Nas últimas décadas, os astrónomos descobriram que no centro da maior parte das galáxias existem enormes buracos negros, com milhões de vezes a massa do Sol. A origem destes buracos negros é ainda um problema em aberto, mas sabe-se que têm um impacto importante na evolução das galáxias hospedeiras. Algumas galáxias, normalmente elípticas super-gigantes, localizadas no centro de grandes e densos enxames, têm buracos negros super-maciços, mesmo pelos standards galácticos, atingindo massas de vários milhares de milhões de sóis.
O cenário mais aceite, e corroborado até à data pelas observações, sugere que estes buracos negros extremos se formam ao longo de muitos milhões de anos através de colisões sucessivas entre galáxias nestes enxames. O resultado final é, invariavelmente, a formação de uma galáxia elíptica gigante cujo buraco negro central se funde com parte dos buracos negros centrais das galáxias entretanto por ela canibalizadas. Durante estes eventos, fica também disponível para consumo uma enorme quantidade de gás, originalmente contida nas galáxias envolvidas, que é “devorada” pelo buraco negro central, acrescentando ainda mais à sua massa.
Um exemplo bem conhecido deste tipo extremo de buraco negro galáctico é o de Messier 87, a maior galáxia elíptica do Enxame de Virgem, com uma massa estimada de 4–7 mil milhões de sóis. A galáxia tem a forma de um enorme elipsóide com um eixo maior de 1 milhão de anos-luz, 5 vezes o tamanho da Via Láctea!
Ora, num artigo intitulado “A 17-billion-solar-mass black hole in a group galaxy with a diffuse core”, publicado ontem na revista Nature, uma equipa de astrónomos descreve como utilizou o telescópio Hubble e o telescópio Gemini, no Hawaii, para identificar na galáxia elíptica NGC1600, na constelação do Erídano, um buraco negro central com 17 mil milhões de massas solares. Esta estimativa é possível porque é conhecida uma correlação entre a massa do buraco negro central de uma galáxia e a dispersão das velocidades das estrelas que se encontram nas suas imediações. Os astrónomos conseguiram medir a dita dispersão observando o efeito de Doppler devido ao movimento das estrelas em torno do núcleo, em espectros obtidos em diferentes pontos da galáxia.
E então? Nada de novo. — diz o leitor. O problema é que NGC1600 não se encontra num enxame de galáxias, é apenas a galáxia dominante num pequeno grupo de 20 e poucos elementos, situado a cerca de 220 milhões de anos-luz. O cenário descrito anteriormente para a formação destes objectos superlativos não parece minimamente aplicável a este caso e levanta a possibilidade de poder haver muitos mais destes objectos no centro de galáxias insuspeitas por não se encontrarem no centro de enxames. Estes pequenos grupos de galáxias são 50 vezes mais abundantes do que os enxames pelo que o buraco negro de NGC1600 poderá ser apenas o primeiro de uma população muito mais abundante do que se pensava.
Mas as surpresas não param por aqui. Uma outra correlação conhecida dos astrónomos relaciona a massa do buraco negro central com a massa total da região central da galáxia, uma componente semi-esférica a que se dá o nome de “bojo”. Os astrónomos utilizaram essa relação para deduzir, estupefactos, que a galáxia era cerca de 10 vezes menos maciça do que deveria ser para ter um objecto central tão maciço. A correlação não funcionava na NGC1600!
Usando imagens de arquivo obtidas pelo instrumento NICMOS (Near Infrared Camera and Multi-Object Spectrometer) do Hubble, a equipa verificou que havia algo de estranho com a região central da galáxia; parecia muito menos luminosa e densa do que é habitual em galáxias elípticas que alojam buracos negros gigantes no centro. Observações com o telescópio Gemini permitiram determinar que as estrelas a cerca de 3 mil anos-luz do núcleo orbitavam com velocidades muito superiores às esperadas, como se no passado o núcleo da galáxia tivesse muito mais estrelas. A massa em falta seria de 40 mil milhões de sóis, equivalente a todo o material no disco da Via Láctea! Para explicar a peculiaridade da NGC1600, a equipa sugere que, numa colisão passada, a fusão do seu buraco negro central e o da galáxia canibalizada terá desestabilizado as órbitas das estrelas no núcleo da primeira e projectado para o espaço inter-galáctico os milhares de milhões de estrelas desaparecidos.
(Fonte: NASA/ESA)
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