Neste artigo vou divagar sobre o conceito de dimensão, o qual é fundamental em Física. A exposição irá versar sobre noções que me parecem interessantes e que, por outro lado, serão importantes para servir como base ao meu próximo artigo que será sobre a Teoria das Cordas.
Para um não-físico, dimensão é sinónimo de tamanho. Para um físico é mais que isso, e é normalmente associado a uma de duas coisas distintas: dimensão espacial ou dimensão de uma grandeza (dimensionalidade). A dimensão espacial pode variar de problema para problema. Apesar de em qualquer problema físico termos sempre as 3 dimensões espaciais (ou quase sempre), a verdade é que muitas vezes se pode fazer o mesmo estudo “esquecendo” a existência de uma ou até duas dimensões espaciais. Temos, por exemplo, o estudo da difusão de tinta em papel absorvente – neste caso pode considerar-se apenas o estudo nas 2 dimensões do papel. Ou se, por outro lado, quisermos estudar a atracção entre duas partículas, basta ter em conta uma só dimensão – a recta que une as mesmas.
O conceito de dimensionalidade é completamente diferente, e até já falei um pouco dele no Método de Pi Buckingham. Possivelmente na primária, o vosso professor disse-vos: “não se soma alhos com bugalhos”, o que em linguagem mais correcta será: “não se somam grandezas com dimensões diferentes”. As dimensões de uma grandeza podem ser facilmente distinguidas pelas “unidades”. Por exemplo, não faz qualquer sentido somar 1 segundo com 1 metro – as unidades “segundo” e “metro” são diferentes. Como é evidente, qualquer lei Física obedece a este princípio.
Neste artigo pretendo debruçar-me um pouco mais sobre o primeiro conceito de dimensão.
Para nós, que vivemos num mundo de 3 dimensões espaciais e uma temporal, foi um “choque” compreender que a dimensão temporal se tratava realmente de uma dimensão. Que significa uma quarta dimensão? Como é que a poderemos “visualizar” (espacialmente)? Existem ilusões de óptica que nos permitem observar cubos de 4 dimensões, mas trata-se de uma ilusão, pelo que não creio que obtenham daí qualquer compreensão sobre o problema.
Podemos começar por pensar numa dimensão como sendo uma recta – uma dimensão será então um lugar geométrico que permite posições em apenas uma direcção. Quantas posições? Infinitas. Duas dimensões são, por norma, representadas por duas rectas perpendiculares. As posições podem agora ser representadas por pequenos quadrados neste espaço. Quantas posições temos agora? Infinitas, claro. Mas, de modo pouco correcto, pode-se afirmar que temos infinitas a multiplicar pelo outro infinito da situação anterior, ou seja: infinito^2. Passando para 3 dimensões ainda tudo é simples: basta desenhar uma recta perpendicular às duas anteriores, ou seja, uma recta perpendicular ao plano que as outras duas rectas do espaço 2D faziam. Neste caso, a noção de posição pode ser associada à localização de um dado cubo, neste espaço. O número de posições seria agora infinito^3 (o infinito pode ser substituído por um número, caso se definam limites).
Até aqui tudo bem, mas e agora 4 dimensões? Bem, do mesmo modo, e esquecendo as nossas noções “reais”, poderíamos simplesmente declarar que iríamos traçar uma recta perpendicular ao espaço 3D, tal como anteriormente se tinha feito. Isto, porém, não é algo que possamos “visualizar”, já que vivemos num mundo tridimensional. Ainda assim, é interessante pensar que se podemos representar algo tridimensional numa folha de papel, então do mesmo modo se poderá supor que é possível representar um objecto quadrimensional num outro tridimensional. Como tal, talvez possamos repensar as noções anteriores, para poder refazer a noção de 4D.
É possível pensar nesta questão de várias formas. Vou começar por expor uma bastante simples:
No caso 2D, chamando às rectas (eixos) x e y, como é usual em Matemática, quando atravessamos as posições possíveis de x, temos sempre um conjunto de posições de y que podemos ocupar, por outras palavras, por cada posição de x, temos um espaço 1D em y onde podemos “viajar”, sem nos movermos em x. No caso 3D acontece o mesmo, mas com mais uma dimensão de “liberdade”, ou seja, quando ocupamos uma posição de x, podemos ocupar uma qualquer posição y-z de um espaço 2D. No caso 4D, quando ocupamos uma dada posição de x, temos a liberdade de nos movermos num espaço tridimensional. Ou seja, a noção de 4D é apenas que por cada posição de um espaço 1D temos um espaço 3D. É como que um modo de visualização 3+1.
Assim, a noção de tempo pode ser entendida como uma dimensão pela qual vamos viajando (com velocidade variável, dependendo da velocidade espacial que tivermos – quanto maior for a velocidade espacial, menor será a velocidade temporal, de tal modo que só “parados” é que viajamos à velocidade máxima pelo tempo – ver Relatividade Restrita), enquanto temos sempre a opção de estar em qualquer posição de um espaço 3D (supondo que não estamos num buraco negro).
Existem outras formas de pensar mais “elegantes” (que surgem por vezes em livros de divulgação sobre a Teoria das Cordas): o espaço 2D pode ser entendido como um plano, se dobrarmos o plano de modo a obter um cilindro obtemos uma nova dimensão, que é a de profundidade do cilindro. E se voltarmos a dobrar o cilindro? Tem que ser sobre si próprio, caso contrário obtinha-se um toróide simples – mais uma vez não é fácil de visualizar. Aliás, até mesmo o “dobrar” do plano pode trazer-vos dúvidas, pois se o plano é infinito, como será possível “unir as pontas” para fazer um cilindro? Matematicamente dir-se-á que o cilindro tem um raio infinito, mas isso talvez não vos convença, pois poderão argumentar que se o raio é infinito, então continuamos com um plano. Espero que tenham ficado confusos e com vontade de pensar no assunto por vocês mesmos. Podem até tentar pensar noutras formas de compreender a quarta dimensão.
Para finalizar, deixo-vos a imagem de uma representação de um espaço de Calabi-Yau de 6 dimensões:
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Errata:
Onde se lê “Como as 8 células cúbicas que compõem o hipercubo têm um total de 64 arestas e como 64/4=16, este número é o número total de vértices do hipercubo.”, deve ler-se “… têm um total de 64 vértices …”.
Gosto imenso de me debruçar sobre o estudo dos espaços dimensionais e de ver se os consigo imaginar apesar da formatação a que o meu/nosso cérebro está sujeito devido à observação tridimensional que faz de tudo aquilo que nos rodeia.
Utilizando conceitos matemáticos básicos e partindo dos espaços adimensionais (0D), monodimensionais (1D), bidimensionais (2D) e tridimensionais (3D) consegue-se, creio eu, generalizando e abstraindo, seguindo sempre as regras matemáticas, chegar a situações cada vez mais complexas e difíceis de ultrapassar devido, precisamente, à férrea formatação 3D do nosso cérebro.
O Gif animado que é mostrado no post, na minha opinião, não é o hipercubo tetradimensional (4D) em si a rodar, mas sim uma projecção 2D da sombra 3D desse mesmo hipercubo que está a rodar no espaço 4D e cuja forma real é invisível para nós.
Deixem-me dizer, também, que a projecção vista no Gif em questão não é, na minha opinião, uma projecção qualquer mas sim a projecção de um hipercubo de faces transparentes e arestas opacas que está a ser iluminado por uma fonte luminosa 4D e cuja posição em relação ao nosso espaço 3D tem de obedecer às seguintes condições:
1. Duas das 8 células cúbicas que o compõem estão contidas em espaços 3D “paralelos” ao nosso espaço (Universo), estando uma mais “perto” e outra mais “afastada” do mesmo, passando-se o contrário em relação ao foco luminoso, ou seja, a que está mais “perto” de nós está mais “afastada” do foco luminoso e vice-versa.
2. As 6 pirâmides truncadas que aparecem na projecção 2D do hipercubo são as sombras 3D das restantes 6 células cúbicas que o compõem e que têm de estar contidas em espaços 3D que formam “ângulos” de 90 graus com o espaço 3D onde nos encontramos.
O que é então um espaço 4D? Quanto a mim, um espaço 4D é uma entidade que contém um número infinito de espaços 3D e que é caracterizado pela existência de quatro eixos perpendiculares entre si, todos com o mesmo ponto origem e da mesma natureza, o que quer dizer que o 4º eixo não pode ser o eixo dos tempos, porque este não seria da mesma natureza que os outros 3.
Divagando um pouco acerca deste espaço 4D preparemo-nos para o “conhecer”, mas sempre com algumas limitações. Com estes 4 eixos da mesma natureza perpendiculares entre si quantos planos diferentes conseguiremos nós definir? Aqui entram os conhecimentos básicos de matemática, ou seja, a análise combinatória. Para definir um plano necessitamos sempre de dois eixos, como temos 4 eixos disponíveis, será combinações de 4 dois a dois o que dá 6, querendo isto dizer que num espaço 4D ortonormado se podem definir com os 4 eixos 6 planos diferentes e perpendiculares entre si.
Vamos então falar mais um pouco sobre o hipercubo e dizer que por cada plano do espaço 4D existem duas células cúbicas com duas faces, cada uma, que lhe são paralelas o que quer dizer que por cada plano o hipercubo tem 4 faces que lhe são paralelas e como temos 6 planos, 6×4=24 que é o número total de faces do hipercubo, o qual pode ser calculado de outra maneira.
Olhando para o Gif animado verifica-se que os dois cubos que nele aparecem são as projecções 2D das sombras 3D das 2 células do hipercubo referidas em 1. em que o menor é a sombra da que está mais perto de nós e mais afastada do foco luminoso e o maior é a sombra da que está mais afastada de nós e mais perto do foco luminoso sendo as 3 pirâmides truncadas aquilo que está referido em 2. e as linhas que unem os vértices as projecções 2D das sombras 3D das arestas opacas do hipercubo que são 32.
Neste mesmo hipercubo, cada vértice terá de ser o ponto de encontro de 4 arestas sendo cada uma paralela a cada um dos 4 eixos que definem o espaço 4D. Como as 8 células cúbicas que compõem o hipercubo têm um total de 64 arestas e como 64/4=16, este número é o número total de vértices do hipercubo.
Conclusão:
1. O hipercubo é, portanto, um poliedro 4D invisível para os observadores 3D e que só pode ser percepcionado por nós através da sua sombra 3D que, a maior parte das vezes, é confundida com o próprio hipercubo ou tesseracto.
2. O hipercubo tem, portanto, 16 vértices, 24 faces e 32 arestas e é um dos poliedros que não obedece à fórmula de Euler (F+V-A=2).
Como auxiliar visual deste assunto, ver:
http://www.youtube.com/watch?v=lwL_zi9JNkE
Muito obrigado pela vossa paciência. Espero que o post mereça ser publicado.
Poderia ser possível dimensões diferentes em vibrações diferentes?
Mas a partir do mesmo material original?
Author
Confesso que não compreendi a questão. Quer detalhar um pouco mais?
Depois do livro, O Romper das Cordas, parece-me que esta teioria (a das cordas), se afunda a cada dia, não se vislumbrando avanço algum ciênfico. Se calhar já seria altura dos físicos teoricos se aventurarem por outros caminhos.
Author
Os físicos teóricos já há muito que se aventuram por outros caminhos, a Teoria das Cordas continua apenas a ser o caminho mais conhecido.
Pontos de vista bastante interessantes.
Gosto da animação do tesserato.
Esta animação do hipercubo é “pacificante”.
Sugere a rotação do tesserato, projetada a 3D, ou não?
Author
Sim, é efectivamente a representação da rotação do tesserato a 3D. A rotação serve para nos dar uma ideia da dimensão “escondida”. Neste caso a rotação dá-se apenas sobre um plano bissector.
Também se pode ter a sua rotação sobre dois planos ortogonais:
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/55/Tesseract.gif
O “como fazer um hipercubo” é talvez ainda mais elucidativo (embora o efeito não seja tão belo):
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/4/46/Hcube_fold.gif
Do mesmo modo que para ter um cubo a 3D, podemos partir de 6 quadrados (as faces) em forma de cruz, também para construir um hipercubo 4D podemos partir de 8 cubos:
http://4.bp.blogspot.com/_TbkIC-eqFNM/S-dK9dd1cUI/AAAAAAAAFjA/d8qdTHhKy1U/s320/tesseract+unfolded.png
Muchas Gracias.
[…] que referi para a quinta dimensão introduzida por Kaluza: são dimensões “enroladas”, ver Ensaio Dimensional. Podem pensar, por exemplo, que vivem num mundo a duas dimensões, e que não conhecem a altura. […]
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