Comparação entre o sistema planetário de 55 Cancri A e o Sistema Solar.
Crédito: NASA/JPL-Caltech.
Os cientistas têm-se debatido para encontrarem um modelo teórico que explique de forma satisfatória a complexidade do sistema planetário que acompanha a estrela binária 55 Cancri. Localizado na direcção da constelação do Caranguejo, a apenas 40,3 (±1,3) anos de distância da Terra, o sistema é composto por uma anã amarela de tipo espectral G8V, orbitada por pelo menos cinco planetas, e uma anã vermelha de tipo espectral M3,5, situada a cerca de 1065 UA de distância da estrela primária. Os três planetas mais interiores encontram-se numa configuração muito compacta, em órbitas muito mais próximas da sua estrela que a de Mercúrio relativamente ao Sol.
A presença de dois planetas gigantes em órbitas tão próximas de 55 Cancri A constituiu um verdadeiro mistério desde que os astrónomos abordaram pela primeira vez o problema em 2002. Situados, respectivamente, a 0,113 e 0,237 UA de distância da sua estrela, os dois planetas massivos 55 Cancri Ab e 55 Cancri Ac (informalmente conhecidos por 55 Cancri b e 55 Cancri c) vivem, aparentemente, no limiar de uma catástrofe. Interacções gravitacionais entre os dois objectos sujeitam as suas órbitas a evoluções dramáticas, que não se conciliam com a estabilidade do sistema a longo termo.
Uma equipa liderada por investigadores da Universidade do Estado da Pennsylvania, nos Estados Unidos, vem agora propor uma solução engenhosa para este problema. Num trabalho publicado na semana passada na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, Benjamin Nelson e colegas apresentam o primeiro modelo viável que explica a configuração deste fascinante sistema planetário.
“O sistema planetário de 55 Cancri é único, tanto na riqueza da diversidade dos seus planetas conhecidos, como no número e variedade das observações astronómicas”, disse Eric Ford, investigador da Universidade do Estado da Pennsylvania e co-autor deste trabalho. “A complexidade deste sistema torna as suas observações extraordinariamente difíceis de interpretar.”
Para a realização deste trabalho, Nelson e Ford colaboraram com cientistas de computação para desenvolverem uma ferramenta que permitisse a simulação de sistemas planetários usando placas gráficas para acelerar os cálculos. A combinação de múltiplas observações da velocidade radial de 55 Cancri A com o estudo dos trânsitos de 55 Cancri Ae, o mais interior dos planetas deste sistema, permitiu que, pela primeira vez, emergissem das simulações modelos com configurações orbitais estáveis para os cinco planetas, abrangendo períodos mínimos de centenas de milhões de anos.
A análise realizada pelos investigadores possibilitou ainda a confirmação da massa e do raio de 55 Cancri Ae. Dados obtidos neste trabalho revelaram que o planeta mais interior do sistema tem oito vezes a massa da Terra, e o dobro do raio do nosso planeta, o que sugere uma densidade semelhante à da Terra. Com um período orbital de apenas 18 horas e temperaturas na sua superfície superiores a 2100 ºC, 55 Cancri Ae é demasiado quente para ter água em estado líquido.
Representação artística mostrando as dimensões relativas dos planetas Terra e 55 Cancri Ae.
Crédito: NASA/JPL-Caltech/R. Hurt (SSC).
A determinação das trajectórias dos dois gigantes interiores foi fundamental para os investigadores definirem com precisão as propriedades da órbita de 55 Cancri Ae. “Estes dois planetas gigantes interagem tão fortemente que podemos detectar mudanças na sua órbita”, afirmou Benjamin Nelson. “Estas detecções são impressionantes porque permitem-nos aprender coisas acerca das órbitas que normalmente não são observáveis. No entanto, as rápidas interacções entre os planetas também constituem um desafio, pois a modelagem do sistema requer simulações demoradas para cada modelo, para determinar as trajectórias dos planetas e, portanto, a probabilidade de sobrevivência por milhares de milhões de anos sem uma colisão catastrófica.”
“A maioria das análises anteriores ignoraram as interacções entre planetas”, sublinha Ford. “Alguns dos primeiros estudos incluíram estes efeitos nos seus modelos, mas apenas realizaram análises estatísticas simples, devido ao grande volume de cálculos necessários para uma análise adequada.”
A proximidade do sistema planetário de 55 Cancri A possibilitou aos astrónomos a medição directa do raio da sua estrela – uma observação que apenas é possível para alguns dos nossos vizinhos estelares mais próximos. A determinação do raio da estrela permitiu calcular com precisão a sua massa – aproximadamente a mesma do Sol – bem como o tamanho e a densidade do seu companheiro planetário 55 Cancri Ae.
“Como 55 Cancri é muito brilhante e pode ser vista a olho nu, os astrónomos foram capazes de medir a velocidade desta estrela mais de mil vezes em quatro observatórios diferentes, dando aos planetas neste sistema muito mais atenção do que a maioria dos exoplanetas recebem”, afirmou Jason Wright, professor assistente da Universidade do Estado da Pennsylvania, e líder de um programa que tem como objectivo examinar este e outros sistemas planetários.
Este novo trabalho faz parte de um esforço maior para desenvolver técnicas que irão ajudar na análise de futuras observações de estrelas próximas e brilhantes. Estas observações terão como objectivo principal a procura de planetas com características semelhantes às da Terra. Para executar esta tarefa, os astrónomos irão usar uma combinação de novos observatórios e novos instrumentos, como o projecto MINERVA ou o HPF (Habitable Zone Planet Finder), um espectrógrafo que irá ser instalado no telescópio Hobby-Eberly, um dos maiores telescópios ópticos do mundo.
“Os astrónomos estão a desenvolver instrumentação topo de gama para os maiores telescópios do mundo detectarem e caracterizarem planetas potencialmente parecidos com a Terra”, disse Ford. “Estamos a emparelhar estes esforços com o desenvolvimento de ferramentas computacionais e estatísticas topo de gama.”
Podem ler mais pormenores acerca deste trabalho aqui.
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