A equipa da missão WMAP (Wilkinson Microwave Anisotropy Probe) apresentou recentemente o resultado da análise de 7 anos de dados recolhidos. O objectivo principal da sonda WMAP consiste em observar a radiação cósmica de fundo com elevada precisão. Trata-se da radiação intensa libertada cerca de 380 mil anos depois do Big-Bang, quando o Universo arrefeceu o suficiente para se tornar transparente à radiação, e que sofreu um desvio para o vermelho dramático devido à expansão universal. Uma análise cuidada desta radiação permite deduzir muitas propriedades do Universo actual bem como da sua evolução. A imagem acima mostra um mapa obtido com a sonda e que representa a intensidade da radiação cósmica de fundo em todo o céu. O valor médio corresponde a um corpo negro com uma temperatura de 2.725 Kelvin (cerca de –270° C). As cores representam pequenas variações relativamente ao valor médio, sendo as regiões vermelhas, mais quentes, e as azuis, mais frias, de apenas 0.0002 Kelvin relativamente à média. A acumulação de mais 2 anos de dados permitiu à equipa da WMAP refinar os parâmetros obtidos numa análise semelhante publicada em 2008.
Em primeiro lugar, a idade do Universo foi refinada para 13.75 mil milhões de anos, com um erro de apenas 0.8%. A constante de Hubble, que é uma medida do ritmo de expansão do Universo, foi também calculada em 70.4 kilómetros por segundo por mega-parsec, com um erro inferior a 2%.
Os resultados corroboram a Teoria do Universo Inflacionário, a mais popular actualmente, e que explica a evolução do Universo até à actualidade com base eventos ao nível quântico que ocorreram nos primeiros 10^-32 segundos após o Big-Bang. Uma das previsões chave das formas mais simples desta teoria (existem muitas variantes), consiste no facto de as flutuações quânticas nestes instantes iniciais do Universo não produzirem irregularidades com a mesma intensidade em todas as escalas de distância no Universo. Os dados obtidos com a WMAP permitiram confirmar este facto, eliminando à partida formas mais complexas da teoria e reforça a ideia de que a Inflação realmente ocorreu nesta fase precoce da vida do Universo.
Os dados da WMAP permitiram estimar a densidade de energia no Universo. A densidade total da matéria normal, matéria negra e energia negra, corresponde a 1.0023 (com um erro de 0.5%) da densidade crítica, consistente com um valor de exactamente 1. Um valor de 1 corresponde a um espaço-tempo plano a grandes escalas e em que o Universo se expande indefinidamente, mas a um ritmo cada vez menor. Valores superiores a 1 correspondem a um Universo em que a densidade de energia é suficiente para parar a expansão e invertê-la. Valores inferiores correspondem a um Universo em que a densidade não é suficiente para parar a expansão.
Outro resultado relacionado corresponde à composição do Universo actual. Os resultados da WMAP apontam para os seguintes valores: matéria normal – 4.56% (erro 0.16%); matéria negra – 22.7 (erro 1.4%), e; energia negra – 72.8% (erro 0.5%). O parâmetro que determina a natureza da energia negra foi determinado em –0.980 (erro de 5%), o que é consistente com um valor de exactamente -1. Este último seria o valor que o parâmetro teria de ter caso a energia negra fosse uma propriedade constante de qualquer volume de espaço, independente da expansão sofrida pelo mesmo. A energia negra parece assim ter propriedades semelhantes à famosa constante cosmológica introduzida por Albert Einstein, nas equações que descrevem o Universo segundo a relatividade geral. Esta observação permite pôr de lado outras teorias alternativas como a “quintessência”. Nesta teoria, a densidade da energia negra varia à medida que o espaço se expande.
Outro resultado interessante consiste na detecção de padrões na radiação cósmica de fundo que mostram a existência de hélio primordial, e não apenas hidrogénio. Este é um resultado esperado mas é importante a sua confirmação. De facto, no Universo primordial, antes das primeiras estrelas, formou-se hidrogénio, hélio, e quantidades vestigiais de lítio, berílio e boro. As primeiras estrelas, ainda segundo a nova análise, formaram-se quando o Universo tinha cerca de 460 milhões de anos de idade (erro de 17%), correspondente a um desvio para o vermelho de 10.4 (erro de 11%), consistente com observações astronómicas existentes.
A produtividade desta missão só é superada pela sua importantíssima contribuição científica. É estranho trabalho de tão elevada qualidade ter tão baixa cobertura mediática. A missão europeia Planck, lançada recentemente, permitirá refinar substancialmente estes resultados, mas teremos de esperar pelo menos um ano pelos primeiros resultados.
Vejam a notícia aqui.
2 comentários
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astronomytoday.comA palavra não deveria ser "diminuiria" mas "varia". Não conheço os detalhes matemáticos da teoria, no entanto, a teoria da quintessência diz que a natureza repulsiva ou atractiva da energia negra depende em última análise da sua interacção com a matéria no Universo, e essa interacção variou ao longo da evolução do Universo, de tal modo que só há cerca de 10 mil milhões de anos a energia negra se tornou numa força repulsiva dominante. Exactamente porquê nessa altura, não se sabe ao certo.
Este artigo pode ser interessante:
http://www.astronomytoday.com/cosmology/quintesse…
Interessante!
Mas. a mim, que percebo pouco de cosmologia, levanta-se-me uma questão:
1 – Citando:-"Nesta teoria, a densidade da energia negra diminuiria à medida que o espaço se expande. "
Pergunta: Se a densidade da energia negra diminui à medida que o espaço se expande, e sendo essa energia considerada como a responsável pela aceleração da expansão, como é que as duas coisas batem certas?
Como é que a velocidade da expansão continua a acelerar?
Alberto