Marília Peres é Professora de Física e de Química na Escola Secundária José Saramago em Mafra. Visitou recentemente o JET – o Joint European Torus, que é o maior reactor de fusão nuclear do mundo, perto de Oxford, no Reino Unido.
1) Como surgiu a oportunidade de visitar o reactor de fusão nuclear JET?
Recebi o aviso por correio electrónico através de um grupo de professores de Física e Química. Posteriormente vi na página da Sociedade Portuguesa de Física e resolvi candidatar-me à proposta do Instituto de Plasmas e Fusão Nuclear (IPFN), para um Workshop sobre Fusão Nuclear para professores do Ensino Secundário a decorrer no IPFN (IST) e no JET, de 5 a 9 de Setembro de 2011.
2) Sabemos que a fusão nuclear fusiona, mistura, os núcleos dos átomos, em invés dos bombardear como o faz a fissão nuclear. A fusão imita o Sol e evita todos os perigos relacionados com os reactores de fissão hoje em actividade. Quer-nos contar a sua visita?
Foi uma visita muito rápida e interessante. Um grupo de 12 professores acompanhados de pessoal do IPFN chegou ao JET (Vídeo Institucional ) perto das 20h 30m no dia 7 deste mês e após uma refeição super rápida conhecemos alguns dos nossos investigadores que lá trabalham para nos acompanharem na visita à sala de controlo e ao próprio Torus.
Esta visita ao Torus só é possível à noite e apenas em alguns dias da semana, quando não está em funcionamento.
As fotografias que tirei ou, outras disponibilizadas pelo próprio JET (Galeria de Imagens) não conseguem fazer justiça à dimensão e à complexidade da tecnologia envolvida.
No dia seguinte assistimos a duas conferências muito pertinentes sobre o tema e estivemos com vários investigadores que trabalham no JET. Voltamos a poder visitar a sala de controlo, e desta vez em pleno funcionamento para assistirmos à produção do plasma através de um vídeo de uma das muitas câmaras instaladas no interior do JET. Foi muito interessante perceber a linha de comando dentro da Sala de Controlo. Eles não podem falhar!
O Torus neste momento está a estudar alguns pormenores referentes às propriedades dos materiais que constituem as paredes que confinam o plasma (pois tem de suportar temperaturas elevadíssimas), por isso não está a testar a fusão, mas “apenas” a produção e o confinamento do plasma. O JET está a preparar tudo para o ITER entrar posteriormente em acção.
Devo referir que a visita ao JET foi antecedida por dois dias de seminários e visita ao reactor Tokamak ISTTOK, no Centro de Fusão Nuclear do Instituto Superior Técnico em Lisboa.
3) Como poderá agora inserir a sua aprendizagem neste reactor nas aulas que lecciona?
Não vão faltar oportunidades, pois no ensino secundário falamos de fusão e fissão, e quando for ensinar electromagnetismo ou microondas, já conheço mais um contexto real que os vai deixar muito interessados.
4) A visita tem repercussões em termos de carreira profissional, para além do óbvio benefício dos seus alunos e alunas?
A visita vale por aquilo que aprendi e que posso transmitir. Mas, o IPFN teve o cuidado de transformar a visita e seminários numa acção creditada pelo Conselho Científico Pedagógico da Formação Contínua, logo poderá servir para o meu curriculum docente.
5) Como vê o estado de desenvolvimento deste tipo de geração de energia, ou seja, quando pensa que esta se poderá integrar nas redes de energia eléctrica a que nos acostumámos como um dado garantido?
Infelizmente, como diz a malta do futebol “previsões só no fim do jogo”. Temos ainda algumas décadas de investigação pela frente para conseguirmos rentabilizar a energia da fusão nuclear, produzida pelo homem. Como digo aos meus alunos: “pessoal toca a trabalhar que a Física está a precisar da vossa ajuda”.
6) O que pensa ainda ser relevante dizer para os nossos leitores?
Apesar do grande investimento que está a ser feito no JET e que vai ser feito no ITER e espero no DEMO, não conseguiremos rentabilizar economicamente para já estes reactores. De qualquer modo a o conhecimento científico e tecnológico está a avançar rapidamente graças a estes reactores e isto só nos pode trazer benefícios.
7) Deve ter entretanto reparado que assistimos a uma semana notável na descoberta de novos exoplanetas, pensa que há vida, mesmo que esta seja simples, no Universo, para além da que conhecemos aqui na Terra?
E porque não? Já passaram uns séculos desde que o nosso planeta “deixou” de estar no centro do universo.
8) Quais são os temas científicos normalmente preferidos pelos seus alunos (as)?
Em turmas de ciências existem normalmente 3 grupos de alunos: os engenheiros, os biólogos e os que ainda não sabem bem o que querem. Os primeiros adoram tudo o que seja Astronomia, Física de partículas e outros temas de Física relacionados com grande tecnologia. Os segundos gostam de qualquer tema relacionado com a vida. Os últimos tanto se interessam por tudo, como não querem saber de nada…
A grande maioria tem a qualidade essencial para ser cientista: são curiosos.
9) Reparei que é leitora assídua aqui do Astro PT. Gostaria de sugerir algum tema que gostasse de ser tratado?
Até agora tenho aprendido muito com as vossas escolhas. Continuem.
Em meu nome e do AstroPt desejamos um excelente ano lectivo a todos os Alunos e Professores, com uma saudação especial à Escola Secundária José Saramago em Mafra. Muito Obrigado.
A fim de elucidar sobre as diferenças essenciais entre a fusão nuclear, que está ainda em desenvolvimento, e a fissão nuclear que existe hoje nos reactores em funcionamento, adicionamos um tutorial em video do Cassiopeia Project sobre este tema.
Poderão aceder a legendas fonéticas em Português, seleccionando CC> Captions Actions>Transcribe Audio> Translate Captions>Idioma>Português.
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1 comentário
Uma excelente entrevista! Bravo Marília e bravo Manel!!!
Adorei o “E porque não? Já passaram uns séculos desde que o nosso planeta “deixou” de estar no centro do universo.” :DDDDDDD