Pseudos, botelhos e aeróbicas quânticas

Eu sou jornalista e vou aproveitar a minha posição privilegiada como observador social – desculpem, deixem-me aclarar a garganta – para explicar algumas ideias sobre pseudos, botelhos e aeróbicas quânticas.

Também tenho o hábito de arranjar sempre um pretexto para mencionar a Scarlett Johansson nos posts que escrevo para o AstroPT e quero aproveitar a oportunidade para revelar que não são referências gratuitas, mas insistências do «astrólogo do Texas».

Também eu tenho bons motivos. Considerem o factor distância e a rapariga em questão. Um cartógrafo leitor da revista Caras poderá dizer-me, com ar céptico, «tu com a Scarlett? A mansão dela na Califórnia encontra-se a mais de 9 mil quilómetros, pá». Um geólogo encolherá os ombros, com ar enfadado: «a Scarlett? Duas placas tectónicas até lhe pores as mãozinhas em cima!»

Contudo, se eu perguntar a um astrónomo, é provável que este sugira observar as estrelas através de um telescópio e anuncie: «9 mil quilómetros? Isso não é nada! Olha para isto. À escala cósmica, é como se tu e a Scarlett estivessem enroscadinhos no bem-bom. Parabéns!»

Portanto aproveito este momento no AstroPT para agradecer à Astronomia tudo o que tem feito pela qualidade da minha vida sexual imaginária.

Ainda não consegui largar as larachas porque me preparo para meter a Física Quântica ao barulho e isso deixa-me sempre à rasca porque percebo tanto de Física Quântica como a Laura Botelho.

Ao escrever aqui sinto-me como se fosse o gato de Schrödinger e o AstroPT a própria caixinha: tanto posso escrever disparates, escrever coisas acertadas ou fazer ambas em simultâneo – depende da pessoa que estiver a ler.

A Física Quântica faz parte da nossa vida, isso até a mim parece óbvio. Os conceitos da Mecânica Quântica são a base de sustentação deste mundo tecnológico que nos rodeia. De certa forma, descobrimos que Deus não é o único que está em todo o lado.

Os cientistas conseguiram compreender uma área que, tal como um polvo, tem agora os seus braços estendidos em muitas outras aplicações do conhecimento, desde lasers, passando pela estrutura das proteínas, e acabando em transístores (a electrónica, como computadores ou microscópios, beneficiou imenso com esta área científica).

Mas é uma área de estudo e investigação tramada, desconcertante e desafiadora até para os próprios físicos. Aos leigos curiosos mas sem bases matemáticas, resta interpretar as palavras que os cientistas conseguem arranjar para transmitir uma ideia, o mais aproximada possível, de fenómenos que só podem ser descritos através da linguagem matemática. Recorrem a alegorias, metáforas, analogias, a tudo o que lhes permita evitar um pelotão de números e fórmulas.

Também vou recorrer a uma analogia para explicar a vocês, físicos e matemáticos, a forma como o leigo se relaciona com que lhe é dito sobre Física Quântica.

Esse relacionamento não é diferente do que temos com a música: podemos adorar o que estamos a ouvir, podem fazer sentido todas aquelas notas e harmonias, mas não sabendo cantar, tocar um instrumento e não conhecendo as notas, ser-nos-á impossível reproduzi-la com exatidão.

Podemos cantarolar a música, tal como podemos «cantarolar» a Física Quântica, conseguindo algumas aproximações ao material original, mas só uma plateia de surdos se deixará convencer de que temos «unhas» para tocar um instrumento e reproduzir uma sinfonia quando só aprendemos dois acordes.

É assim que vejo pessoas como a Laura Botelho: leigos que se transformaram em «especialistas» e que por vaidade, dinheiro, desejo de poder ou mera insanidade de inspiração divino-reptilínea, procuram convencer uma plateia de surdos de que são capazes de reproduzir uma sinfonia de Mahler com dois acordes de guitarra.

Especialistas que tiram «cursos científicos» instantâneos e se predispõem a dar «workshops» de Física Quântica relacionam-na, sem qualquer pudor, com acontecimentos que aquela jamais descreveu ou se debruçou. Têm sucesso porque, quando o lago é pequeno, é muito mais fácil parecer um peixe graúdo. E o lago do conhecimento científico, infelizmente, é mesmo pequeno.

O que faz uma pessoa razoavelmente inteligente noutros aspectos da sua vida a procurar orientação nestes «especialistas» em vez de procurar informar-se com cientistas? Talvez por a Ciência se recusar a responder às perguntas erradas. Dito de outra forma, por não ter em conta a religiosidade do ser humano e a sua propensão para a fantasia, e por ser muito cautelosa nas divagações.

A minha criança, sempre muito curiosa em relação à Astronomia, perguntou-me uma vez durante um daqueles documentários do National Geographic: «Pai, o que havia antes do Big Bang?» Este parece-me um exemplo de uma dessas perguntas que a Física não pode responder porque, filhota, o Tempo surgiu com o Big Bang e portanto, não havendo Tempo, não faz sentido mencionar um «antes» ou um «depois».

Parece-me compreensível que as pessoas procurem dar sentido ao que está para além do horizonte – e é aí normalmente que as imaginações costumam descobrir deuses sentados a tomar um chazinho numa nuvem.

Os pseudos-cientistas apropriam-se da Ciência e fazem-se passar por autoridades em buracos negros e anãs castanhas disfarçados de cometas, anjos ou demónios tecnológicos a que chamam extraterrestres, misteriosos alinhamentos galácticos que por sua vez são alinhados com misteriosas profecias do passado, por aí fora – aceitam todas as premissas erradas e são especialistas em respondê-las. Oferecem o bolo existencial completo e regam-no com o doce e inebriante vinho da conspiração.

O que de outra forma seria incompreensível sem estudo torna-se de fácil e rápido entendimento. E, assim, este mundo cheio de mistérios e contradições começa a fazer sentido outra vez. Não admira por isso que teorias fantasistas, sempre fáceis e acessíveis e luminosas, sejam encaradas como «reais» e a realidade, complicada e trabalhosa e muitas vezes decepcionante, seja olhada com desconfiança.

Conspiradores sem credibilidade como a Laura Botelho só me merecem desprezo, mas sinto pena das pessoas que se deixam levar por palestras de Física Quântica preparadas em cursos instantâneos.

Uma das características que mais me toca no pouco que consegui entender de Física Quântica é pensar que um eletrão se pode comportar como uma partícula ou uma onda, ou como ambas em simultâneo – mas só podermos determinar o seu estado quando o observamos.

É difícil para um leigo evitar cair na tentação de estabelecer uma associação livre e direta entre a consciência do observador (o cientista) e este fenómeno, sem cair em extrapolações metafísicas. É como se estas implicações da Física Quântica o levassem a pensar que, a nível sub-atómico, as partículas estão todas coladas umas às outras com a saliva de Deus.

Devido à sua importância e ao carácter «fantasmagórico» e primordial dos fenómenos que estuda, o leigo pode procurar na Física Quântica respostas às suas dúvidas e ansiedades religiosas.

Mesmo quando o físico Leon Lederman chamou ao bosão de Higgs «a partícula de Deus» não o fez com o objectivo de dar uma dimensão religiosa à Física, mas para transmitir aos leigos a importância de uma eventual descoberta dessa partícula (Lederman também é conhecido pelo sentido de humor e o jeito em cunhar expressões excelentes para títulos de jornal).

Uma vez que a dimensão «religiosa» das revelações esteja estabelecida, é muito difícil abrir os olhos às pessoas e apontar-lhes as contradições do seu «guru».

Por exemplo, a Laura Botelho parte das peculiaridades da Física Quântica já referidas para concluir que «não se pode prever nada nesta vida» (o que é o total oposto da realidade). No entanto, apesar de anunciar que não se pode prever nada, ela pouco mais faz do que sustentar profecias.

Tudo é permitido quando o sentido crítico se desvanece. Eu até posso sustentar que o meu cabelo, ao levantar-me de manhã, é um bom exemplo de «flutuação quântica» – mas no dia em que vos disser que estou mesmo a falar a sério estão à vontade para me internar, desde que não me coloquem na mesma sala que a Botelho.

Não sei portanto qual é a solução para esta batalha que se trava entre os que defendem o conhecimento e os que o atacam – nem sei, sequer, se deve ser imputada ao cientista a responsabilidade de não conseguir chegar a mais pessoas (embora esforços como o que se faz no AstroPT já provoquem os seus efeitos).

Se vivêssemos num mundo perfeito essa responsabilidade deveria ser assumida também pelos jornalistas, os principais responsáveis em filtrar a informação científica e transformá-la em material que o grande público possa entender. Infelizmente, os media estão mais preocupados com a Astrologia do que com a Astronomia, com o Espiritualismo do que com a Física; e quando se interessam por Ciência é para anunciar, com pomposa ignorância, que a estrela Betelgeuse vai explodir em 2012

28 comentários

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  1. Ao finalmente ter mais sorte na minha pesquisa sobre orbita retrógrada, achei legal me permitir postar aqui (embora não tem nada a ver com o assunto) o significado de planeta (nunca entendi porque chamavam de errante um corpo celeste com trajetória atrelada) é exatamente pelo comportamento de alterar subitamente seu trajeto, a tal da orbita retrógrada aparente! Vão pesquisar gente, não tem nada a ver com fim do mundo viu laura botelho!
    Aliás, um recado, buscar conhecimento sério não é nenhum fim do mundo, pelo amor de Deus!

  2. Olá sr. Marcos, parabéns pela postagem! Quando era jovem cheguei a assinar por dois anos scientific american, lendo exatamente isso que relatou, analogias e suposições para entender coisas puramente matemáticas, até que um dia lí um artigo sobre buracos negros serem processadores de informações, percebi que se não gostava de matemática, comprar esse tipo de publicação era pura enganação!
    olha como cheguei aqui, estudando um planetário, resolvi pesquisar sobre o efeito da “orbita retrógrada”, mas confundi com precessão e acabei caindo nessa publicação http://br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20090723082907AAlRk6o, fui querer saber o que mais poderia sair de uma mente assim e no blog dessa infeliz (por sinal, recheado com aplicativos interessantes) ví bobagens incríveis como o que poderia acontecer se o sistema solar atravessar uma suposta “área de fótons”.
    Ora, acaso o Sol já não nos inunda diariamente com fótons?!? Tem dó, eu não tenho faculdade e sei disso!!
    Faz uma salada incrível de fenômenos físicos, mostrando não saber de nada que manuseia. Ao que parece qualquer informação astronômica que encontre tenta ligar com assuntos teológicos, sem nenhum interesse em se aprofundar em qualquer das áreas, mostrando ao menos respeito com os pesquisadores!
    “As redes de alta potência agem como antenas particularmente eficientes, canalizando enormes correntes diretas em transformadores de potência.” Esse trecho de pura bobagem é um exemplo de como “versa” sobre todos os assuntos que trata, de forma totalmente intuitiva, sem conhecimento prático nenhum!
    Eu que sou um leigo me senti ultrajado pela paixão que tenho sobre ciência, pois ofende quem busca conhecer profundamente um determinado assunto!
    Desculpe, eu quis postar no blog da Laura Botelho (como pesquisadora deve ser uma brilhante neuro-linguista), mas claro que não é possível, acabei desabafando aqui!

    • Renato Romão on 06/12/2011 at 23:28
    • Responder

    Olá Ana,

    “A fisica quantica encanta os leigos porque é uma porta aberta para a espiritualidade”.

    Ana, eu sou um leigo muito curioso e naturalmente a quântica encanta-me, apenas porque penso que o conhecimento da mesma dará algumas respostas muito importantes a perguntas que ciência hoje ainda não obtêm. Sem dúvida que serão os cientistas a descobrir e a divulgar esse conhecimento. No entanto falar sobre o assunto já é outra questão, como pode comprovar a minha opinião no meu comentário anterior.

    De acordo com o contexto em que esta frase se enquadra, penso sinceramente que existem pessoas que fazem o que querem (sem moral e respeito) e utilizam este conhecimento para atingir os próprios objectivos como ganhar dinheiro à custa de uns quantos burlados. Sem dúvida, existem opiniões diferentes sobre o mesmo assunto, mas atenção, existem leigos e leigos!!!

    Abraço

      • Ana Guerreiro Pereira on 07/12/2011 at 00:08
      • Responder

      Lógico que existem leigos e leigos. 🙂 Eu não quis generalizar, lógico, mas falhou-me isso ao escrever à pressa. Obrigada por me alertar 😉

        • Renato Romão on 07/12/2011 at 01:10

        Longe disso. No worries.
        O ponto de vista é o comportamento de cada um. A utilização do conhecimento.
        Lá está o passo em frente para a constante evolução da humanidade e ao mesmo tempo, a existência de uma sociedade em que o principal objectivo é ganhar dinheiro.

        É caso para dizer,
        Se para a humanidade o presente já não é um presente, como será o futuro!?!

  3. Se fosse somente a parte da espiritualidade, seria inócuo e até teria um efeito mto positivo. Mas aqui trata-se de MENTIR às pessoas. Não percebo como é que não vêm isso, honestamente. Que ele está a mentir e a ganhar dinheiro com essas mentiras. Independentemente de fazer as pessoas felizes – mas que raio de felicidade é essa que assenta em deturpação e mentira, pergunto eu?….

    É q se isso é assim, o meu problema financeiro resolvia-se rapidamente. Tinha muito por onde pegar e ganhar. E o que diria isso de mim? que seria uma vigarista q usava as crenças das pessoas para as enganar, iludir, e ganhar dinheiro com isso.

    A fisica quantica encanta os leigos porque é uma porta aberta para a espiritualidade. Infelizmente não é assim q as coisas funcionam e um leigo facilmente é enganado por pressupostos falsos de pessoas q sabem q ele, leigo, não entende fisica quantica o suficiente para detectar o facto de estar a ser enganado. Q raio de felicidade é essa?… feliz na mentira?…

  4. “mas só uma plateia de surdos se deixará convencer de que temos «unhas» para tocar um instrumento e reproduzir uma sinfonia quando só aprendemos dois acordes.”

    Não esta surda!!! LOOOOOOOL

    Mas concordo – eu não oiço musica da mesma forma que vocês, reles ouvintes 😛 😀

    (na verdade eu sou como o gato: oiço e não oiço ao mesmo tempo 😀 mtas vezes depende do observador, outras vezes depende do observado – decifra lá esta, fisica quantica!!! :D)

    1. “É como se estas implicações da Física Quântica o levassem a pensar que, a nível sub-atómico, as partículas estão todas coladas umas às outras com a saliva de Deus.”

      LOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOL

      Mio dios, Marco, isto está excelente!

  5. Scarlett Johansson e física quântica no mesmo artigo? O meu muito obrigado!

  6. Ah, e obrigado ao Manel Rosa Martins pelos seus “devaneios quânticos” no Facebook. 🙂

      • Manel Rosa Martins on 06/12/2011 at 01:58
      • Responder

      O melhor agradecimento foi este belíssimo post, Obrigado. :))

  7. Muito agradecido a todos pela simpatia e pelos elogios.
    Sempre fui apaixonado por Astronomia e sempre tive um enorme respeito pelo Conhecimento, mas quero também agradecer o muito que me têm ensinado todas as pessoas que aqui escrevem.

  8. Esse relacionamento não é diferente do que temos com a música: podemos adorar o que estamos a ouvir, podem fazer sentido todas aquelas notas e harmonias, mas não sabendo cantar, tocar um instrumento e não conhecendo as notas, ser-nos-á impossível reproduzi-la com exatidão.

    Excelente analogia! Adorei!

  9. Fantástico Marco!!!! Que capacidade fascinante de jogar com as palavras.

  10. A leveza e a rapidez com que expõe os fatos, as ideias e as conclusões… adoro! 🙂

  11. Excelente post !

    • Paulo Polónio Cabrita on 05/12/2011 at 22:25
    • Responder

    Perfeito Marco!!!!!……espero tb ansiosamente pelo guestpost do cavalcanti!!!!!!

  12. LOLLLL a tua referência ao “astrólogo do Texas”.
    Já agora coloco a expressão completa dela: “a tese de mestrado de algum astrólogo lá no Texas…”
    Ora, uma advogada leu isso e contactou-me para fazer print screens “especiais” (que sejam aceites), porque isso além de serem 2 mentiras (mestrado e astrólogo), podem também ser consideradas difamaçoes, injurias, e atentados à honra profissional (algo que ela demonstra nao saber o que é).

    Todo o texto dela é um hino à ignorancia, ja superiormente desmontada pelo Cavalcanti, aqui:
    http://www.astropt.org/2011/12/02/a-oprah-dos-malandros/#comment-49447

    Ela assume que os leitores dela são uma cambada de extremistas ignorantes, que não sabem procurar as informações correctas sobre os temas, e por isso ela pode dizer as bobagens que quiser que eles comem tudo.
    O texto dela é claramente de promoção de ideias de uma seita religiosa New Age, e ela assume que os leitores são tao burros que nem se apercebem disso.
    Enfim… esta é a consideração que ela tem por aqueles que lhe dão a ganhar a vida.

    Nas partes em que ela tenta fantasiar o que diz de cientifico, espalha-se redondamente.

    Por exemplo, de Sagan ela diz isto:
    “Os “fundamentos” a que Carl Sagan se limitava a crer foram suas próprias crendices, sem base científica na época.”

    Sagan participou, por exemplo, das missões Voyager. Mas, para esta pseudo, sondas a milhares de kms de distância a passar certinhas pelos planetas para que foram planeadas… são somente crenças do Sagan.
    Satélites? Sao crenças do Sagan.
    Efeito-estuda em Vénus? Sao crenças do Sagan.

    Alias, saindo daquilo para o que Sagan contribuiu directamente, percebe-se que Sagan viveu num mundo ja altamente cientifico, e não de crenças como ela quer fazer crer. Sim, porque ela quer impor as suas proprias crenças aos factos, quando ela devia ser humilde o suficiente para perceber que os factos, a natureza, sobrepoem-se sempre às suas crenças.

    Mas, para mim, a parte mais especial é quando ela fala de Einstein:

    No mesmo post, ela diz isto:

    “Albert Einstein não gostou nada dessa idéia, na verdade, Einstein queria o fim da Mecânica Quântica, pois iria contra tudo que ele acreditava! E foi numa batalha de mentes brilhantes que Einstein disse a famosa frase: “Deus não joga dados” – – pois o DEUS a que ele se referia tinha CERTEZA sobre todas as coisas do universo, assim como o parvo astrólogo do Texas.”

    Sem entrar pelo insulto do “parvo astrólogo”, registo que esta frase tem uma saraivada de erros, dos quais vou referir 3:

    Einstein não acreditava num “deus” no sentido corrente do termo. Como Einstein disse (“I believe in Spinoza’s God, Who reveals Himself in the lawful harmony of the world, not in a God Who concerns Himself with the fate and the doings of mankind”), ele pensava na natureza como sendo o seu deus. O que a natureza ditasse, seria a verdade. A verdade vem dessas observações, hipóteses, experiências, e conclusões feitas com base na natureza. Ou seja, trocado por miúdos, o “Deus” de Einstein era a ciência objectiva.
    Só isto era suficiente para esta mulher lavar os dedos antes de teclar o nome de Einstein. Afinal, o que ela, e muitos como ela fazem, é querer impôr as suas crenças na natureza, em vez de deixarem que seja a natureza a mostrar as suas regras (que depois são compreendidas pelos cientistas). Ela está assim nas antípodas de Einstein. Por isso é que Einstein é considerado um dos maiores génios da Humanidade… e ela… bem, já perceberam que ela está nas antípodas.

    O tipo de interpretações que ela faz, subvertendo Einstein, é que Einstein estava cheio de certezas (o que é um dos absurdos mais parvos que alguma vez já li), enquanto a verdade (dela) é que tudo é relativo. Para ela, “vale tudo”: Hitler cometeu genocídio? É relativo. A gravidade funciona todos os dias? É relativo. Será que um físico quântico sabe mais de física quântica do que alguém que nada sabe mas gosta de dar opiniões? É relativo. Isto é conhecido como relativismo.
    Ela própria afirma:
    “Agora nós já sabemos que tudo é possível e que não existe o certo, o verdadeiro, o “lógico”, pois são apenas palavras/símbolos que representam a experiência de cada um”.
    Existem duas ironias associadas a esta forma de pensar:
    (1) foi Einstein que criou as duas Teorias da Relatividade (Restrita e Geral) que deram origem ao relativismo, e
    (2) se tudo é possível, então é possível que ela esteja totalmente errada – infelizmente, pessoas como ela nem se dão conta do paradoxo em que caem ao afirmarem com absoluta certeza que não há certezas.
    http://milkteef.files.wordpress.com/2011/02/snoopyparadox.jpg

    Por fim, Einstein não era, obviamente, contra a Mecânica Quântica. Pelo contrário, contribuiu de sobremaneira para o seu desenvolvimento. Até teve direito a Prémio Nobel da Física numa descoberta que nos permite agora compreender melhor a natureza quântica da luz. (a ignorante autora deste blog é que OU desconhece isso OU sabe e resolve omitir para ludibriar os leitores)
    É verdade que Einstein pensava que para lá da quântica existirá um mundo mais determinista. Mas, tal como o fazem todos os cientistas, os seus pensamentos pessoais não o faziam negar as evidências, e daí que ele contribuiu legitimamente para aquilo que entendemos como Física Quântica. Não negou as evidências, não quiz o fim da Quântica, e ainda levou ao seu desenvolvimento.
    Como disse uma pessoa bem conhecida de todos nós (:P), leitores do astroPT:
    “O Universo não quer saber do que eu penso e das minhas filosofias. Os resultados científicos nem sempre são aqueles que eu gosto”.
    Einstein pautou-se pelo mesmo diapasão: a natureza é que dita as regras, independentemente das crenças pessoais de cada um. Daí Einstein ter contribuído bastante para a Mecânica Quântica.

    http://www.astropt.org/wp-content/uploads/2011/12/Aufderheideopen.jpg

    Mas se pensam que esta mulher é caso único, desenganem-se. Muitos mais existem pela blogosfera que, tal como ela, nada entendem dos assuntos sobre os quais decidem escrever.
    No caso da Quântica, existe até um documentário feito para divulgar este tipo de ideias erradas pela população mais crédula.
    http://www.astropt.org/wp-content/uploads/2011/02/quantum-mechanics-demotivational-poster.jpg

    1. Carlos,

      Será que nos podes ensinar o que é esse print screen especial? É que para além da minha curiosidade académica/profissional (estudo Direito), acho que é útil para muita gente neste tipo de situações, e nunca ouvi falar disso 😛

      1. com referencia ao computador.

        abraços

  13. Muito bom!

    A física quântica é sem dúvida a disciplina mais abusada pelos pseudocientistas, vários livros de auto-ajuda usam e abusam da física quântica como se esta apoiasse alguma coisa do que eles dizem.

  14. *****

    legenda: 5 estrelas

  15. Marco, o que dizer?

    Mais post fantástico! E cá agora, não se cansa a fazer textos brilhantes como esse? (bazinga 🙂 )

    Parabéns e abraços.

    P.S.: também requer uma certa dose de coragem para falar de um assunto tão pessoal com esse = Laura Botelho (eu deixei um comentário a ser transformado em um “guest-post” que vocês pediram 😉 a falar sobre o tema que ela abordou em seu sítio sobre Física Quântica e etc. “de molho”…)

    🙁

    1. O convite continua aberto para quando quiser enviar 😉

        • Cavalcanti on 05/12/2011 at 22:04

        “O convite continua aberto para quando quiser enviar”

        Obrigado, Carlos 🙂 Mas eu não ficaria nada feliz ao ver essa senhora se utilizando de um artigo escrito por minha pessoa para benefício próprio contra o Astropt – mesmo sabendo que ela, possivelmente, “entenderá” como ofensa pessoal e não como alguém que está contra as ideias que a mesma publica em seu sítio eletrônico…

      1. Cavalcanti, é uma pena que não o transforme em post porque estava muito bom.

    • Renato Romão on 05/12/2011 at 21:46
    • Responder

    Magnifico post,

    Sendo um leigo muito interessado em quântica, contemplo o seu texto como factos, pois eu não seria capaz de tocar nem uma nota, ou seja, de explicar correctamente o que é a quântica. Pois este acto de explicar implica observações e perguntas de quem está a receber a minha mensagem, perguntas essas que quase de certeza não saberei responder. Por tando melhor remédio é ler e contemplar o conhecimento, se alguem me perguntar, respondo que estas são as minhas referências bibliográficas e de multimédia, ou melhor, PERGUNTEM AO ASTROPT (como quem diz, aos cientistas)!!!

    Abraço

  16. um artigo muito bom. Parabéns .

  1. […] Randi, ilustre caçador de tretas da pseudo-ciência e da ciência maluca; Frank Drake, astrónomo muito ligado ao projeto SETI e criador da famosa equação de Drake; Kip […]

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