A única forma de calcular directamente a massa de uma estrela envolve a aplicação da terceira lei de Kepler, depois de observada a sua órbita num sistema binário. Infelizmente, a técnica só é aplicável a estrelas que façam parte de tais sistemas e assim mesmo não é fácil de pôr em prática. Agora, cientistas da Universidade Southampton, no Reino Unido, descobriram uma outra forma de calcular a massa de um tipo particular de estrela — estrelas de neutrões — sem recorrer à gravitação. A descoberta é um avanço importante no estudo destes objectos, pois a maioria não fazem parte de sistemas binários.
As estrelas de neutrões formam-se durante o colapso do núcleo de estrelas maciças, nos primeiros instantes de uma supernova. Como o próprio nome indica, são formadas principalmente por neutrões, mas junto à superfície existem também partículas carregadas electricamente como protões, electrões e iões atómicos. Um exemplar típico tem 1.4 massas solares, compactadas numa esfera de 20 km de diâmetro, resultando numa densidade enorme — 1 cm^3 de material pesa tanto como toda a humanidade! Quando se formam, a sua velocidade de rotação é enorme, na ordem das 300 rotações por segundo, gerando um campo magnético 1 bilião (1 seguido de 12 zeros) de vezes mais intenso do que o da Terra.
As estrelas de neutrões têm regiões na sua vizinhança ou mesmo na superfície, provavelmente junto aos pólos magnéticos, que são focos intensos de radiação emitida em vários comprimentos de onda do espectro electromagnético. Em algumas delas, durante a rotação, esta região emissora fica ocasionalmente alinhada com a nossa linha de visão, dando origem a pulsos periódicos de radiação. Por essa razão, estas estrelas de neutrões são designadas mais especificamente por pulsares. A periodicidade destes pulsos é incrivelmente precisa, rivalizando mesmo com os melhores relógios atómicos.
Todos os pulsares perdem energia rotacional. Com o tempo vão rodando mais lentamente, um efeito subtil mas perfeitamente detectável. Para além deste abrandamento gradual, previsível, muitos pulsares têm “soluços”. Ocasionalmente, a sua velocidade de rotação aumenta, ocasionando uma diminuição no seu período de rotação por uma minúscula fracção de um segundo. Estes soluços recebem o termo técnico de glitch.
Os cientistas pensam saber o que se passa com estes pulsares. Os modelos mais aceites sugerem que estes têm uma crosta relativamente fina composta por um reticulado de núcleos de ferro por entre os quais fluem electrões e outras partículas elementares. Mais para o interior, são formados por uma “sopa” super-fluida composta principalmente por neutrões. Os cientistas pensam que este material super-fluido tem uma velocidade de rotação muito superior à da crosta — a única que conseguimos observar — , estando por isso normalmente desacoplado da mesma. Durante um glitch algum processo permite transferir alguma da energia rotacional do interior para a crosta, forçando-a a rodar mais rapidamente.
Nils Andersson, um dos proponentes do método, explica desta forma o fenómeno:
Imagine que o pulsar é uma tigela de sopa, e que a tijela roda a uma velocidade e a sopa, no interior, roda mais rapidamente. A fricção entre a tijela e o seu conteúdo, a sopa, faria a tijela rodar mais depressa.
e termina com esta observação crucial:
Quanto mais sopa tiver a tijela, maior será a velocidade a que a tijela será forçada a rodar.
Dito de outra forma, a magnitude do glitch de um pulsar depende da quantidade de material super-fluido no seu interior (e que corresponde à maior parte da sua massa) e das propriedades do material (na compreensão das quais os cientistas têm vindo a fazer progressos consideráveis). O modelo agora proposto permite aos cientistas, em termos muito simplistas, observar um glitch, medir o seu efeito no período de rotação e calcular a massa que o pulsar deve ter para produzir um efeito dessa magnitude.
O artigo correspondente foi publicado no número de 2 de Outubro de 2015 da revista Science Advances.
(Fonte: University of Southampton)
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