Ecos de Raios-X Permitem Determinar Distância a Sistema Binário Ultra-Luminoso

Circinus X-1 é uma das fontes de raios X mais intensas do céu. Descoberta nos anos 70 por detectores de raios-X transportados para o espaço em pequenos foguetões, depressa se tornou objecto de intenso estudo devido à sua elevada luminosidade e grande variabilidade. Ao fim de poucos anos, foi possível determinar com precisão a posição da fonte de raios-X e identificar o objecto correspondente no visível a partir de observatórios na Terra. Os astrónomos verificaram que se tratava de um sistema binário com uma periodicidade de 16.6 dias situado a uma distância muito incerta, com estimativas entre os 13 mil e os 41 mil anos-luz. As observações em raios-X permitiram concluir que uma das componentes é uma estrela de neutrões que rouba matéria à sua estrela companheira, uma supergigante muito luminosa. Essa matéria orbita a estrela de neutrões num disco de acreção antes de colidir com ela a grande velocidade. Por vezes, a acumulação de matéria, hidrogénio e hélio principalmente, na superfície da estrela de neutrões provoca explosões nucleares visíveis como erupções intensas de raios-X.

Em 2013, uma equipa de astrónomos liderada por Sebastien Heinz, da Universidade de Wisconsin, Madison, descobriu que Circinus X-1 se encontra no centro de um remanescente de supernova visível em ondas de rádio. Circinus X-1 teria sido um sistema binário maciço em que uma das estrelas explodiu numa supernova dando origem à estrela de neutrões e sistema binário hoje observados e ao remanescente que envolve o sistema.

O remanescente de supernova que rodeia a sistema binário Circinus X-1, observado em ondas de rádio. São visíveis também dois jacto de emitidos pela estrela de neutrões. Crédito: University of Wisconsin-Madison/S. Heinz et al..

O remanescente de supernova que rodeia a sistema binário Circinus X-1, observado em ondas de rádio. São visíveis também dois jacto de emitidos pela estrela de neutrões. Crédito: University of Wisconsin-Madison/S. Heinz et al..

O mesmo Sebastien Heinz liderou agora uma equipa que descobriu um conjunto de 4 anéis concêntricos em torno de Circinus X-1, em observações realizadas com o telescópio de raios-X Chandra. Trata-se de ecos de luz, semelhantes aos ecos sonoros que ouvimos no quotidiano. Os ecos sonoros são provocados pela reflexão de ondas sonoras em obstáculos físicos como paredes. Os ecos de luz observados pelo Chandra, por seu lado, são produzidos quando os raios-X emitidos durante uma erupção do Circinus X-1 são deflectidos por nuvens de poeira entre o sistema e a Terra.

Os ecos de raios-X (anéis concêntricos) do sistema binário Circinus X-1 (o ponto branco intenso no centro dos anéis). A imagem do Chandra tem cores vermelho, verde e azul para representar raios-X de energia crescente. A foto de fundo é mesma região do céu no visível numa imagem do Digitized Sky Survey. Crédito: NASA/CXC/University of Wisconsin-Madison/S.Heinz et al.; Optical: DSS.

Os ecos de raios-X (anéis concêntricos) do sistema binário Circinus X-1 (o ponto branco intenso no centro dos anéis). A imagem do Chandra tem cores vermelho, verde e azul para representar raios-X de energia crescente. A foto de fundo é mesma região do céu no visível numa imagem do Digitized Sky Survey. Crédito: NASA/CXC/University of Wisconsin-Madison/S.Heinz et al.; Optical: DSS.

A descoberta destes ecos é de enorme importância para os astrónomos pois fornece um método directo, com base em argumentos geométricos básicos, e preciso para determinar a distância ao Circinus X-1. Para fazê-lo, os astrónomos necessitaram de fazer 3 medições críticas: (1) determinar o tamanho angular dos anéis; (2) determinar o atraso na chegada dos raios-X do eco e da erupção que originou o eco (durante uma erupção, parte dos raios-X são emitidos ao longo da linha de visão com a Terra e chegam cá primeiro; parte dos raios-X seguem numa direcção ligeiramente fora da nossa linha de visão e são deflectidos em direcção à Terra, demorando mais tempo a chegar); (3) determinar a distância às nuvens de poeira responsáveis pela deflexão dos raios-X.

As duas primeiras medições foram feitas com base nas observações do Circinus X-1 pelo Chandra e outros observatórios de raios-X. O sistema tem sido estudado com detalhe nas últimas décadas, havendo portanto um grande arquivo de observações. Para a terceira medição, os astrónomos utilizaram um radiotelescópio na Austrália para determinar as distâncias às nuvens de poeira responsáveis pela reflexão dos raios-X. Combinando esta informação, a equipa pode determinar a distância ao Circinus X-1 em pouco menos de 31 mil anos-luz, com um erro de 10%.

Esta gráfico explica a formação dos anéis concêntricos em torno de Circinus X-1. Cada anel é formado quando raios X emitidos durante uma erupção (curva de luz azul) são deflectidos por nuvens de poeira situadas entre nós e o sistema. Se a nuvem está mais próxima de nós, o anel correspondente tem um diâmetro angular maior, e vice-versa. Crédito: University of Wisconsin-Madison/S.Heinz et al..

Esta gráfico explica a formação dos anéis concêntricos em torno de Circinus X-1. Cada anel é formado quando raios X emitidos durante uma erupção (curva de luz azul) são deflectidos por nuvens de poeira situadas entre nós e o sistema. Se a nuvem está mais próxima de nós, o anel correspondente tem um diâmetro angular maior, e vice-versa. Crédito: University of Wisconsin-Madison/S.Heinz et al..

Esta distância enorme implica que a luminosidade do Circinus X-1 é muito superior ao que se pensava. Na realidade, durante as frequentes erupções, o sistema parece uma luminosidade muito próxima do Limite de Eddington — o limite teórico para a luminosidade de um sistema a partir do qual a pressão da radiação emitida supera a força da gravidade. De facto, por vezes a radiação emitida pela estrela de neutrões e disco de acreção é tão copiosa que empurra a torrente de gás proveniente da estrela companheira que alimenta o próprio disco de acreção! Os astrónomos pensam que isso pode explicar variações erráticas características da Circinus X-1. Os jactos emitidos pela estrela de neutrões deverão ter também energias notáveis uma vez que, com a luminosidade implicada pela nova determinação da distância, as partículas nesses feixes têm de mover-se a cerca de 99.9% da velocidade da luz, algo só visto até à data em sistemas binários mais energéticos que contém buracos negros.

(Fonte: Chandra/NASA, Chandra blog)

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