As experiências da Física Quântica e a Sopa Primordial

Genebra, 13 de Agosto de 2012.
As experiências usando iões pesados no Grande Colisionador de Hadrões (LHC) no CERN estão a fazer avançar a compreensão do universo primordial.

Sopa Primordial. Créditos: Daily Tech

As colaborações das experiências ALICE, ATLAS e CMS fizeram novas medições do tipo de matéria que provavelmente existia nos primeiros instantes do universo. Vão apresentar os seus últimos resultados na conferência de matéria do plasma gluon-quark de 2012, que decorreu em Washington DC. As novas descobertas são baseadas principalmente no funcionamento do LHC durante quatro semanas com iões de chumbo em 2011, durante as quais as experiências coligiram 20 vezes mais dados do que em 2010.

Logo após o Big Bang, os quarks e os gluões – blocos de construção básicos da matéria – não estavam confinados dentro de partículas compostas, tais como os protões e os neutrões, como estão hoje. Em vez disso, deambulavam livremente num estado da matéria conhecido como “plasma quarks-gluões”. As colisões de iões de chumbo no LHC, o acelerador de partículas mais poderoso do mundo, recriaram as condições para um momento fugaz semelhante ao início do universo. Ao examinar mil milhões ou mais dessas colisões, as experiências têm sido capazes de fazer medições mais precisas das propriedades da matéria sob essas condições extremas.

“O campo da física de iões pesados é crucial para investigar as propriedades da matéria no universo primordial, uma das questões chave da física fundamental que o LHC e suas experiências se destinam a estudar. Ele ilustra como, além da investigação da descoberta recente do bosão de Higgs, os físicos do LHC estão a estudar muitos outros fenómenos importantes tanto nas colisões protão-protão como nas colisões chumbo-chumbo “, disse o director-geral do CERN, Rolf Heuer.

Na conferência, as colaborações ALICE, ATLAS e CMS vão apresentar caracterizações mais refinadas da matéria mais densa e mais quente já estudada em laboratório – 100.000 vezes mais quente que o interior do Sol e mais densa do que uma estrela de neutrões.

ALICE vai apresentar uma conjunto muito rico de novos resultados em todos os aspectos da evolução da  interacção forte da matéria em alta densidade no espaço e ao longo do tempo. Importantes estudos irão lidar com as “partículas Charmed”, que contêm um quark charme ou um anti-quark charme. Os quarks charme, 100 vezes mais pesados do que os quarks up e down que formam a matéria normal, são significativamente desacelerados na sua passagem pelo plasma quark-gluon, oferecendo aos cientistas uma ferramenta única para investigar as suas propriedades. Os Físicos da experiência ALICE irão reportar indicações de que o fluxo no plasma é tão forte que arrasta consigo as partículas pesadas charme. Na experiência foram também observadas indicações de um fenómeno de termalização, que envolve a recombinação de quarks charme e anti-charme para formar o “charmonium”.

“Este é apenas um exemplo de liderança das oportunidades científicas ao alcance da experiência ALICE”, disse Paolo Giubellino, porta-voz da colaboração ALICE. “Com mais dados que ainda estão sendo analisados e outros dados cuja recolha está prevista para Fevereiro do próximo ano, estamos mais perto do que nunca de desvendar as propriedades do estado primordial do Universo: O plasma quarks-gluões”

Na década de 1980, a dissociação inicial do charmonium foi proposta como uma assinatura directa da formação do plasma quarks-gluões, e os primeiros indícios experimentais desta dissociação foram observados nas experiências de alvos fixos no Super Proton Synchrotron, no CERN, em 2000.

A energia muito maior do LHC torna possível, pela primeira vez, estudar estados análogos firmemente confinados dos quarks mais pesados de beleza (B ou Bottom-quark). A hipótese é que, dependendo de sua energia de ligação, alguns desses estados  “derreteriam” no plasma produzido, enquanto outros sobreviveriam a temperaturas extremas. A experiência CMS observa agora sinais claros da esperada supressão sequencial dos estados “quarkonium” (quark-antiquark).

Aqui pela hiperligação podem ver um diagrama ilustrativo (e com ampliação) formulado pelo Particle Data Group, um colaboração onde residem os dados revistos pela Física de Partículas.

Notem que o tempo está denotado por tau minúsculo – uma letra grega – e  Temperatura por T maiúsculo, e em Kelvins. A Energia por E e em Giga Electrões-Volts.

Prosseguindo,

“A CMS irá apresentar novos resultados importantes de iões pesados não só na supressão do quarkonium, mas também nas propriedades principais do meio (desta fase da matéria) como um todo para além duma série de estudos de extinção de jacto“, disse o porta-voz CMS Joseph Incandela. “Estamos entrando numa era nova e estimulante de alta precisão da pesquisa sobre matéria interagindo fortemente nas energias mais altas produzidas em laboratório.”

A extinção de jactos é o fenómeno em que sprays altamente energéticos de partículas se quebram no denso plasma de quarks-gluões, dando aos cientistas informações detalhadas sobre a densidade e propriedades da matéria produzida. A ATLAS irá relatar novas descobertas sobre atenuação de jactos, incluindo um estudo de alta precisão sobre o processo de fragmentação dos jactos na matéria, e sobre as correlações eletrofracas entre jactos e bosões. Os resultados são complementares a outros ainda mais excitantes, incluindo resultados inovadores sobre o fluxo do plasma.

“Entramos numa nova fase em que não apenas observamos o fenómeno do quark-gluon plasma, mas onde também podemos fazer medições de alta precisão, usando uma variedade de sondas”, disse a porta-voz do ATLAS Fabiola Gianotti. “Os estudos vão contribuir significativamente para a nossa compreensão do universo primordial.”

Ligação para o Comunicado de Imprensa do CERN:
http://press.web.cern.ch/press/PressReleases/Releases2012/PR21.12E.html

 

Entretanto, do Brookhaven National Laboratory dos EUA, explicam o seu ponto de vista, o BNL colabora com a experiência ATLAS do CERN.

Os núcleos de átomos comuns de hoje e o primordial plasma quark-gluão, ou QGP, representam duas fases diferentes da matéria a interagir na mais básica das forças da natureza (a força forte, que mantém os núcleos dos átomos unidos). Essas interacções são descritas numa teoria conhecida como cromodinâmica quântica, ou QCD. Descobertas na experiência PHENIX do RHIC mostram que as propriedades perfeitas dos líquidos do plasma quark-gluão  dominam a energias acima dos 39-000.000.000 electron-volts (GeV). Como a energia se dissipa, as interacções entre quarks e os protões e os neutrões de matéria normal começam a aparecer. Medir essas energias pode dar aos cientistas a sinalização apontando para a aproximação dum limite entre a matéria comum e do QGP.

“O ponto final crítico, se ele existir, ocorre num valor único de temperatura e densidade para além do qual QGP (Quark-Gluon Plasma) e a matéria comum pode co-existir”, disse Steven Vigdor, Director do Brookhaven, o Laboratório Associado de Física Nuclear e de Partículas, que lidera o programa de pesquisa do acelerador RHIC (Relativistic Heavy Ion Collider ). “É análogo a um ponto crítico além do qual a água líquida e o vapor de água podem coexistir em equilíbrio térmico”, referiu ainda.

Apesar do acelerador de partículas Brookhaven não poder competir com as condições de recorde de temperatura do CERN, os cientistas do Departamento de Energia dos EUA dizem que o aparato do laboratório mapeia o “sweet spot” nesta fase de transição.

Outra foto elucidativa e ampliável

http://www.bnl.gov/bnlweb/pubaf/pr/photos/2012/07/RHIC_Graphics_Fig1-HR.jpg

Legenda da foto: Diagrama de fase nuclear: o RHIC posiciona-se na energia “sweet spot” para explorar a transição entre a matéria comum feita de hadrões e a matéria do universo primordial conhecida como plasma quark-gluões. Cortesia do Departamento de Energia dos EUA – Laboratório Nacional de Brookhaven.

Enquanto isso, o físico português João Seixas, que também coordena a reunião anual do CMS que decorre em Lisboa, comenta a título de esclarecimento no jornal Público:“Portugal tem uma posição de liderança neste domínio desde há 30 anos, o que a notícia não indica. Com efeito Portugal (através do Laboratório de Instrumentação e Física de Partículas e do Instituto Superior Técnico) participou nas experiências NA38, NA50, e NA60 do programa SPS do CERN onde teve um posição de liderança. Em particular as experiências NA50 eem seguida NA60 (esta última com dados tomados até 2004) foram as primeiras a dar indicações claras da existência deste novo estado da matéria muito antes destes resultados. As colaborações ALICE, ATLAS e CMS do LHC no CERN (as duas últimas com participação portuguesa importante) na realidade exploram o caminho aberto por essas experiências a muito mais altas energias, para as quais o tempo de persistência do novo estado é muito maior.”Explicação para o contexto:

Como o tripleto de quarks (up e down) que formam um protão representam cerca de 1% da sua massa, pensa-se que os restantes 99% são originados nas interacções entre os quarks e os gluões.

Assim se dá seguimento à recente descoberta do mecanismo da massa, pelos que estas experiências estão directamente relacionadas e vão estar em comparação com os dados que neste momento se processam dos resultados da descoberta do bosão de Higgs.   

O Bosão de Higgs transporta, ou medeia, o campo-força da Massa.

Os Gluões são também bosões. Pois transportam, ou medeiam, os campo-força forte, nuclear e de cor e ainda estão ligados aos quarks, partículas da matéria (Hadrões).

Assim, conseguir observar quarks e gluões soltos, só por si, determinará que existe um quinto estado, ou melhor descrevendo, uma quinta fase da matéria, que no fundo é o que se pensa que existia quando se deu, ou logo no seguimento, do Big Bang.

Existem as fases da matéria líquida, a sólida e a gasosa, que bem conhecemos da água. Depois há o plasma, como por exemplo o fogo, que é matéria nesta quarta fase, e haverá o QGP, a quinta-essência.

Deixo-vos com uma imagem e um vídeo em que o Físico Paul Sorensen explica as descobertas alcançadas.

Sopa primordial de Quarks-Gluões

4 comentários

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    • Manel Rosa Martins on 22/11/2012 at 17:18
    • Responder

    Olá Lucas, vamos a isso, a experiência mais simples e barata que me lembro é com 1 ou 2 prismas.

    A luz branca do sol ou duma lâmpada incide num dos lados do prisma e sai decomposta (dispersa) pelos seus elementos constituintes do outro lado. São as cores que também vês num arco-íris.

    The common wisdom held that white light is the purest form (Aristotle again) and that colored light must therefore have been altered somehow. To test this hypothesis, Newton shined a beam of sunlight through a glass prism and showed that it decomposed into a spectrum cast on the wall. People already knew about rainbows, of course, but they were considered to be little more than pretty aberrations. Actually, Newton concluded, it was these colors — red, orange, yellow, green, blue, indigo, violet and the gradations in between — that were fundamental. What seemed simple on the surface, a beam of white light, was, if one looked deeper, beautifully complex.

    O senso comum dizia que a luz branca seria a luz na sua forma mais pura (era o Aristóteles quem dizia sso) e que então a luz colorida deveria ser uma forma de alteração desta pureza.

    Mas Newton quis experimentar para ver se assim era. Então ele incidiu um feixe de luz do Sol através dum prisma de vidro e demonstrou que a luz se decompunha num Spectrum (palavra inventada por Newton) quando a via projectar-se na parede.

    As pessoas naquele tempo claro que já conheciam os arcos-íris, mas como não tinham feito experimentos consideravam sem qualquer conhecimento que os arcos-íris eram aberrações, muito bonitas, mas aberrações que não se conseguiam explicar por essa ideia sem experimentação de Aristóteles.

    Se calhar alguns dos teus colegas ainjda julgam isso, mas agora tu com esta simples experiência podes demonstrar que, na verdade, a luz branca não é um estado puro ou fundamental, ela é uma mistura constituída pelas cores Vermelha, Laranja, Amarela, Verde, Azul (que ás vezes se vê escrito Indigo) e Violeta. E pelos tons intermédios entre essas cores, também. :))

    Ora tu assim demonstras que a luz do sol é um composto e não uma luz pura ou fundamental. As luzes fundamentais para nós são aquelas que os nossos olhos vêem melhor: Vermelho, Verde e Azul.

    Já tens aqui uma experiência de física de partículas, ou quântica, muito interessante.

    Se quiseres podes falar da Experiênciia Crucis de Newton que vem neste seguimento mas que é mais difícil de fazer (ele demorou semanas a acertar os prismas) mas que em resumo é assim:

    A luz sai nas cores do lado contrário donde entrou ainda branca. Tu desse lado tapas com uma fita adesiva escura todas as cores excepto, digamos, o Vermelho (como fez Newton) e fazes passar só o Vermelho num segundo primas de vidro.

    Vês que do outro lado desse segundo primas a cor que sai é na mesma o Vermelho.

    Então o Vermelho não pode ser decomposto como foi o branco e é ele sim uma cor fundamental.

    Demonstras assim a origem natural da cor e não a sua origem doutras ideias um bocadinho tontas sem experimentação.

    Mas olha que a experiência com o segundo prisma vai ser difícil de afinar e de realizar.

    Mas Lucas, um investigador de Física deve aprender a ultrapassar as dificuldades e ser muito tenaz e preserverante na sua busca pela Verdade.

    Deixo-te aqui um link para tu veres como Newton fez e poderes fazer um excelente trabalho. Deves estudá-lo com tempo e muito bem para estares super bem preparado para as perguntas que os teus colegas te vão colocar, lembra-te que Crucis quer dizer em latim Crucial e esta experiência chama-se Crucis Experiment.

    Uma indicação, caso não consigas a segunda parte faz a primeira e faz uma apresentação sobre a Experiência Crucis, tenho a certeza que se te esforçares vai correr muito bem!

    Boa sorte, bom trabalho, e depois diz-nos se o teus colegas e Professores gostaram! :))

    Falta só o link, podes saltar para a página 59, mas deves ler tudo para seres um Super investigador!

    http://www.scielo.br/pdf/ciedu/v9n1/05.pdf

  1. Tenho um trabalho de fisica quantica para apresentar no colegio…… vc poderia me ajudar com algum experimento simples? Obrigado!!1 Me ajuda por favor!

  2. Magnífico artigo, Manel.

    Abraços.

    1. Obrigado e um abraço, Cavalcanti. Mas se virmos bem o que tem sido magnífico em descobertas e avanços da Física tem sido este ano de 2012. Memorável! :))

  1. […] física-quântica-e-a-sopa-primordial […]

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