Agora já sabemos qual é a percentagem que o International Business Times precisa para anunciar que um asteroide nos pode atingir a tola: 0,00055 por cento.
E pensávamos nós que Neil Armstrong tinha dado um grande passo quando esteve na Lua. O saltinho em câmara lenta do astronauta não é nada comparado com o pulo que o título daquela publicação conseguiu dar. Um asteroide com 99,99945% de possibilidades de não atingir a Terra em 2017 passa a ser o asteroide que pode colidir com a Terra em 2017.
É o jornalismo Euromilhões no seu melhor. Durante todo o ano, semana após semana, os jornais desafiam-nos a saber se seremos nós os «próximos excêntricos». Neste caso a notícia joga com o sentimento de esperança. Da mesma forma, somos ocasionalmente lembrados pelos jornais de que um asteroide errante nos céus poderá atingir-nos a tola e transformar-nos, talvez, noutro tipo de excêntrico. Aqui joga-se com o sentimento de medo.
Não é preciso chamar o Bruce Willis, estejam descansados
Esperança ou medo, não passa realmente de um jogo fácil de reconhecer, embora seja papagueado até à exaustão por bloggers que comercializam também doses pouco homeopáticas de alarmismo. Claro que o asteroide em questão – o 2012 TC4 – já passou relativamente perto da Terra, em outubro de 2012, sem que nenhuma tola tivesse sido atingida.
O asteroide tem entre 12 e 40 metros de diâmetro – ainda não se sabe ao certo – e passou muito perto (à escala cósmica), a cerca de 95 mil quilómetros, um quarto da distância da Lua. Passará novamente a 12 de outubro de 2017, mas a percentagem de 0,00055% que tanto espevitou o frenesim cataclísmico do título resulta precisamente do facto de estar a ser muito bem monitorizado: à medida que o tempo passar, conheceremos ainda mais as suas características e a sua órbita.
Um asteroide com esse tamanho só pode causar danos locais – não afetaria o planeta como um todo. Lembrem-se, o meteoro que provocou os estragos em Chelyabinsk, na Rússia, em fevereiro de 2003, tinha cerca de 20 metros de diâmetro.
Dado o seu pequeno diâmetro e a qualidade da monitorização, caso fosse necessário – e há 99,99945% de possibilidades de que nunca o seja, lembrem-se –, seria relativamente fácil desviá-lo da Terra ou eliminá-lo por completo sem precisarmos de chamar a equipa do Bruce Willis. O AstroPT até já mencionou as diferentes formas de o conseguir.
Ter medo de que este asteroide atinja a Terra e estar preocupado por nunca vir a ganhar o Euromilhões tem a mesma relevância estatística.
Nada disto impede o jornalismo Euromilhões de exercer o seu fascínio: o International Business Times desencantou uma ilustração de um asteroide de pelo menos 90 quilómetros de diâmetro a 170 anos-luz do nosso sistema solar – o asteroide em órbita da anã branca GD 61, noticiado em outubro de 2013 por ter uma composição rica em água –, usou-a para acompanhar a notícia e ainda juntou a seguinte legenda: «Se realmente atingisse a Terra, teria consequências devastadoras».
Ena, quase tão picante como o rabo da Kardashian.
Não, um asteroide de até 40 metros de diâmetro não teria consequências devastadoras – a não ser, por justiça cósmica, que atingisse em cheio a tola do editor que escolheu essa imagem e inventou uma falsa legenda alarmista.
2 comentários
Já o “1950 DA” teria 0,3% de chances de chocar com a Terra em 2880.
Quando será que poderíamos ter certeza sobre esse caso.
Ou seja 100% de chances da colisão ou 100% de chances de não colidir.
Talvez no dia que fosse 50% de chances de haver uma colisão, teríamos que agendar na ONU (ou seu órgão substituto) uma reunião para tomarmos as devidas providências.
E quais seriam?
Ou nesta data (onde chegaríamos a conclusão dos 50%) teríamos tempo para agirmos?
http://www.astropt.org/2011/11/11/formas-de-desviar-asteroides/
abraços!