(Representação artística de uma magnetar. Crédito: ESO/L.Calçada)
A descoberta recente de supernovas de tipo II (com linhas de hidrogénio no espectro) anormalmente luminosas e muito distantes (i.e., que ocorreram quando o Universo era mais jovem) por exemplo aqui, aqui e aqui levaram os investigadores a pensar que poderiam estar a presenciar a explosão de estrelas por um processo, proposto por teóricos em finais dos anos 60, designado de pair instability.
A luminosidade de uma supernova, mais concretamente, o tempo que demora a atingir o brilho máximo e o intervalo de tempo durante o qual consegue manter um brilho elevado, depende quase exclusivamente da quantidade de um isótopo radioactivo de Níquel, o 56Ni, que é formado durante a fase inicial da explosão. Nas semanas e meses seguintes a supernova brilha em resultado dos raios gama produzidos pelos decaimentos do Ni56 num isótopo de Cobalto, o 56Co, e deste último num isótopo estável do Ferro, o 56Fe. Uma supernova de tipo II normal produz aproximadamente uma massa solar de 56Ni. Supernovas muito luminosas têm de produzir uma grande quantidade de 56Ni durante a explosão; cada uma das supernovas estudadas nos artigos acima referidos foi tão luminosa que deveria ter produzido algumas dezenas de massas solares deste isótopo.
Só estrelas muito maciças, estrelas com massas superiores a aproximadamente 150 vezes a massa do Sol, e com baixo teor em “metais”, elementos mais pesados do que o hidrogénio e hélio, conseguiriam produzir tal quantidade de 56Ni. Estrelas como estas são muito raras no Universo actual pois a maior parte do material interestelar, a partir do qual se formam as estrelas, está contaminado com “metais” produzidos por gerações sucessivas de estrelas; por outro lado, seriam mais abundantes quando o Universo era mais jovem. Estrelas tão maciças não explodem pelo mecanismo de colapso gravitacional, como é o caso das supernovas de tipo II, mas antes pelo referido processo de pair instability. O interior destas estrelas é extremamente quente devido à enorme massa e à compressão resultante. Num determinado momento a energia dos fotões de raios gama no interior da estrela, que sustêm o peso das camadas exteriores, pode tornar-se tão elevada que os fotões se transformam espontaneamente em pares de electrão-positrão (partícula e anti-partícula), daí a palavra pair. Esta reacção absorve uma fracção importante da energia disponível para manter a estrela em equilíbrio, daí a palavra instability, e a zona nuclear começa a contrair-se rapidamente. Ao contrário do que acontece num colapso gravitacional clássico, no entanto, esta contracção aumenta as temperaturas no interior até um nível que despoleta uma cadeia de reacções de fusão nuclear de forma descontrolada, as quais libertam energia suficiente para vencer a gravidade e destruir por completo a estrela. Trata-se de um mecanismo semelhante ao de uma bomba termonuclear, e.g., a bomba de hidrogénio.
Ao observar estas supernovas tão luminosas a milhares de milhões de anos no passado, os astrónomos sugeriram, naturalmente, que poderiam tratar-se dos primeiros exemplos de supernovas pair instability. Entretanto, um artigo agora publicado na revista Nature propõe um cenário alternativo para explicar a luminosidade destas supernovas. Matt Nicholl, do Astrophysics Research Centre, Queen’s School of Mathematics and Physics, e os seus colaboradores, realizaram cálculos que sugerem que estas supernovas podem ser mais normais, resultantes do colapso gravitacional de estrelas progenitoras com características menos extremas do que as avançadas pelo cenário anterior; no novo cenário, a energia suplementar que permitiria uma tal supernova atingir um pico de brilho acima do normal e manter-se brilhante durante mais tempo teria origem numa magnetar, uma estrela de neutrões com um campo magnético extraordinariamente intenso. As magnetars, formam-se em supernovas de colapso gravitacional em circunstâncias ainda mal compreendidas. São conhecidas apenas 20 destas estrelas de neutrões em toda a Via Láctea. Estima-se que, no instante em que são criadas, girem em torno do seu eixo de rotação 300 vezes por segundo e tenham um campo magnético mil vezes mas intenso do que o de uma estrela de neutrões normal e mil milhões de milhões de vezes mais intenso do que o campo magnético terrestre. No cenário apresentado por Nicholl e co-autores, uma magnetar formada numa supernova, perde energia rotacional através do seu campo magnético que, por sua vez, transfere essa energia para o plasma de partículas e núcleos atómicos que forma o remanescente da supernova. Os cálculos realizados pela equipa mostram que a quantidade de energia transferida por este processo de travagem da magnetar permite explicar de forma quase perfeita as observações existentes das supernovas de luminosidade anormalmente elevada. Este cenário pode também explicar uma outra característica das magnetars: o facto de terem períodos de rotação anormalmente longos (entre 1 e 10 segundos) quando comparadas com outras estrelas de neutrões, como se, no seu caso, algum mecanismo tivesse sugado essa energia rotacional precocemente.
2 comentários
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Olá Ricardo,
Os magnetars são estrelas de neutrões (imagina uma estrela com 1.5 vezes a massa do Sol e com um raio de apenas 15km) formadas durante o colapso de estrelas maciças. Durante o colapso a parte interna da estrela transforma-se numa estrela de neutrões, enquanto as camadas exteriores são atiradas a grande velocidade para o espaço. Em certos casos a estrela de neutrões formada tem um campo magnético extremamente intenso e é designada de magnetar. O que os autores sugerem, e mostram os calculos que suportam o cenário, é que parte da energia da magnetar é transferida para as camadas exteriores da estrela através do seu campo magnético, tornando a explosão da estrela mais brilhante do que é normal.
Os magnetares dão origem a estas estrelas muito brilhantes, ou há um sistema binário estrela/magnetar no qual o magnetar “energiza” a estrela?