© U. Texas (simulação da formação das primeiras estrelas)
No início da formação do Universo, estrelas de grande massa (pelo menos 10 vezes a massa do Sol) e vida curta eram as principais fábricas de elementos químicos que entravam na composição de novas estrelas.
Além de grandes, esses corpos celestes também giravam depressa, propõe um estudo liderado pela astrônoma brasileira Cristina Chiappini, do Instituto Leibnitz para Astronomia de Potsdam, na Alemanha, publicado na revista Nature desta semana.
“A presença de alguns elementos em estrelas antigas só pode ser explicada se as estrelas massivas da época tivessem rotação rápida”, explica Cristina. A ideia brotou do trabalho de Beatriz Barbuy, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP), que em 2009 publicou um artigo na revista Astronomy & Astrophysics em que analisava 8 estrelas muito velhas – por volta de 12 bilhões de anos – no centro da nossa galáxia.
A astrônoma da USP examinou imagens captadas pelo Very Large Telescope (VLT), do Observatório Europeu do Sul (ESO), que registram os espectros de elementos na atmosfera dos corpos celestes. Beatriz notou uma abundância excessiva de bário e lantânio, elementos pesados que precisariam de um processo lento para se formarem. Só que essas estrelas nasceram no início da formação do Universo, quando ainda não tinha passado tempo suficiente para que esses elementos se formassem da forma tradicionalmente aceita.
Cristina logo percebeu a ligação com o trabalho do grupo do Observatório de Genebra, a que está associada, com modelos de alta rotação de estrelas. O movimento poderia explicar a presença desses metais porque funciona mesmo como uma batedeira, levando a processos de mistura dentro da estrela que permitem a captura lenta de nêutrons, produzindo os chamados elementos-s. Sem rotação, esses elementos seriam produzidos somente em estrelas de baixa massa, com tempos de vidas muito longos.
Cristina procurou então Beatriz, com quem tinha contato desde que fez doutorado na USP, e pediu que verificasse nos espectros a quantidade de outros metais, ítrio e estrôncio, nessas estrelas antigas. Voltando às imagens, viu valores perfeitamente compatíveis com o modelo da pesquisadora radicada na Europa: só estrelas de grande massa em rotação vigorosa poderiam gerar aqueles elementos nas quantidades necessárias para compor as anciãs ainda vivas hoje.
Não é a única explicação possível, mas é a mais plausível. A conclusão é ainda mais forte porque dois pesquisadores do grupo de Genebra, proponentes de outro modelo para explicar a evolução química da galáxia, também assinam o artigo da Nature. “O modelo deles explica a evolução de algumas estrelas nesse aglomerado, mas o nosso explica todas”, conta Cristina. A interpretação ainda é mais corroborada pelo trabalho de um grupo independente da Universidade do Texas, nos Estados Unidos, que com uma técnica completamente diferente demonstrou a rotação rápida das primeiras estrelas.
Para Beatriz, o trabalho quebra um paradigma aceito pela maior parte dos pesquisadores na área. “Há 30 anos, um autor falou que as estrelas velhas são compostas por elementos formados por um processo rápido, e mostramos que não é assim.” Um grande passo, mas as duas pesquisadoras brasileiras veem a publicação na Nature como uma chave que deve lhes abrir novas portas. Com a repercussão que o trabalho deve ter, elas esperam conseguir mais tempo de observação no VLT e no Hubble, telescópios disputados por pesquisadores do mundo todo e cujo uso é determinado por mérito.
“Precisamos melhorar os modelos”, completa Cristina, “mas incluir outros metais é um processo muito lento”. Não é para menos. Os elementos que as estrelas criam, e lançam no gás do Universo quando morrem, não só formam outras estrelas, mas também o Sol, a Terra e os corpos das pessoas. Não é uma busca modesta.
Fonte: FAPESP (Pesquisa)
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1 comentário
Somos lixo estelar, ihihihh 🙂
(“forget jesus, stars died for us” :D)
Muito bom, o estudo! Posso só fazer uma sugestão, se me permite? 🙂 aqui em Portugal usa-se a escala longa, por isso bilhão (bilião), aqui, significa milhão de milhões. E está claro que o Angelo quis referir o bilhão do Brasil (e EUA e outros), que significa mil milhões. Para não se confundirem eventuais leitores (neste caso, portugueses) que não estejam a par destas convenções (e acredite que até mesmo muitos cientistas não estão, lol!), usava-se o mil milhões e pronto, “polémica” resolvida 😀