Na Inglaterra, numa escola em East Sussex, uma professora estava a falar do tema da inclusão a uma turma de raparigas/meninas com 13 anos.
Uma das raparigas (A) ficou tão impressionada com a aula que disse que a partir daquela altura se identificava como um gato e queria ser tratada como um gato.
Uma amiga dela (B) da mesma turma perguntou: “Como é que te podes identificar como gato, se és uma pessoa, uma rapariga?”
A professora questionou B: “Como é que podes questionar a identidade de outra pessoa?”
A aluna B respondeu: “Se a pessoa, que é uma pessoa, diz que é um gato, diz que se identifica como um gato, uma vaca ou outro animal qualquer, penso que há qualquer coisa de genuinamente errado na saúde mental dela. Porque a situação é de malucos.”
Outras alunas intercederam dizendo que se a pessoa tem vagina é uma rapariga e se têm um pénis é um rapaz.
A professora então concluiu dizendo que se há alunas tão intolerantes ao ponto de pensarem que só existem dois géneros, então deviam ir para outra escola.
E a professora terminou, chamando-as (incluindo à aluna que questionou) de homofóbicas e deploráveis.
Esta história chamou-me à atenção porque me parece que se está a ir do 8 ao 80: passou-se de uma sociedade intolerante em relação a escolhas de vida de algumas pessoas, para uma sociedade que é obrigada a ser tolerante com opiniões ridículas.
Também me fez pensar no tema da saúde mental, tão em voga atualmente nas sociedades ocidentais.
Não se trata pessoas que assumem que são Napoleão, por exemplo, obrigando todas as outras pessoas a aceitar que essa pessoa é Napoleão.
Por fim, realço a atitude da professora: supostamente estava a ensinar o tema da inclusão, onde a tolerância é uma das principais características. E qual foi a reação dela? Ser extremamente intolerante para com quem argumentava de forma diferente, chegando mesmo a insultar e a ameaçar quem tinha uma opinião diferente da sua.
Quem advoga/requer/professa respeito e tolerância por vezes é quem mais desrespeito e intolerância demonstra para opiniões diferentes da sua.
A teacher admonishes her students because they questioned another child identifying as a cat.#SexNotGender #WomenAreReal pic.twitter.com/NXvdcr2ZFy
— WomenAreReal (@WomenAreReals) June 17, 2023
Porque trago esta história aqui?
Porque talvez devido à minha formação académica, ligo estes assuntos aos movimentos negacionistas da ciência, da realidade.
Da mesma forma que uma rapariga/menina é uma pessoa e não um gato, também a Terra não é plana, também as vacinas não causam autismo, também a homeopatia não funciona, também a astrologia não é ciência, etc, etc, etc.
Nos últimos anos, apareceram argumentos políticos de que vivemos numa sociedade de pós-verdade.
No entanto, a verdade, a realidade, continua a existir, por mais que os movimentos negacionistas nos tentem convencer do contrário.
Uma pessoa não é um gato. Essa é a realidade.
Basta comparar as definições (e diferentes características) de uns e outros para perceber essa realidade.
Da mesma forma, a pessoa X atual não é Napoleão, independentemente da pessoa X ter uma crença (oposto de verdade objetiva) de que já teve vidas passadas.
As pseudociências não são ciência.
Mesmo que se advoguem de ser, e mesmo que se tentem imiscuir em questões sociais para confundir as pessoas.
Atualmente, o pensamento crítico é bastante importante, porque a realidade é negada facilmente.
Há muita gente que é intolerante para com a realidade. E normalmente são eles/elas que dizem defender “todos os pontos de vista”, são eles/elas que advogam ser muito tolerantes para tudo. Mas não o são. Não são tolerantes para com a realidade, para com a verdade, para com as evidências objetivas.
Como diria Carl Sagan: as verdades profundas devem ser separadas dos disparates profundos.
E tal como ele também disse: nunca abram demasiado a mente, senão o cérebro cai. Ou dito de outra forma: se forem demasiado tolerantes a tudo, deixam entrar o lixo todo.
A pessoa deve ter filtros mentais: evidências, racionalidade, literacia funcional.
Infelizmente, temo que a sociedade se esteja a tornar intolerante para com quem defende a realidade, dada pela biologia, física, química, ou outra qualquer ciência natural…
2 comentários
Penso diferente. Concordo sim com a primeira menina, porém discordo das demais, e por uma questão científica (biológica, mais precisamente genética): sexo/gênero não é definido exclusivamente pela ordem cromossômica e pelo aparelho genital aparente. Primeiro ponto a se considerar, e a genética já provou isso: o cérebro tem sexo. O cérebro masculino tem um tamanho e um índice de massa (peso) um pouco maior que o cérebro feminino, e assim como há pessoas que nasceram com ordem cromossômica XX, uma vulva entre as pernas e tem cérebro feminino, também há pessoas que nasceram com ordem cromossômica XX, uma vulva entre as pernas e no entanto seu cérebro é masculino; assim como há pessoas que nasceram com ordem cromossômica XY, apresentam um pênis no entre-pernas e nasceram com um cérebro masculino, também há pessoas que nasceram com ordem cromossômica XY, apresentam um pênis entre as pernas e no entanto demonstram um cérebro feminino; é o que chamamos “disforia de gênero”. Ponto 2 a se considerar: Existem intersexo, pseudo-hermafroditismo e hermafroditismo verdadeiro (estes dois últimos, salvo engano, são relatados por Journals de Medicina do mundo todo desde os anos 1960), e isso tudo também se consegue provar cientificamente através da genética. Então não, a genética não diz que SÓ EXISTEM dois sexos/gêneros, ela reconhece várias possibilidades de sexo/gênero e traz evidências bem sólidas a respeito, muitas delas apoiadas por outras especialidades médicas e até mesmo pela psicologia. Posso concordar que a professora errou em afirmar que “gato” seja um gênero dentro da sexo-diversidade, sabemos todos que foi um erro dela pois “gato” não é sexo nem gênero, é espécie animal (diferente da humana), mas considerá-la errada por identificar as meninas que disseram que só existem dois sexos como homofóbicas e transfóbicas já é demais para qualquer um que conheça ao menos o ABC do básico sobre Genética (coisa que, pelo menos no Brasil, é trazida por qualquer livro de Biologia do Ensino Médio).
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Jonathan, o meu ponto não tinha a ver com a forma como a pessoa se identifica (homem ou mulher). Sobre isto, sou 90% liberal. Respeito as pessoas. Aceito quase tudo. Há pequenas coisas aqui e ali com que não concordo, como expliquei no meu Facebook, em que duas mulheres lésbicas se apresentaram na televisão como sendo “eles”. Note que não são transexuais, nem pretendem ser, pelo que percebi. Um outro casal de mulheres lésbicas no mesmo programa teve exatamente a minha opinião e discutiu com “eles”. Se agora só contar o que a pessoa diz, então deixa de existir uma realidade objetiva, em que podemos todos ser enganados. Também não concordo com a Lia Thomas competir contra mulheres, como também expliquei no meu Facebook.
Mas o meu ponto neste artigo não tem a ver com as minhas opiniões pessoais. O meu ponto é que a menina não é um gato. Logo ali, a professora devia ter parado e ter explicado que ela que não é um gato. Não se deve aceitar tudo. A tolerância tem limites. E certamente que esses limites não devem ser a realidade objetiva.
abraço!