Dezessete de fevereiro de 1600, Praça das Flores, centro de Roma.
Um homem de 52 anos estava condenado à morte sem derramamento de sangue: fogueira. Trajava trapos, estava amarrado a uma estaca e tinha um prego e uma trava de metal na língua para não poder proferir nenhuma palavra ou ofensa à Santa Igreja.
Seu nome é Giordano Bruno (1548-1600), filósofo, e seu crime tão horrível: ter ideias que contrariaram as dos poderosos. Uma dessas ideias foi ter imaginado um Cosmos povoado de estrelas, com planetas ao redor dessas estrelas, e com outros habitantes nesses planetas, antes mesmo de Galileu inventar o telescópio. A ideia abalou a concepção da Igreja porque tirava a Terra e o Homem de uma posição especial para assumir um lugar qualquer entre infinitos mundos no Universo.
Aristóteles (384-322 a.C.) e Ptolomeu (90-168) imaginavam a Terra no centro do Universo, com a Lua, o Sol e os planetas girando ao redor dela. As estrelas estariam grudadas em uma esfera celeste gigante ao redor de todo o conjunto.
Aristóteles colocava a Terra estática no centro do Universo, pois para ele, se a Terra se movesse, uma pedra jogada de uma torre cairia em diagonal. Bruno mostrou que o argumento era inválido com o seguinte exemplo: se um peso for jogado do alto do mastro de um navio, cairá paralelo a ele, pois o objeto assume o movimento da embarcação e cai em linha reta diante do observador que está no navio. Apenas um observador de fora da embarcação notaria a trajetória em curva, do objeto que por inércia manteve a velocidade em que está. Assim, também o objeto que cai de uma torre também assume o movimento da Terra. Uma década depois o mesmo exemplo foi usado por Galileu.
Nicolau Copérnico (1473-1543) implementou o Sistema Heliocêntrico, tirou a Terra do centro e colocou o Sol no lugar. Foi ele também quem percebeu que as estrelas não estão presas a uma esfera, mas soltas e a diferentes e enormes distâncias no Universo. Mas não imaginava que o Sol era uma delas.
Muito mais correto que seus antecessores, nem o Sol e nem a Terra, para Giordano Bruno, o Universo é infinito e portanto nada poderia estar no centro. Pela primeira vez na história, ele disse que o Sol era uma Estrela, como as outras, e que essas também tinham planetas.
Quatrocentos anos após sua morte na Roma seiscentista, ano 2000, o número de sistemas com exoplanetas ao redor de outros sóis conhecidos pela astronomia já chegava a dezenas, hoje são milhares já catalogados, enquanto as teorias astronômicas os estimam em centenas de bilhões, só nessa galáxia, que é uma entre centenas de bilhões de galáxias.
A história desse “profeta de outros mundos” deixa uma significativa lição do valor da constante luta do pensamento científico contra o conservadorismo, e também do potencial de até onde a imaginação, a análise e a reflexão podem levar um homem, sem telescópio, sem satélites e com todas as ideias e ideais do mundo contra si: até as estrelas.
14 comentários
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Desculpe Rui Costa… suas lições estão no mínimo equivocadas:
1-Caminho para o conhecimento: Dentro da comunidade científica existem religiosos, embora esses sejam a minoria e que normalmente não divulgam ser religiosos (crentes) pelo simples fato que os ateus iram persegui-los, aja vista que esses cientistas ateus exigem um “experimento científico” que comprovem a existência de um DEUS!
2-Dizer que TODAS as religiões não são tão inócuas é generalização sem base, pois você precisaria conhecer TODAS as religiões a fundo para fazer tal afirmação, bem como conhecer todos os membros, inclusive alguns que são cientistas. Além disso, existem religiões que conduzem a um conhecimento que conduz a vida eterna, o qual no meu entender, seria muito mais proveitos que conhecer exatamente quantos planetas de fato existem no sistema galáctico interestelar, que no meu ponto de vista, é irrelevante em termos práticos.
André,
Você não está equivocado… você está errado.
1 – Ninguém anda a perseguir ninguém. Para tudo se exigem provas, seja sobre a Teoria da Gravidade, seja a Einstein, seja a qualquer ideia de Pai Natal (ou Deus) que exista por aí. Ou você quer tratamento preferencial para as suas crenças?
2 – A partir do momento em que crenças se sobrepõem ao conhecimento e que isso afecta a vida (saúde, dinheiro, etc) das pessoas, então essas crenças/religiões deixam de ser inócuas.
Não há nenhuma religião que conduza a um conhecimento de vida eterna. isso são crenças para crianças dormir. Se quer vida eterna, estude genética.
Quanto ao conhecimento espacial ser irrelevante, sugiro que leia a nossa categoria sobre “Vantagens da exploração espacial”. Estão lá centenas de exemplos de tecnologia que você utiliza ignorantemente na sua vida, não sabendo que ela só existe devido a esse conhecimento espacial.
Enfim… perdeu uma boa oportunidade de se informar, ANTES de fazer comentários errados.
abraços
No tempo de Giordano Bruno não havia quais dados ou informação que sustentasse as hipóteses ou o modelo do Universo que ele propunha. Nenhuma observação que ele ou outro ser humano fizessem lhe poderia dar quaisquer dados relativos a possíveis planetas em redor de outras estrelas. Também não existiam ainda quaisquer instrumentos que o auxiliassem.
Assim, o seu modelo cosmológico não passava de especulação ou até mesmo um palpite que, por acaso, se veio a mostrar estar próximo da realidade.
Se aqueles que se opunham às suas ideias estavam errados (sabemo-lo agora…) e também não tinham forma de verificar as suas ideias sobre a forma ou estrutura do Universo, também Giordano não tinha.
Infelizmente neste caso, como em outros, o caso acabou muito mal para quem tinha a razão do seu lado… ainda que a razão se baseasse em mera especulação. É difícil lutar contra os dogmas e a intransigência de quem tem os meios e a “justiça” do seu lado.
Daqui podem tirar-se duas lições:
A primeira é que os preceitos e os dogmas religiosos não ajudam a encontrar o caminho para o conhecimento;
A segunda é que as religiões (sejam elas quais forem) não são tão inócuas como muitos julgam…
Author
É verdade, valeu a lembrança. Foi inclusive no AstroPT que li sobre uns 2.000 candidatos… mas certamente vai passar dos milhares logo, hehe.
Dessa parte da história eu não sabia, Bruno pesquisou uma espécie de ocultismo renascentista europeu? quer dizer que por isso ele deve ter recebido a mesma punição das acusações de bruxaria… presumo.
Bem, mago negro ou não, :), nosso amigo acertou na mosca o modelo do Universo. Acho que deveriam nomear um exo-planeta Giordano Bruno. 😀
Abraços
“Acho que deveriam nomear um exo-planeta Giordano Bruno. ”
Concordo 😀
Eu tenho impressão que vai acabar por acontecer ;). Afinal, popularmente, ele é o “pai” da ideia de “inúmeros mundos”. 🙂
abraços!
Olá Jonatas,
3 pequenas coisas 😉
1 – Não são as teorias astronómicas que nos dizem que poderá haver biliões de planetas, mas sim a especulação científica 🙂
2 – Não há milhares de planetas já catalogados. Existem quase 900 exoplanetas confirmados e catalogados ;). Existem mais candidatos, mas esses não estão confirmados 😉
http://exoplanet.eu/
3 – Bruno não foi condenado pelas suas ideias astronómicas, se bem que essas ideias não o ajudaram em nada, claro 😉
Bruno foi condenado por seguir o Hermetismo ;). Ele seguiu as ideias astronómicas do Sol no centro devido à sua ideia religiosa 😉
http://pt.wikipedia.org/wiki/Hermetismo
http://pt.wikipedia.org/wiki/Giordano_Bruno#Ide.C3.A1rio
abraços!
Obrigada pela informação, Pedro Silva. Grata.
Filme italiano que narra a história de Giordano: http://www.youtube.com/watch?v=nP78KdK_tSQ
Não sei se é bom ou mau, pais nunca vi, mas fica a informação.
Excelente. Tenho que ver 😀
Muito bom! Adorei! O título é belo…
Nos dias que correm, as pessoas podem dizer disparates, ou o que lhes “passa na cabeça”. A ofensa e a calúnia é que se torna punível pela Justiça com coima ou indeminização; se devidamente provada e em tempo útil definido por Lei.
Mas se algum Cidadão “desabafar” alguma ideia ou conceito que seja tomado por “agressivo” ou “ofensivo” para os interesses de alguém ou algum grupo com poder na nossa sociedade, então medidas de coação a nível da vida social, privada ou mesmo no posto de trabalho do dito Cidadão serão empregues para o dissuadir da intenção, além de que se o argumento usado tornar-se convidativo para os demais, há que tentar desacreditar as ideias.
A alternativa, não é tão violenta como no século XVII, mas na maioria dos casos “lixam” a vida a um “tipo” se ele empregar os adjetivos corretos a certas entidades ou pessoas!
Paulo ou José do mesmo IP, porque não utiliza só uma identidade, que até seja verdadeira?
Nos dias que correm, as pessoas podem dizer disparates, ou o que lhes “passa na cabeça”. A ofensa e a calúnia é que se torna punível pela Justiça com coima ou indeminização; se devidamente provada e em tempo útil definido por Lei.
Mas se algum Cidadão “desabafar” alguma ideia ou conceito que seja tomado por “agressivo” ou “ofensivo” para os interesses de alguém ou algum grupo com poder na nossa sociedade, então medidas de coação a nível da vida social, privada ou mesmo no posto de trabalho do dito Cidadão serão empregues para o dissuadir de alertar os outros, além de que se o argumento usado tornar-se convidativo para os demais, há que tentar desacreditar as ideias.
A alternativa, não é tão violenta na maioria dos casos, mas “lixam” a vida a um “tipo” se ele empregar os adjetivos corretos a certas entidades ou pessoas!
Bem haja.
Muito bom, parabéns por nos recordar
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