As partículas poderiam, teoricamente, chegar em algum lugar antes de partir.”
Como??? (em face do que eu acabei de dizer)
Só se assumires uma marcação de tempo absoluto universal… o que é o oposto do que Einstein dizia.
Como disse em cima, se calhar o problema da experiência é este: medirem o tempo de forma absoluta.
“Mas se algo pode viajar mais rápido que a luz, pode viajar para trás no tempo, de acordo com a teoria. Neste caso, um “efeito” pode viajar de volta para um ponto antes de sua ”causa” ocorrer – por exemplo, um bebê balançando antes que ele recebe um empurrão.”
Como se percebe, não entendo as coisas deste modo 😛
“Os neutrinos são estranhos: são neutros; partículas sem massa;”
Parece-me que os neutrinos têm massa, mas assume-se como não tendo, certo?
http://en.wikipedia.org/wiki/Neutrino#Mass
Concluindo, muita coisa aqui para responderes 🙂
abraços
Author
“O artigo fala em atravessar a barreira ou fala somente que elas viajaram mais rápido que a luz?
Parece-me o segundo…”
– Se viajam mais rápido que a luz, à luz das teorias atuais, implica que a sua velocidade fosse superior à da luz.
– O próprio artigo baseia os cálculos de dt, comparando as velocidades [(v_neutrinos-c)/c]
“O que me parece que a Relatividade diz é que tu, ou qualquer objecto com massa, não pode ir aumentando de velocidade indefinidamente e atingir a velocidade da luz. Porque ao atingir essa velocidade, teria massa infinita e precisaria de energia infinita.
Não me parece que diga nada sobre já se estar acima da velocidade da luz.”
– Na expressão
E = γm c2
temos que γ = 1/(√(1-(v/c)2))
O que significa que v não pode ser superior a c. A própria expressão impõe esse limite.
http://en.wikipedia.org/wiki/Speed_of_light
[“Se algo vier a exceder este limite, seria retroceder no tempo, de acordo com a teoria.”]
“Porquê?
Se eu chegar a Proxima Centauri (que está a 4 anos-luz) em 2 anos, viajei a velocidades superiores à da luz… mas fiquei mais velho 2 anos, e não mais novo.
– Mas, se regressares à Terra serás mais novo do que os terráqueos 😉 http://en.wikipedia.org/wiki/Twin_paradox
– A métrica de Gödel (http://en.wikipedia.org/wiki/Gödel_metric) explica esse regresso no tempo. É uma teoria e duvido que seja demonstrável futuramente.
“Precisamente porque não existe Tempo Absoluto Universal… se calhar foi este o problema da experiência, os cientistas acharem que medem o Tempo Absoluto nos “relógios” deles.”
[“As partículas poderiam, teoricamente, chegar em algum lugar antes de partir.”]
“Como??? (em face do que eu acabei de dizer)
Só se assumires uma marcação de tempo absoluto universal… o que é o oposto do que Einstein dizia.
Como disse em cima, se calhar o problema da experiência é este: medirem o tempo de forma absoluta.”
– Foi considerado o efeito relativístico na experiência.
– Mas, imagina que os neutrinos percorressem uma distância muito inferior…
Mas penso que o artigo não fala em “atravessar” essa barreira 😛
A expressão é para objectos a velocidades inferiores à da luz…
Ao usarmos a mesma expressão, é o mesmo que usares Newton para velocidades perto da luz 😛
Não. Terei envelhecido menos que os terráqueos.
Não quer dizer que sou mais novo… envelheci na mesma 😛
http://www.astropt.org/2009/01/31/teoria-da-relatividade-dilatacao-do-tempo/
Foi considerado… mas comparado a um efeito absoluto. Pelo menos foi o que me deu a entender.
Também sugiro a discussão no Facebook 😉
http://www.facebook.com/astropt/posts/253096568059615
http://www.youtube.com/watch?v=rJp86_tj9KQ
😛
Author
Eles consideraram os efeitos relativísticos na medição desses acontecimentos. Pelo que entendi a determinação do tempo foi “computacionado” e depois comparado com o determinado experimentalmente.
E o Manel Martins corrobora: “são medições das probabilidades dos eventos versus a sua ocorrência”.
Também sugiro a discussão no Facebook para quem quizer entrar em mais pomenores 😉
Não foi um cientista português, o João Magueijo, que escreveu sobre isto?
Não me parece.
Do que me lembra do que li no livro dele, ele fala de Velocidade da Luz Variável ao longo do tempo, e não certas partículas ultrapassarem a velocidade da luz actual. 😉
abraço
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