Poeira e moléculas presentes na região central da nossa galáxia. Imagem construída a partir de uma combinação de dados obtidos pelo telescópio APEX e pelo observatório espacial Planck. No centro, podemos ver a nuvem de gás Sagitário B2, região onde foram detetadas pelo ALMA as moléculas orgânicas complexas isobutironitrilo e n-butironitrilo.
Créditos: MPIfR/A. Weiß (imagem de fundo), Universidade de Colónia/M. Koerber (modelos moleculares), MPIfR/A. Belloche (montagem).
Cientistas detetaram pela primeira vez uma molécula orgânica de cadeia ramificada no espaço interestelar. Denominada isobutironitrilo (i-C3H7CN), a molécula foi descoberta no interior de Sagitário B2 (Sgr B2), uma gigantesca nuvem molecular de gás localizada nas proximidades do centro da Galáxia, a cerca de 27 mil anos-luz de distância do nosso planeta. A sua deteção sugere que moléculas complexas essenciais à vida possam ter tido origem no espaço interestelar, em particular, em regiões de formação estelar. Os resultados deste trabalho foram publicados na semana passada, na revista Science.
Embora já tenham sido detetados diversos tipos de moléculas no meio interestelar, as moléculas orgânicas complexas surgem com maior abundância no interior das nuvem de gás onde são produzidas novas estrelas. “É fundamental conseguirmos compreender a produção de materiais orgânicos nas primeiras fases de formação das estrelas, para que possamos delinear a progressão gradual desde as moléculas mais simples até uma química potencialmente biológica”, afirmou Arnaud Belloche, investigador do Instituto Max Planck para a Radioastronomia, na Alemanha, e primeiro autor deste trabalho.
Conhecem-se cerca de 180 espécies moleculares distintas no espaço interestelar. Cada molécula emite luz em comprimentos de onda particulares, pelo que o seu espetro de radiação eletromagnética cria uma assinatura inconfundível que permite a sua identificação no espaço usando radiotelescópios.
Até agora, as moléculas orgânicas detetadas nas regiões de formação estelar partilhavam uma característica estrutural fundamental: todas apresentavam os seus átomos de carbono ordenados numa única cadeia linear. A nova molécula distingue-se de todas as outras porque possui um grupo metilo ligado à cadeia principal. “Esta é a primeira deteção interestelar de sempre de uma molécula com uma matriz de carbono ramificada”, disse Holger Müller, espetroscopista da Universidade de Colónia, na Alemanha, e um dos coautores do trabalho. Müller caracterizou o perfil espetroscópico da molécula em laboratório, de forma a que pudesse ser detetada no espaço.
No entanto, não foi só a estrutura da molécula que surpreendeu os investigadores. A equipa descobriu que o isobutironitrilo se encontra presente em Sgr B2, numa proporção equivalente a quase metade da concentração do seu isómero, a forma linear n-butironitrilo (n-C3H7CN). “A enorme abundância de isobutironitrilo sugere que as moléculas ramificadas poderão ser, de fato, a regra, e não a exceção, no meio interestelar”, disse Robin Garrod, astroquímico da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, e um dos coautores do trabalho.
Observatório ALMA com a região central da Galáxia como pano de fundo.
Crédito: Y. Beletsky (LCO)/ESO.
A descoberta só foi possível devido às extraordinárias capacidades do ALMA, um conjunto de radiotelescópios que operam no deserto do Atacama, no norte do Chile. “Graças às novas capacidades oferecidas pelo ALMA, pudemos realizar um levantamento espetral completo na direção de Sgr B2, nos comprimentos de onda entre 2,7 e 3,6 mm, e com uma sensibilidade e resolução espacial dez vezes superior ao de anteriores levantamentos”, explicou Belloche. No total, foram identificadas no espetro da região de Sgr B2 50 linhas de absorção individuais do isobutironitrilo e 120 do n-butironitrilo. As duas moléculas são as maiores alguma vez detetadas numa região de formação de estrelas.
A equipa construiu modelos computacionais para simularem a química da formação das moléculas detetadas em Sgr B2. Tal como outras moléculas orgânicas complexas, os dois isómeros parecem formar-se com eficiência na superfície de grãos de poeira interestelar. “No entanto”, afirmou Garrod, “os modelos indicam que para moléculas grandes o suficiente para produzirem estruturas ramificadas, estas poderão ser as formas [isoméricas] prevalentes. A deteção do membro seguinte da série alquilo nitrilo, o n-pentanonitrilo (n-C4H9CN), e dos seus três isómeros ramificados, irá permitir-nos testar esta ideia.”
“Os aminoácidos identificados em meteoritos têm uma composição que sugere uma origem no meio interestelar”, disse Belloche. “Apesar de até agora não ter sido encontrado nenhum aminoácido interestelar, a química interestelar poderá ser responsável pela produção de uma vasta gama de moléculas complexas importantes, que eventualmente viajam até às superfícies planetárias.”
“A deteção do isobutironitrilo mostra-nos que os aminoácidos poderão estar, de fato, presentes no meio interestelar, porque a estrutura ramificada é uma característica chave destas moléculas”, acrescentou o diretor do Instituto Max Planck para a Radioastronomia, Karl Menten. “Foram já identificados aminoácidos em meteoritos, e esperamos poder detetá-los no futuro no meio interestelar.”
Podem encontrar todos os pormenores deste trabalho aqui.
2 comentários
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Isto é fantástico. O glicoaldeido também foi detectado em Sagitário SgrB2 e isso mostra muito o potencial prebiótico deste moléculas. Ótima postagem.
Obs: Uma dica seria colocar o ano desta notícias, além da data e mês.
Oi,
O URL tem incorporada a data 😉
https://www.astropt.org/2014/10/01/descoberta-molecula-organica-complexa-no-espaco-interestelar/
1 de Outubro de 2014 😉
abraços!
[…] Molécula orgânica complexa no espaço interestelar […]