Uma equipa de astrónomos utilizou imagens obtidas pelo Telescópio Espacial Hubble, ao longo de 20 anos, para observar pela primeira vez a colisão entre bolhas de plasma num jacto com origem nas imediações de um buraco negro super-maciço. A análise das observações sugere que, durante a colisão, a energia cinética das partículas no plasma é dissipada sob a forma de radiação, aumentando a luminosidade dessa região do jacto e acelerando ainda mais as partículas aí existentes.
As galáxias activas têm no seu centro um buraco negro super-maciço rodeado por um disco de gás rotativo que o alimenta — um objecto a que se dá o nome de quasar. O gás orbita o buraco negro a alta velocidade e a fricção e o intenso campo electromagnético aquecem-no a temperaturas muito elevadas, transformando-o num plasma emissor de radiação muito energética como raios gama, raios-X e raios ultravioleta. Os núcleos de galáxias activas são por isso extremamente luminosos (veja-se o brilho do núcleo da NGC 3862 na imagem anterior).
Parte do plasma super-aquecido na região interna do disco é ejectado ao longo do eixo de rotação do buraco negro. O campo magnético poderoso do disco força esse material a mover-se ao longo de um jacto fino que se mantém colimado até distâncias de dezenas ou mesmo centenas de milhares de anos-luz do buraco negro, em pleno espaço intergaláctico. Nestes jactos, as partículas viajam a velocidades relativísticas, i.e., quase à velocidade da luz, tendo por isso uma energia cinética enorme. Em determinadas circunstâncias, se o fluxo de material que cai no buraco negro não é regular, em vez de um fluxo contínuo de plasma ao longo do jacto observamos grandes bolhas de plasma ocasionais, como nós numa corda.
A galáxia activa estudada pela equipa liderada por Eileen Meyer, do Space Telescope Science Institute, foi a NGC3862, uma galáxia elíptica gigante situada no enxame Abell 1367, a 260 milhões de anos-luz, na direcção da constelação do Leão, um pouco acima da estrela Denebola. O jacto foi descoberto pelo Hubble em 1992 e foi mantido debaixo de olho pelos astrónomos desde então. Estes jactos são frequentemente detectados em galáxias activas quando observadas em raios-X ou em ondas de rádio. No entanto, por razões que os astrónomos ainda desconhecem, só uma pequeníssima fracção tem jactos observáveis na região do espectro visível.
Meyer e os co-autores tiraram partido do poder de resolução e condições ideais de observação de Telescópio Espacial Hubble para obter uma imagem de alta qualidade da galáxia em 2014. Esta imagem, conjugada com imagens de arquivo do Hubble, obtidas desde 1994, permitiram aos astrónomos observar pela primeira vez a colisão entre uma bolha de material mais antiga (e portanto posicionada mais à frente no jacto — a bolha “azul” na primeira imagem) e uma bolha de material mais recente (que seguia logo atrás e a maior velocidade — a bolha “verde”). As bolhas que seguem à frente chocam com material previamente ejectado ao longo do jacto e com gás intergaláctico, desacelerando e funcionando como uma espécie de vassoura, limpando de material o espaço que as precede. As bolhas que se seguem beneficiam da remoção desse material do jacto permitindo que mantenham a velocidade ao longo de distâncias maiores. Eventualmente, no entanto, devido às diferenças de velocidade, as bolhas acabam por colidir — o evento observado pela equipa.
[A colisão de bolhas de plasma no jacto do buraco negro super-maciço da galáxia NGC 3862.]
A colisão das bolhas de plasma “verde” e “azul” no jacto do buraco negro iniciou a sua fusão e levou a um aumento significativo da sua luminosidade. É previsível que a bolha resultante continue a aumentar de brilho durante as próximas décadas à medida que a colisão progride. Meyer descreve com entusiasmo a importância destas observações, reportadas num artigo no número da revista Nature de 28 de Maio:
Algo assim nunca foi visto antes num jacto extragaláctico. Temos uma oportunidade rara de observar como a energia cinética da colisão é dissipada sob a forma de radiação.
Este trabalho, e as suas sequelas, permitirá aos astrónomos calcular quanta energia é transferida do quasar central para as regiões periféricas da galáxia e para o espaço intergaláctico envolvente, algo essencial para a nossa compreensão da evolução das galáxias.
(Fonte: Space Telescope Science Institute, Nature)
Últimos comentários