Questiono-me por vezes sobre a diferença entre ser astrónomo amador ou astrónomo profissional.
E não acho fácil traçar uma fronteira.
Amador pode significar fazer as coisas por prazer, sem obrigações institucionais, mesmo por amor.
Pode significar fazer o que bem apetece, sem ter de prestar contas a ninguém.
E quando, por vontade própria, por interesse intelectual, por vontade de conhecer, por vontade de participar, um amador se compromete com algo, com programas de investigação, com programas de observação coordenados, sem pedir nada em troca?
Deixou de ser amador?
A minha resposta, muito clara, é NÃO.
O compromisso de um amador, porque é tomado voluntariamente, porque acredita num projecto, vale mais que qualquer contrato.
Um contrato tem cláusulas de rescisão. Basta activá-las e era uma vez um contrato.
O compromisso de um amador é, em primeiro lugar, consigo mesmo.
É para levar até ao fim.
Qual o profissional que todas as semanas vai ao campo, monta toda a parafernália de equipamentos e fica a noite inteira, às melgas, à humidade, ao frio, sentado frente a um computador a guiar um telescópio na fenda de um espectrógrafo, a registar o trânsito de um exoplaneta, a registar a imagem de uma elusiva nebulosa?
E quando esses trabalhos são destinados a colaboração com projectos profissionais?
Pois eu conheço vários amadores que o fazem todas as semanas. E permito-me referir o José Ribeiro, o João Gregório, o Filipe Alves. E, por norma, não lhes falta companhia de outros, como eu, que têm outros objectivos e paixões menos exigentes.
Ainda são amadores?
SIM e sempre.
Vale menos o seu trabalho por serem amadores?
A resposta está nas bases de dados onde o seu trabalho é aceite e, por vezes, proeminente.
O que é um profissional?
Se fosse defini-lo, por certo daria uma definição incorrecta.
É mais adequado que sejam os próprios a dizer-nos o que são.
Eu sou astrónomo amador.
Gosto do convívio, gosto de partilhar uma imagem que está na ocular do meu telescópio, gosto de estar no meio de nada, sob aquele céu escuro iluminado pela Via Láctea, gosto de ouvir os ruídos da noite, gosto do silêncio do entardecer e de olhar o poente num lugar ermo onde vou passar a noite, gosto de ver o meu equipamento a escorrer água ou coberto de gelo, gosto do céu matutino quando regresso a casa após uma noite inteira no campo.
E gosto das conversas, ou de um piquenique ao lado dos telescópios e computadores, ou do chá quente que alguém se lembrou de levar, ou de petiscar uma bolacha durante um périplo pelos telescópios presentes, ou de deixar o telescópio a seguir coisa nenhuma quando não apetece fazer nada.
E gosto da satisfação manifestada por quem teve uma pequena conquista, localizou um objecto mais difícil, pôs a funcionar um equipamento renitente.
Sou amador. Amo o céu e as suas maravilhas.
Muitas das facilidades e equipamentos de que todos podemos dispor são fruto de trabalho profissional.
Não esqueço isso.
Quem quer definir o astrónomo profissional?
Leiam também, esta discussão na comunidade de astronomia. E esta.
E leiam este artigo da Carolina Cantarino.
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