Na primeira e segunda partes discuti a propagação do coronavírus, o significado dos números e a importância do distanciamento social. Nesta terceira parte vou dar uma breve opinião sobre o impacto do vírus na liberdade e no ambiente.
Uma das reacções contra o distanciamento social imposto pelos governos de vários países tem sido a de que tal imposição infringe os direitos dos cidadãos. Do meu ponto de vista isto é uma falácia. Os nossos direitos dependem das circunstâncias! Todos concordamos que não temos o direito de colocar a vida dos outros em risco: pois bem, neste momento o “direito” de nos encontrarmos com outras pessoas coloca tanto a nossa vida como a dos outros em risco. Assim, é natural que haja uma imposição governamental para garantir a protecção da sociedade. É bom recordar que os nossos direitos são sempre uma função dos direitos dos outros, visto que nós somos os “outros” dos outros. O direito a termos a nossa vida protegida é o nosso direito primordial. Concordando nesse aspecto, torna-se claro que em dadas circunstâncias isso implica a perda de outros direitos. É claro que neste momento o problema está em educar a população sobre a mudança de circunstâncias, pois nem todos compreenderam ainda que se não cumprirem o distanciamento social estão literalmente a tornar-se responsáveis por homicídio por negligência.
Uma outra reacção ao coronavírus tem sido a tentativa de encontrar aspectos positivos nesta nova realidade. Um aspecto positivo evidente é a redução na poluição, consequência das medidas de bloqueio das sociedades. Por exemplo, o gráfico de cima representa uma diminuição acentuada nos níveis de dióxido de azoto (nitrogénio) na China (que é um indicador indirecto de que também a emissão de dióxido de carbono deva ter diminuído). Se por um lado é certo que existe este aspecto positivo, por outro lado não me parece que faça sentido extrair contentamento sobre isto, pois a crise das alterações climáticas não ficará resolvida com as medidas tomadas para conter o coronavírus. A minha especulação empírica é que de facto o coronavírus venha a ter um impacto negativo no combate às alterações climáticas porque depois desta “melhoria” temporária teremos provavelmente grande parte do mundo a negligenciar o clima por completo seguindo a premissa de que é necessário recuperar as economias… Isto é, se o clima já não era propriamente uma prioridade antes do coronavírus aparecer, parece-me que depois sê-lo-á ainda menos. Assim, temo que a longo prazo o “saldo” no clima seja negativo. Não obstante, a verdade é que não sabemos qual será o “saldo” final, pelo que não me parece motivo para contentamento, pelo menos não para já.
Como não quero partilhar só o meu pessimismo, acabo com algumas notas positivas que nos podem dar esperança: um estudo na Islândia mostrou que provavelmente cerca de 50% das pessoas infectadas nem sequer têm sintomas. Por um lado isto implica que o vírus se propaga de forma bastante dissimulada, tornando a sua contenção difícil (algo que já sabíamos), mas por outro lado significa que as taxas de mortalidade reais do vírus possam ser mais reduzidas que aquelas que indiquei na segunda parte. Além disto, refiro ainda que a OMS começou um enorme estudo para testar a eficácia de 4 possíveis tratamentos do coronavírus. Esperemos que algum deles funcione!
Um outro aspecto positivo desta pandemia é o facto de ter obrigado (ou estar a obrigar) tanto governos como o público a ouvir os cientistas. A ciência e o seu método são simplesmente a forma que a humanidade encontrou de obter informação e de testar a sua veracidade. Se queremos tomar a melhor decisão possível temos que usar a informação do passado para tentar prever o futuro. Nem sempre vamos acertar, mas a ciência garante-nos que iremos melhorar!
1 comentário
…. a ciência garante-nos que iremos melhorar.
A melhor frase.