Neste artigo apresento-vos os cinco mais belos teoremas da Matemática de acordo com a votação organizada pela Mathematical Intelligencer. Na primeira parte já vos falei da soma infinita dos inversos dos quadrados dos números naturais (5º lugar); dos sólidos platónicos (4º lugar); e da demonstração de que existem infinitos números primos (3º lugar).
A fórmula de Euler para poliedros conquistou o segundo lugar. Em 1751, Leonhard Euler descobriu que se somarmos o número de vértices (V), subtrairmos o número de arestas (E) e adicionarmos o número de faces (F) de um qualquer poliedro convexo obtemos sempre 2:
Recordo que um poliedro é uma qualquer figura geométrica tridimensional com arestas rectas e faces planas. Para ser convexo não pode ter nem buracos, nem concavidades (ver a nota [4] no fim da primeira parte para uma definição mais rigorosa).
Por exemplo, um cubo tem 8 vértices, 12 arestas e 6 faces, logo verificamos que 8-12+6=2.
No caso de uma pirâmide quadrangular:
Temos 5 vértices, 8 arestas e 5 faces. De novo obtemos o resultado esperado: 5-8+5=2.
É claro que verificar que a relação está correcta para um determinado exemplo é um exercício fácil. Em contraste, constatar que tal se aplica a todos os poliedros (convexos) tinha escapado a todos os matemáticos antes de Euler.
Devo frisar que isto não é uma mera curiosidade! Trata-se de uma relação fundamental que nos dá uma relação intrínseca sobre os poliedros. É impossível construir um poliedro convexo que não obedeça à fórmula! Com esta fórmula é possível, por exemplo, demonstrar que não existem poliedros convexos com sete arestas, ou que não podem existir mais que 5 sólidos platónicos.
Esta fórmula diz-nos que o espaço e as formas que nos rodeiam têm restrições bem definidas! Tal como em qualquer outra demonstração Matemática: não precisámos de analisar directamente o mundo material, bastou-nos usar o intelecto humano.
Em cima usei as palavras “descobrir” e “constatar” em relação a este feito de Euler, isto porque a demonstração de Euler não estava completamente correcta. Adrian Marie Legendre (1752-1833) foi o primeiro a chegar a uma demonstração rigorosa da fórmula. Curiosamente, a equação poderia ter sido descoberta antes de Euler: René Descartes (1596-1650) descobriu certas relações a partir das quais se poderia derivar a fórmula de Euler.
Mais tarde descobriram-se generalizações desta fórmula para figuras geométricas mais complicadas (com buracos e em espaços com mais de três dimensões).
Passemos finalmente ao primeiro lugar! Como muitos serão capazes de adivinhar, o teorema votado como sendo o mais belo foi a Identidade de Euler:
Esta equação é um caso particular da Fórmula de Euler:
(Recordo que já tinha apresentado esta fórmula no artigo onde resolvi i^i, pelo que não irei aqui explaná-la.) Quando x=π, temos cos(π)=-1 e sin(π)=0 e portanto obtemos a Identidade de Euler.
A beleza da Identidade de Euler reside na forma simples como relaciona cinco constantes fundamentais da Matemática: 0, 1, e, π, i (recordo que já falei destes números no artigo “Fascínio dos Números”: parte II [i], parte IV [0 e π] e parte V [e]). Trata-se de uma relação profunda entre estes números. Como disse o matemático Benjamin Pierce, “não a podemos compreender e não sabemos o que significa, mas demonstrámo-la e portanto sabemos que tem que ser verdadeira”.
Leonhard Euler (1707-1783) foi um dos maiores matemáticos de sempre. É o matemático com mais publicações individuais da História da Matemática num total de 30 mil páginas (o famoso Paul Erdos publicou mais, mas teve mais de 500 colaboradores). Note-se que ele contribuiu para todos os cinco teoremas mencionados (no caso da existência de infinitos números primos, Euler enunciou uma outra demonstração diferente daquela encontrada por Euclides). Euler ficou quase cego a partir de 1766, mas isso não o impediu de continuar a descobrir as belezas da Matemática. Para lá da Matemática, ele contribuiu ainda de forma significativa em Física (Óptica, Mecânica, Dinâmica de Fluídos), Astronomia e Teoria Musical. O famoso matemático Laplace escreveu: “ele é o mestre de todos nós.”
Calvin: “Sabes que mais, acho que a Matemática não é uma Ciência. É uma religião.”
Hobbes: “Uma religião?”
Calvin: “Sim. Todas estas equações são como que milagres. Tens dois números, adiciona-los, e eles transformam-se num novo número como que por magia! Ninguém consegue dizer como é que tal acontece. Só podes acreditar ou não acreditar. Este livro está cheio de coisas que têm que ser aceites com fé! É uma religião!”
Hobbes: “E isto é ensinado nada menos que nas escolas públicas. Chama um advogado.”
Calvin: “Como ateísta da Matemática, eu devo ser dispensado disto.”
As equações por vezes parecem de facto milagres, até mesmo depois de se entender a “magia” que as criou. Mas não, Calvin: há quem consiga dizer como é que tal acontece, pelo que não precisas de acreditar, podes compreender!
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