Telescópio Chandra Observa Remanescente de Supernova Mais Jovem da Via Láctea

Em 2008 uma equipa de astrofísicos utilizando o Telescópio Chandra, de raios X, e o radiotelescópio VLA (Very Large Array) identificou o mais jovem remanescente de uma supernova na Via Láctea, por outras palavras, os restos da explosão mais recente de uma estrela na nossa Galáxia. Este facto foi noticiado no AstroPT. A velocidade de expansão do remanescente, medida ao longo de vários anos, aponta para uma idade de pouco mais de 100 anos, i.e., a supernova que lhe deu origem deveria ter sido visível pouco antes do início do século XX. De facto, tal não aconteceu porque a estrela que explodiu estava situada na zona central da nossa galáxia a uma distância estimada de 28 mil anos-luz e por detrás de um véu de gás e poeiras que obscurecem a luz em várias dezenas de magnitudes. O remanescente é designado por G1.9+0.3, em que o ‘G’ se refere a um sistema de coordenadas galácticas e os números, à longitude (de 0 a 360 graus) e latitude (de -90 a 90 graus). Neste sistema, G0.0+0.0 corresponde ao centro da Via Láctea.

O objecto ganhou grande notoriedade pela sua juventude e os cientistas quiseram naturalmente saber mais. Agora, num trabalho recém publicado, uma equipa de astrofísicos descreve uma observação particularmente profunda, com a duração de mais de 11 dias, de G1.9+0.3, obtida em 2011 novamente com o telescópio Chandra. A imagem seguinte mostra o resultado dessa observação com as cores vermelho, verde e azul utilizadas para sinalizar a emissão de raios X de energias crescentes. As estrelas são provenientes de uma imagem do Digitized Sky Survey à qual foi sobreposto, à escala, o remanescente.

A supernova remnant in the Milky Way located about 28,000 light years from Earth
(Crédito: X-ray (NASA/CXC/NCSU/K.Borkowski et al.); Optical (DSS))

A imagem e os dados recolhidos são particularmente interessantes e ensinam-nos desde já várias coisas sobre o objecto. Em primeiro lugar, uma análise da quantidade de energia emitida pelo remanescente em função do comprimento de onda e o tipo de elementos nele identificados, apontam fortemente para que a supernova que deu origem ao remanescente tenha sido de tipo Ia. Este tipo de supernova resulta da explosão termonuclear de uma anã branca num sistema binário e o seu estudo como classe é importante, entre outras coisas, porque elas constituem as velas padrão que nos permitem medir com precisão o ritmo da expansão universal.

Uma supernova brilhante deste tipo apareceu em 2011 na galaxia M101 e neste artigo expliquei o que acontece neste tipo de evento. Um trabalho mais recente, liderado pelo astrofísico português Rui Pereira (Institut de Physique Nucléaire de Lyon) e publicado na revista Astronomy & Astrophysics, mostra que a dita supernova, designada de sn2011fe, foi completamente normal, no sentido em que se comportou de acordo com as previsões dos modelos existentes, sem peculiaridades.

Mas G1.9+0.3, não parece ter sido uma supernova de tipo Ia normal. A maioria dos raios X emitidos pelo remanescente resultam da aceleração de electrões no campo magnético intenso da onda de choque da supernova. Este mesmo processo parece estar na origem dos ‘raios cósmicos’, partículas elementares ultra-energéticas que bombardeiam incessantemente a Terra e cuja origem era até há poucos anos um mistério. Outra parte da radiação X é proveniente da emissão de linhas de elementos químicos específicos, permitindo a determinação da composição química do remanescente, uma pista crucial para determinar o tipo de supernova, como foi de resto referido. Mas a distribuição espacial destes elementos é notável no G1.9+0.3. Os remanescentes de supernovas de tipo Ia normais, como a sn2011fe, são simétricos e os elementos químicos estão distribuídos de forma regular e respeitando a profundidade a que se formaram na estrela original pré-supernova. No G1.9+0.3 pelo contrário, a emissão de raios-X provenientes de elementos como o silício, o enxofre e o ferro é mais intensa na extremidade norte do remanescente, dando origem a um padrão extremamente assimétrico. Outra característica excepcional consiste no facto da emissão proveniente de átomos de ferro, que se formam na zona mais interior da estrela durante a supernova, ser observada longe do centro do remanescente e com velocidades de expansão associadas na ordem dos 6.1 milhões km/h. O ferro encontra-se misturado com elementos que se formam em camadas mais exteriores da estrela durante a supernova. É como se, de alguma forma, em algumas direcções, a explosão tivesse virado a estrela do avesso. A existência desta assimetria e a velocidade de expansão muito elevada leva os autores a pensar que este terá sido um evento anormalmente energético.

Podem ver a notícia original aqui.

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