Calisto era uma princesa de rara beleza, filha de Licaonte, rei da Arcádia, uma região da Grécia antiga. Muito jovem ainda, fez o voto de virgindade e foi viver nos bosques com a deusa Ártemis e as suas ninfas.
Ártemis era uma das deusas mais veneradas pelos gregos, sendo muitas as competências que lhe eram atribuídas. A sua ajuda era requisitada em assuntos relativos à caça, aos animais selvagens, à natureza, ao parto, à virgindade e à protecção das jovens mulheres.
A beleza de Calisto despertou a atenção de Zeus, deus do firmamento, dos trovões e relâmpagos, da lei, ordem e justiça. Zeus era o maior de todos os deuses do Olimpo, conhecido pelas suas aventuras extra-conjugais que deram origem a alguns dos mais conhecidos episódios da mitologia grega. Entre os filhos nascidos destas ligações contam-se a bela Helena de Tróia, e heróis como Perseu, Héracles, Minos e Pólux.
Determinado a possuir Calisto, certo dia Zeus disfarçou-se da própria deusa Ártemis, para conseguir aproximar-se da princesa e simultaneamente escapar aos olhos sempre atentos de sua esposa Hera. Calisto, enganada, deixou-se isolar das restantes ninfas. Nessa altura, Zeus mostrou a sua verdadeira face e possuiu-a.
Calisto ocultou este episódio, e o facto de estar grávida, de Ártemis e das restantes ninfas. Os meses passaram até que um dia, no banho, a deusa se apercebeu do seu estado e a expulsou da sua companhia. A partir de então, Calisto vagueou pelos bosques alimentando-se do pouco que conseguia obter de arbustos e árvores. Pouco tempo depois, deu à luz um filho a quem deu o nome de Arcas.
Estes eventos não passaram despercebidos a Hera, irmã e esposa Zeus, e deusa das mulheres e do casamento. Hera passou um mau bocado tentando controlar as infidelidades do seu marido, por vezes exercendo vinganças terríveis sobre as suas amantes.
Quando Calisto deu à luz, Hera aproveitou o momento para exercer a sua vingança, transformando a princesa numa ursa, condenada a cruzar os bosques durante anos, e não permitindo que visse o seu filho crescer.
Anos depois, Arcas, já um homem feito, caçava na floresta com os seus cães. De repente, deparou-se com uma ursa que o fitava com estranheza. A ursa, Calisto, depois de anos de separação, reconheceu em Arcas o seu filho e instintivamente lançou-se na sua direcção, querendo abraça-lo. Arcas, naturalmente, não teve a mesma percepção do momento e preparava-se para abater o animal quando foi impedido in extremis, por Zeus, que observava a cena à distância.
Revelada a verdadeira natureza da ursa, Zeus coloca ambos no firmamento, formando Calisto a constelação da Ursa Maior, Arcas a do Boieiro e os dois cães — Astério e Chara — a dos Cães de Caça. Hera ficou furiosa com esta atitude do marido, mas desta vez nada pode fazer. De facto, o nome Arcturus, a estrela mais brilhante da constelação do Boieiro, tem origem no grego arktouros, literalmente “guardião da ursa”, de arktos “urso” e ouros “guardião”. Da próxima vez que observarem a Ursa Maior e Arcturus, imaginem Calisto, sob a forma de uma ursa, movendo-se lentamente através do firmamento, acompanhada fielmente pelo filho Arcas e pelos seus cães.
Finalmente, uma questão interessante, ainda relativa a este episódio, diz respeito à origem da constelação da Ursa Menor. O estudo das diferentes fontes de mitologia grega sugere que a constelação é uma aquisição recente, que não está necessariamente relacionada com o mito de Zeus e Calisto. De facto, na grécia antiga, as estrelas da constelação parecem ter representado um cão. O nome da estrela polar, por exemplo, era cynosura, literalmente “cauda de cão”.
1 comentário
Muito bom, amei!