Esta cena idílica pintada pelo artista holandês Lambert Doomer e intitulada Staartster Boven Alkmaar, mostra a população de Alkmaar a contemplar o Grande Cometa de 1680. A informação associada à pintura no website do Rijks Museum indica que o evento retratado ocorreu em Janeiro de 1681. No entanto, com base na posição do crescente lunar relativamente ao cometa e na semelhança com outras representações contemporâneas da cena, é provável que ela se refira a acontecimentos ocorridos algumas semanas antes, por volta do dia 20 de Dezembro, altura em que o cometa apareceu durante o crepúsculo depois do periélio.

Staartster Boven Alkmaar, de Lambert Doomer.
Pintura pertencente à colecção do Rijks Museum, Amesterdão, Holanda.
O Grande Cometa de 1680 foi descoberto na madrugada de 14 Novembro de 1680, em Coburg, pelo astrónomo alemão Gottfried Kirch, enquanto observava Marte e a Lua com um telescópio. De facto, o C/1680 V1, como é conhecido na nomenclatura actual, foi o primeiro cometa a ser descoberto com um telescópio, um marco importante na história da astronomia. Foi também o primeiro cometa a ter a sua órbita determinada. O feito deve-se a Sir Isaac Newton, instigado pelo então astrónomo real John Flamsteed. Newton desenvolveu um método para o cálculo das órbitas dos cometas com base nas suas posições medidas no firmamento e exemplificou a sua utilização com a determinação da órbita para o C/1680 V1. Este método viria a ter uma importância fundamental no estudo dos cometas, tendo sido utilizado com sucesso por um outro astrónomo inglês da época, Edmond Halley, na descoberta de que alguns cometas são periódicos.

A órbita do Grande Cometa de 1680 desenhada no Philosophiae Naturalis Principia Mathematica, o livro em que Newton propôs a sua Teoria da Gravidade e em que demonstrou matematicamente as três leis que Johannes Kepler havia estabelecido empiricamente para o movimento dos corpos no Sistema Solar.
Fonte: Wikipedia.
O cometa aumentou de brilho muito rapidamente após a descoberta. No dia 20 de Novembro foi visto nas ilhas Filipinas a olho nu. Um dia depois, na China e em Inglaterra foi visto com uma cauda 3 vezes maior do que a Lua (1.5 graus). No dia 27 de Novembro, foi observado em Roma com uma cauda de 15 graus. Três dias depois passou a apenas 63 milhões de km da Terra. A partir do dia 7 de Dezembro deixou de ser visto por se encontrar muito próximo do Sol e para Sul. O periélio ocorreu no dia 18 desse mês, altura em que o cometa passou a uma distância de apenas 930 mil km do centro do Sol, ou seja, cerca de 400 mil km acima da sua superfície!
Após este mergulho vertiginoso, o cometa reapareceu no crepúsculo, no horizonte oeste, a partir do dia 19 de Dezembro, com uma cauda dourada espectacular que atingiu no seu auge cerca de 70 graus de comprimento alargando-se suavemente como um leque até 3 graus de largura na extremidade. A partir do início de Janeiro, a cabeleira do cometa, a nuvem de gás e poeiras que envolve o núcleo, começou a diminuir de brilho rapidamente mas a cauda longa e brilhante mostrou-se mais resiliente. A 5 de Janeiro, por exemplo, a cabeça tinha magnitude 3 (o brilho de uma estrela relativamente débil mas facilmente visível a olho nu) mas a cauda era brilhante e estendia-se ainda por 55 graus. As observações de Flamsteed mostram que em Fevereiro a cabeça do cometa deixou de ser visível a olho nu mas a cauda continuava a ser visível. A última observação conhecida do cometa foi registada em 19 de Março de 1681.

“A aparição do [grande] cometa de 1680 foi espectacular. O artista Lieven Verschuier pintou esta aguarela que mostra como a população de Roterdão veio para as ruas para contemplar o fenómeno celeste, com ansiedade mas também com admiração”.
Fonte: Eric Jorink, “Het Boeck der Natuere”. Dutch scholars and the wonders of God’s creation from 1575 to 1715. Primavera Pers, Leiden 2006.
“A 19 de Dezembro de 1680, apareceu um cometa extraordinário que causou grande consternação na província, um anúncio de eventos trágicos e punições divinas. É descrito, numa carta datada de 1 de Janeiro de 1681, como “apareceu no sudoeste no dia 19 de Dezembro passado [5ª feira], eram cerca de 2 horas da tarde, num dia de céu limpo, um pouco acima do Sol […]. Foi depois visto no Domingo, durante o crepúsculo, com uma cauda muito intensa, no horizonte oeste, para grande espanto da população. Desde então é visível todas as noites com céu limpo. Sem dúvida, Deus ameaça-nos com terríveis punições se não nos arrependermos” — a carta sugeria como apropriada a proclamação de um dia de humilhação e de oração.”
Os cometas que se aproximam tanto do Sol no periélio têm a designação específica de sun-grazers (literalmente “que arranham o Sol”) e são de grande interesse para os astrónomos nomeadamente pelo facto da sua superfície ser submetida a temperaturas extremas, volatilizando mesmo os materiais mais refractários na sua composição como os metais, metais alcalinos e silicatos. A análise do espectro dos cometas nestas condições permite saber muito mais sobre a sua composição química pois estes materiais volatilizados e a altas temperaturas emitem luz em comprimentos de onda específicos. Em cometas que se mantêm muito afastados do Sol no periélio, estes materiais permanecem inertes tornando impossível a sua identificação.
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Com esta maravilha desejo-te Boas Festas, a ti e a todos no Astropt.Org,
Todos inclui os cometas e os Leitores