As novas resultam da explosão provocada pela fusão descontrolada do hidrogénio na superfície de uma anã branca. O hidrogénio acumula-se na superfície da anã branca pois esta faz parte de um sistema binário com uma estrela normal cuja dimensão excede o tamanho do seu lobo de Roche. O lobo de Roche é uma superfície imaginária que define a região do espaço dominada gravitacionalmente por uma estrela relativamente a uma companheira. Parte do material que escapa do lobo de Roche da estrela normal cai num disco de acreção que rodeia a anã branca e acumula-se ao longo de dezenas de milhares de anos na sua superfície.
[Os lobos de Roche das componentes de um sistema binário.]
Tipicamente estes sistemas situam-se a vários milhares de anos-luz pelo que, num estado normal são pouco brilhantes e visíveis apenas com telescópios de grande dimensão. Devido à intensa gravidade superficial da anã branca, o hidrogénio é comprimido e aquecido até atingir cerca de 20 milhões de Kelvin, altura em que se inicia a fusão deste elemento. A reacção é descontrolada e em poucos segundos todo o hidrogénio depositado na superfície da anã branca é atirado para o espaço, com velocidades que atingem vários milhares de quilómetros por segundo, parcialmente processado em novos elementos. A energia libertada na explosão aumenta temporariamente a luminosidade do sistema por um factor entre os 50 e 100 mil vezes. A anã branca permanece intacta e o processo de acreção de material a partir da companheira recomeça de novo.
Para um observador casual do céu, sem acesso a instrumentos ópticos, as novas aparecerem de forma imprevisível num local onde, aparentemente, não existia nenhuma estrela. Esta era a percepção dos nossos antepassados, sem o benefício do conhecimento científico actual, e daí o termo nova, que tem origem no Latim. No entanto, o fenómeno não é permanente. Ao fim de algumas semanas ou meses o brilho do sistema diminui drasticamente e, para o observador, a estrela desaparece de novo no anonimato. Todos os anos são descobertas várias novas na nossa galáxia, a Via Láctea. Nem todas são suficientemente luminosas para serem observadas a olho nu, já que o gás e as poeiras existentes no espaço interestelar são muito eficientes na absorção da luz proveniente da explosão. Uma nova visível a olho nu é, por isso, um fenómeno mais raro. O exemplo mais recente, para observadores no hemisfério norte foi a nova Delphini 2013, que apareceu em Agosto do ano passado na constelação do Golfinho.
[A Nova Delphini 2013, vísivel em Agosto de 2013 na constelação do Golfinho. Crédito: Bob King]
Devido à elevada energia que envolve o fenómeno, a detecção de raios X provenientes de novas foi encarada com naturalidade e facilmente explicada pelos astrofísicos. No entanto, poucos acreditariam que as novas pudessem também produzir grande quantidade de raios gama, a forma mais energética de radiação electromagnética. Foi assim com alguma surpresa que, em Março de 2010, foi anunciado que o Large Area Telescope (LAT) do observatório espacial Fermi, havia detectado raios gama provenientes da nova designada V407 Cygni (na constelação do Cisne). Este sistema é um pouco atípico relativamente a um progenitor de uma nova normal. A estrela normal neste sistema é uma gigante vermelha, centenas de vezes maior do que o Sol. Num progenitor típico a estrela normal é semelhante ao Sol, ou mais pequena, menos luminosa e o período orbital do sistema é de poucas horas. Na altura os cientistas atribuíram a produção de raios gama à colisão da onda de choque da explosão com o gás das camadas exteriores da gigante vermelha.
[Raios gama detectados pelo telescópio LAT em 4 novas. Crédito: NASA-DOE-Fermi-LAT-Collaboration]
No entanto, em 2012 e 2013, o LAT detectou também raios gama de 3 novas produzidas por sistemas perfeitamente típicos: V339 Delphini em Agosto de 2013 (já referida, na constelação do Golfinho), V1324 Scorpii em Junho de 2012 (na constelação do Escorpião) e V959 Monocerotis em Junho 2012 (na constelação do Unicórnio). Claramente, a explicação adiantada anteriormente para o caso da V407 Cygni não pode ser aplicada a qualquer destes casos já que nenhum dos 3 sistemas tem uma gigante vermelha. O que estes 4 exemplos sugerem é que a produção de raios gama por novas é um fenómeno generalizado.
[A explosão de hidrogénio acumulado na superfície de uma anã branca num sistema binário origina várias ondas de choque que colidem e aceleram partículas até velocidades relativísticas. A colisão destas partículas com fotões de mais baixa energia produz fotões gama. Este é um cenário plausível para explicar a origem dos raios gama produzidos nestas explosões. Crédito: NASA’s Goddard Space Flight Center/S. Wiessinger]
A natureza dos processos que, durante a explosão, levam à formação de fotões com energias tão elevadas não é inteiramente compreendida. Uma explicação possível, e que parece ter correspondência nas observações, consiste na possibilidade de a explosão produzir várias ondas de choque que se propagam no espaço a diferentes velocidades. As ondas de choque mais rápidas colidem com as mais lentas acelerando partículas até velocidades próximas da da luz (velocidades relativísticas). As partículas a esta velocidade interagem com fotões de energia mais baixa transferindo para eles parte da sua energia. Este processo de formação de fotões de alta energia, nomeadamente de raios gama, é comum em muitos cenários astrofísicos, por exemplo, nos remanescentes de supernova, e é designado de “Inverse Compton Scattering”.
O artigo foi publicado na edição de 1 de Agosto da revista Science e a notícia original pode ser consultada aqui.
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