Os leitores deste blog e de outras publicações de divulgação científica são por vezes confrontados com a palavra “supernova”. Como se não bastasse a novidade do termo, acresce ainda frequentemente à confusão uma classificação, por exemplo, “supernova de tipo Ia” ou “supernova de tipo II”. Mas afinal, o que é isto de uma supernova e o seu tipo?
Em termos muito simples, “supernova” é o nome que se dá à explosão de uma estrela, um dos fenómenos mais energéticos conhecidos no Universo. De facto, uma supernova típica pode ser mais brilhante do que a sua galáxia hospedeira durante vários dias ou até semanas. Mais ainda, se toda a energia libertada fosse visível, a supernova seria brevemente mais brilhante do que o conjunto de todas as estrelas em todas as galáxias do Universo observável!
No início do século XX, com o desenvolvimento da astronomia extragaláctica, os astrónomos começaram a detectar estas explosões em galáxias longínquas. Era tudo muito bizarro — os astrónomos viam “estrelas novas” que apareciam aparentemente do nada nas suas galáxias hospedeiras, tornavam-se tão brilhantes como as ditas durante algumas semanas e depois diminuíam de brilho gradualmente até desaparecerem para lá do limite de detecção dos telescópios.
Na década de 30, os astrónomos do Caltech, Fritz Zwicky e Walter Baade, propuseram que estas “estrelas novas” não eram mais do que explosões de estrelas individuais residentes nessas galáxias e que o fenómeno marcava o fim violento da sua evolução. O termo “nova” já era utilizado pelos astrónomos para designar outro tipo de explosão que não envolve a destruição de uma estrela e é muito menos energético. Zwicky e Baade introduziram um novo termo, “supernova”, para descrever estas “estrelas novas” extragalácticas. Foi uma proposta ousada pois na altura havia muito poucas observações que consubstanciassem esta teoria. Pelos standards actuais, o artigo de Zwicky e Baade provavelmente não teria sido publicado.
Entretanto, a análise dos espectros de várias destas supernovas permitiu aos astrónomos distinguir 2 grupos com características diferentes. No primeiro grupo, que designaram por “tipo I”, o espectro na fase inicial da explosão era caracterizado pela ausência de hidrogénio e pela existência de uma intensa linha de absorção devida ao Silício. Por seu lado, no segundo grupo, designado por “tipo II”, o espectro mostrava linhas intensas devidas ao hidrogénio.
O desenvolvimento posterior da teoria da evolução estelar, em especial nos anos 60 e 70, permitiu explicar em boa parte a diferença entre os dois grupos. Segundo a teoria, as supernovas de tipo I não podem resultar da explosão de uma estrela normal. O tipo e abundâncias dos elementos que aparecem nos seus espectros e a suas luminosidades e curvas de luz quase idênticas, apontam para uma classe de estrelas progenitoras muito particular e homogénea— as anãs brancas. Neste caso, a explosão resulta da ignição da fusão explosiva do carbono, um dos elementos mais abundantes no interior das anãs brancas mas inerte em condições normais.
Uma supernova de tipo I resulta da explosão termonuclear de uma anã branca devido à ignição da fusão explosiva do carbono no seu interior.
Por outro lado, as supernovas de tipo II exibem maior variação, consistente com a sua origem num grupo de estrelas com características variadas. Estas explosões são explicadas pela teoria como o resultado do colapso gravitacional de núcleos de estrelas maciças. O fenómeno ocorre quando a estrela, ao fim de milhões de anos, desenvolve um núcleo de Ferro e Níquel, incapaz de gerar energia por reacções de fusão. Sem essa energia, o núcleo perde a sustentação numa fracção de segundo e colapsa sob o seu próprio peso. A onda de choque que resulta deste colapso destrói o resto da estrela.
Uma supernova de tipo II resulta do colapso gravitacional do núcleo de Ferro e Níquel de uma estrela maciça.
Este era o estado da arte até finais dos anos 70. O advento de novas tecnologias, como as câmaras CCD, tornou mais eficiente a descoberta e estudo posterior de supernovas extragalácticas.
Nos anos 80 foram identificados mais dois tipos de supernova sem linhas de hidrogénio, e portanto de tipo I. No entanto, tirando este facto, nada nestas supernovas batia certo com a possibilidade de serem o resultado de explosões termonucleares de anãs brancas. Pelo contrário, demonstrou-se que eram supernovas resultantes do colapso do núcleo de estrelas maciças, como as de tipo II (grande confusão, não?). A ausência de hidrogénio nestas supernovas deve-se ao facto de as estrelas, nos milhares de anos que antecedem a explosão, dispersarem para o espaço as suas camadas exteriores ricas em hidrogénio (tornando visível o hélio subjacente — tipo Ib) e em alguns casos limite, a camada de Hélio também (tornando visível o Carbono e Oxigénio subjacentes — tipo Ic).
Uma supernova de tipo Ib ou Ic resulta do colapso gravitacional do núcleo de Ferro e Níquel de uma estrela muito maciça que dispersou para o espaço a sua camada rica em hidrogénio (Ib) ou as camadas ricas em hidrogénio e hélio (Ic).
As estrelas podem perder este material através de poderosos ventos estelares devidos à intensa radiação da estrela ou por este ser roubado por uma estrela companheira numa órbita próxima.
Para distinguir as supernovas de tipo I tradicionais, destes novos tipos, elas foram redesignadas de tipo Ia.
Nas últimas décadas, com a ajuda preciosa dos dados recolhidos sobre milhares de supernovas, em vários comprimentos de onda e ao longo de intervalos de tempo impensáveis há meio século, foi possível refinar ainda mais esta classificação. Por exemplo, dentro do tipo II reconhecem-se hoje subtipos como IIb, II-P, II-L e IIn. As diferenças entre os subtipos são por vezes subtis e refletem o tipo de estrela que explode, a sua estrutura interna e a sua interacção com o gás e poeira do meio interestelar. Sabe-se, por exemplo, que as supernovas de tipo II-P têm origem nas supergigantes vermelhas menos maciças; as de tipo IIn têm origem em supergigantes muito luminosas, instáveis, rodeadas de um casulo de material que elas próprias atiraram para o espaço. A figura que se segue, extraída de um estudo monumental publicado em 2010, mostra as frequências relativas dos diferentes tipos e subtipos de supernova.
Apesar desta variedade, os mecanismos subjacentes a todas estas supernovas são apenas dois:
- a “explosão termonuclear de uma anã branca” — dando origem a uma supernova de tipo Ia (ou variantes);
- o “colapso gravitacional do núcleo de uma estrela maciça” — dando origem a uma supernova de tipo II, Ib ou Ic (ou variantes).
Na realidade, isto poderá não ser completamente verdade. Existe, pelo menos em teoria, um terceiro mecanismo capaz de fazer explodir uma estrela. Chama-se “instabilidade provocada pela produção de pares electrão/positrão” e é possível que seja responsável pela explosão de estrelas com massas extremamente elevadas. Nos últimos anos alguns astrónomos reivindicaram a descoberta das primeiras supernovas deste tipo, mas o problema continua em aberto…
(Fontes: Li et. al.)
2 comentários
E o Buraco negro poderia explodir ?
WOW!
Excelente artigo!