Newton inventou o sextante, mas não publicou a sua descoberta, e só mais tarde foi possível, com os cronómetros (todos os relógios são cronómetros) de Harrison, que os construiu pela primeira vez pequenos como relógios de bolso, calcular a posição dum navio nos oceanos.
Quando o navio inglês viu surgir pela manhã a ilha de Porto Santo no arquipélago da Madeira, a previsão de Harrison confirmou-se e finalmente calculava-se com muito razoável exactidão a longitude, o segundo vector imaginário que sobreposto à latitude informava os oficiais de bordo da posição dum navio na imensidão oceânica. A latitude já era calculada com precisão pelo menos “desde 1481 pelos mareantes lusitanos,” para citar o Almirante Gago Coutinho:
“Desde 1481 que os mareantes lusitanos estavam habilitados a determinar as latitudes em ambos os hemisférios, boreal e austral, mercê da profícua aplicação das tábuas de declinação solar.”
Harrison alcançou um feito tecnológico extraordinário para 1761, quando o famoso exemplar H-4 se fez ao mar, com um mecanismo de escape livre dos efeitos de torque, outro para equilíbrio da temperatura, diamantes exóticamente lapidados e rodas dentadas interiores dum nível de qualidade de construção considerada sofisticada mesmo à luz das tecnologias de hoje. Esta maravilha levou 6 anos a construir, era um conceito (um pequeno relógio de bolso) perfeitamente inovador em toda a História.
Também foi um conceito que velejou nos ventos da História, pois beneficiou da metalurgia muito mais sofisticada resultante da maturidade da primeira revolução industrial.
Já o Almirante Gago Coutinho, no século 20, adoptou uma inovação ao sextante – o horizonte artificial – que permitia que este aparelho prescindisse do horizonte natural dos navios e ser eficaz para a aeronáutica. O sextante tem capacidade de calcular tanto a latitude como a longitude. Esta explicação está deveras simplificada, o valente Almirante produziu um maná de inovações e já era famoso pela sua notável precisão muito antes da travessia do Atlântico em hidroavião em 1922.
Os GPS de hoje têm um nível de precisão que pode chegar a 1 metro e são usados na Estação Espacial Internacional para se saber a sua posição exacta enquanto esta evolui a cerca de 27600 km/h na sua órbita de baixa altitude. Ou nos telemóveis, laptops “musculados”, automóveis, camiões, aeronaves, comboios e navios.
Mas o GPS tem limitações nos voos das naves espaciais para o sistema solar. O seu sinal perde intensidade e fica inútil por exemplo numa viagem até às muito interessantes Luas de Júpiter ou de Saturno, onde poderá existir vida microbial.
A NASA lançou um programa que experimentou usar os faróis do espaço como referências, e algumas estrelas de neutrões que emitem radiações, os pulsares, têm uma precisão similar à dos relógios atómicos instalados nos satélites GPS.
Mais, as radiações no nível de energia dos Raios-X que estas estrelas hiper densas (uma colher de chá pode pesar mil milhões de toneladas num Pulsar) emitem são de interesse científico pois providenciam dados sobre a sua composição e sobre mecanismos das forças nucleares ainda não totalmente explicados nas estrelas de neutrões.
As estrelas de neutrões com emissões de raios-X estão em sistemas binários associadas a estrelas de diversos tipos, desde supergigantes, a gigantes, ou mesmo de massa informalmente classificada como solar. Os próprios Pulsares não são todos iguais, mas é a natureza da sua estrela companheira, factorizada com pelo menos 3 mecanismos diferentes de transferência de massa – da companheira para o pulsar – que determina a periodicidade das emissões e a sua pouca ou elevadíssima sazonalidade.
Por motivos óbvios escolhem-se como faróis os sistemas com pouca incerteza de sazonalidade, não são objectos de interesse sistemas muito variáveis e que podem estar anos “adormecidos” e depois voltarem a emitir até uma data imprevisível. Chamamos em Astrofísica este tipo de objectos aleatórios de transientes.
O objectivo são faróis estáveis com origem em sistemas binários com uma transferência de massas resultando numa emissão em raios-x estável em relação a si própria.
Ou seja, um sistema pode ter uma periodicidade de rotação elevadíssima, elevada, média ou baixa. O que interessa é
1) conhecer-se muito bem a sua localização.
2) que o período de rotação seja estável ao longo do tempo.
Alguns pulsares candidatos revelam-se também menos interessantes devido a perderem energia e rodarem mais lentamente ao longo do tempo. São faróis que giram cada vez mais devagar. Podem por isso ser transientes, ou induzirem erros nos sistemas de navegação informatizados.
Na senda da miniaturização dos cronómetros de bolso de Harrison.
A enorme vantagem dos 4 objectos selecionados (Pulsares de milissegundos) é a natureza dos raios-X. São emissões de comprimento de onda muito curta e de energia muito elevada.
Isso permite que os detectores do multi-telescópio Nicer sejam pequenos, logo melhor adaptados às limitações duma nave espacial. O sistema experimental SEXTANT da NASA levado pela Space-X para a Estação Espacial Internacional tem o tamanho duma máquina de lavar roupa, não dum sistema de rádio-telescópios com parabólicas gigantes espaçadas entre si o máximo de distância possível.
Mexer bem o açúcar no café.
A experiência SEXTANT recorreu aos 52 telescópios de raios-X equipados com detectores de silício de deslizamento (SDD) que desempenham melhor a detecção devido à sua baixa capacidade eléctrica (evitam fugas de cargas) e permitem o uso de sistemas de arrefecimento de Peltier, isso significa que o calor gerado pela passagem da corrente pode ser usado para equilíbrio térmico dos telescópios fazendo essa corrente ir para trás e para a frente a partir das e a voltar para as juntas, misturando esse já muito ligeiro calor ao longo da área (a capitância é proporcional à área) dos detectores, como se tratasse de misturar bem misturado o açúcar no café.
Outra vantagem óbvia é que um sistema pequeno se protege melhor, tanto o vetusto e magnífico sextante como os sofisticados detectores de raios-X podem sofrer graves incorreções caso não haja equilíbrio térmico entre o aparelho e o ambiente.
Numa aventura com um veleiro nos Oceanos, o sextante aquecer repentinamente (estava no estojo e é exposto ao sol) pode causar dilatações nas estruturas e causar erros de medições tremendos, por vezes tão graves que por absurdo o deixam de o ser, são tomadas de leituras logo ignoradas, mas um erro pequeno é perigoso porque pode passar não detectado.
Numa aventura espacial às Luas de Júpiter os detectores de raios-X podem assim assegurar o equilíbrio térmico.
Os engenheiros revelam que é exequível com a tecnologia de hoje, a julgar pelo sucesso da experiência a bordo da Estação Espacial Internacional.
De facto a margem de erro foi inferior a 5 km.
Os relógios de John Harrison, o sextante de Newton e de Gago Coutinho, a constelação de 24 satélites do GPS contemporâneo e a Navegação Espacial por raios-X partilham a base do conceito geométrico da triangulação para calcular posições, distâncias relativas e velocidades vectoriais de ida e velocidades escalares de ida e volta!
Bebem directamente da frescura das fontes clássicas, desde Tales de Mileto a Pitágoras.
E rasgarão os céus do sistema solar dando autonomia, precisão e muito melhores probabilidades de sucesso às modernas astro-naves das Descobertas.
Tudo graças aos faróis naturais de algumas estrelas de neutrões.
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