Em Novembro de 2009, soube-se que ele tem um problema. Até que o software seja corrigido, o Kepler não poderá detectar esses planetas. Este observatório estará em óptimas condições somente em 2011.
Ou será que tudo não passa de um mal entendido?
Tanto quanto pude apurar, tudo começou com um artigo curto na revista Nature que, citando o responsável científico pela missão, William Borucki, referia problemas com alguns amplificadores no observatório que estariam a introduzir ruído nos dados recolhidos, diminuindo a precisão dos mesmos. Este ruído pode ser eliminado em grande parte através de filtros de software mas aparentemente esse código só estaria funcional em 2011.
O Bill Borucki, alguns dias depois, tentou clarificar a situação:
There is a mistake in the Nature article. The Kepler Mission is actually doing very well and is producing planet discoveries that will be announced early next year. Data from 3 of the 84 channels that have more noise than the others will be corrected or the data flagged to avoid being mixed in with the low noise data prior to the time an Earth twin could be discovered.
Os canais são utilizados para ler regiões específicas nos CCDs. A medição do brilho das estrelas é feita através de fotómetros que aparentemente estão a funcionar na perfeição. É no passo seguinte, em que os sinais obtidos são amplificados e des-amplificados para eliminar ruído, que está o problema. Os amplificadores responsáveis por esta tarefa estão a introduzir ruído em 3 dos 84 canais de aquisição de dados. Apesar de 3 canais em 84 parecer um número irrisório e pouco consequente, é preciso ter em conta que o Kepler tem de atingir uma precisão extrema para conseguir detectar trânsitos de planetas do tamanho da Terra. A figura seguinte mostra a posição dos 84 canais no CCD do Kepler.
Por outro lado, o verdadeiro problema parece residir na forma como o Kepler envia a informação para a Terra. O que é transmitido não é informação sobre todos os pixéis do CCD mas apenas os dados relativos às estrelas alvo. Para cada estrela, é acumulada a sua contribuição para os píxeis que ocupa na imagem. Em seguida, esse valor acumulado, o brilho da estrela, é comparado com o brilho de estrelas vizinhas (fotometria diferencial), eventualmente observadas noutros canais. Este processo propaga o ruído dos 3 canais problemáticos para estrelas em canais vizinhos, as quais propagam a outras vizinhas, afectando eventualmente o CCD todo. Este processo poderia ser corrigido se o sinal original de todas as estrelas fosse enviado para a Terra, onde poderiam ser aplicados filtros de software para eliminar o ruído. Infelizmente, por razões que se prendem com a quantidade de informação a transmitir, são enviadas para a Terra apenas as diferenças de brilho entre as estrelas, isto é os dados vêm já contaminados com o ruído dos 3 canais, pondo em causa a precisão necessária para a detecção de planetas do tipo terrestre.
Aparentemente o problema com os amplificadores foi detectado antes do lançamento mas numa fase em que o observatório estava já montado. A decisão na altura foi no sentido de não correr riscos de danificar a nave ao desmontá-la para substituir os amplificadores e, resolver essa situação via software uma vez o observatório em órbita.
A situação é algo confusa no momento e não se sabe ao certo qual a dimensão do problema. Espera-se que a equipa responsável pela missão clarifique exactamente o que se passa e o que está em jogo.
(Actualização 4/11/2009)
Este artigo na Sky&Telescope parece indicar que o efeito de contaminação é localizado, afectando apenas os 3 canais referidos. Se assim for, o problema é bem menor. As únicas estrelas para as quais não será possível por enquanto obter precisão suficiente para detectar planetas do tamanho da Terra serão cobertas pelos canais referidos. Note-se que não são apenas 3 parcelas do céu. A Kepler roda sobre si mesma 90 graus, 4 vezes por ano, para manter os painéis solares virados para o Sol.
Isto implica que os 3 canais ruidosos influenciam as medições do brilho das estrelas numa fatia maior do campo de visão do Kepler.
Entretanto, a equipa está já a fazer o seguimento de candidatos no telescópio Keck no Hawai, onde lhe foram atribuídas aproximadamente 170 horas de observação com o espectrógrafo HiRES.
Kepler: o fim do imbróglio!
Segundo informação que circula no forum Extrasolar Visions o problema com o Kepler é afinal bem menos complexo do que o faziam parecer as notícias dos últimos dias. Um dos participantes do forum escreveu à equipa de investigação da missão a qual clarificou algumas questões. Em primeiro lugar, a informação enviada pelo Kepler para a Terra consiste em milhares de pequenas janelas quadradas contendo os píxeis de cada estrela observada. Esta informação é apenas comprimida para efeitos de transmissão. Para além disto não é feito qualquer pré-processamento da mesma no Kepler.
Este facto é importantíssimo. Isto quer dizer que a informação obtida nos 3 canais ruidosos pode ser separada da restante por filtros de software uma vez na Terra. A informação recolhida pelos canais com amplificadores que funcionam com performance nominal não é afectada. Por outras palavras, o Kepler mantém, na maior parte do seu campo de visão uma performance fotométrica que lhe permite detectar planetas do tamanho da Terra em trânsito. Apenas aproximadamente 14% (4 rotações vezes 3 canais / 84 canais) do campo é afectado pelo ruído dos amplificadores e mesmo um dado campo é afectado apenas 25% do tempo num ano (mais uma vez devido à rotação da nave, os canais cobrem zonas diferentes do céu). Nestes 14% vai ser preciso trabalho adicional para extrair o ruído e obter a performance necessária. É essa a função do software referido por Borucki.
Boas notícias afinal!
Este caso mostra como é difícil fazer ciência no limite da tecnologia actual.
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