“O geólogo, que em 1980 revolucionou a ciência ao descobrir que os dinossauros tinham sido extintos pelo impacto de um asteróide, acredita hoje que a ciência moderna nasceu em Portugal. (…)
Ao propor, em 1980, que o desaparecimento dos dinossauros, há 66 milhões anos, foi acompanhado pela extinção de muitas outras espécies e se ficou a dever ao impacto de um asteróide, o geólogo norte-americano Walter Alvarez tornou-se um desses raros cientistas que alteraram radicalmente a nossa visão do passado. (…)
“Numa revolução científica, e acho que os Descobrimentos foram uma genuína revolução científica, o que acontece é que alguns conceitos antigos se mostram errados e entra em cena um novo conceito. Darwin fez isso ao perceber que as espécies se formam por selecção natural, e Einstein também o fez, mostrando que Newton só tinha razão parcial e que a sua teoria não funciona quando lidamos com objectos que se movem mesmo muito depressa. No meu campo, o da geologia, tivemos duas revoluções científicas nos últimos 30 ou 40 anos. Com a tectónica de placas provou-se que os continentes se movem, e isso leva-nos aos tais supercontinentes de que falarei na conferência: agora os continentes estão aqui e ali, mas há 200 milhões de anos, o que até nem é assim tanto tempo, estavam todos juntos num supercontinente…
Numa revolução científica, as ideiam mudam, e foi isso o que aconteceu em Portugal nos séculos XV e XVI. Antes dos navegadores portugueses, os europeus recuavam a Cláudio Ptolomeu e pensavam que o Oceano Índico era completamente fechado, como um lago enorme, ao qual não se podia chegar navegando. Os portugueses mostraram que era possível atingi-lo por mar contornando a costa africana. Ou seja, todos os mapas baseados em Ptolomeu estavam simplesmente errados. Como geólogo, interessa-me a Terra, e isto era uma grande descoberta acerca da Terra.
Numa revolução científica também se desenvolvem novos instrumentos e técnicas, e foi o que os portugueses fizeram, com as caravelas e outros barcos, ou com a invenção do astrolábio. E quer outro argumento? Todas as ciências têm uma base matemática forte, e no tempo dos Descobrimentos existiu um grande matemático, Pedro Nunes. Temos cartas de matemáticos ingleses da época que dizem que ele é o maior matemático vivo. O que Nunes fez foi calcular como se pode navegar no mar alto, no Atlântico. No Mediterrâneo era fácil, ninguém se perdia. Só Ulisses é que andou lá perdido uns 20 anos… (…)
O ensaio em que eu e o meu pai [o físico Luis Walter Alvarez (1911-1988), prémio Nobel em 1968] avançamos a hipótese de que o impacto de um asteróide provocara uma extinção em massa saiu em 1980. Os geólogos estavam convencidos de que tudo o que se passara na história do planeta decorrera devagar e gradualmente. A ideia de que o impacto de um asteróide podia ter morto os dinossauros e extinguido muitas outras espécies de animais e de plantas era um anátema. Não gostavam mesmo nada dessa ideia e, na época, criticaram-me bastante severamente. (…) O homem que convenceu os geólogos de que todas as mudanças tinham sido lentas e graduais foi um inglês chamado Charles Lyell, que escreveu o seu livro [Principles of Geology] por volta de 1830. É verdade que a maior parte das mudanças é lenta e gradual, mas ele afirmava que nada de catastrófico alguma vez ocorrera. Pensei muitas vezes que, sendo ele um inglês de classe alta a viver nos tempos da Revolução Francesa, não lhe deveria agradar muito a ideia de mudanças bruscas e de catástrofes. Mas Lyell não era só um geólogo, era também um advogado, e por isso era muito bom a convencer as pessoas. (…) Talvez pense que a ciência é muito lógica, mas a verdade é que andamos aos tropeções, procurando respostas que ninguém ainda deu. Mesmo após a descoberta do que se passava com o irídio, estivemos um ano inteiro a colocar diferentes hipóteses até chegarmos à ideia do asteróide. (…) Tínhamos estado a trabalhar nessas rochas em Itália, analisando camada sobre camada sobre camada. Eram depósitos marinhos e não tinham dinossauros, mas tinham micro-organismos fossilizados que surgiam em todas as camadas e que, de repente, desapareciam de forma brusca. Escapavam alguns mais pequenos, mas os grandes desapareciam todos: era quase uma extinção em massa. (…)” (…)”
Leiam na totalidade esta excelente entrevista feita a Walter Alvarez, por Luís Miguel Queirós, no jornal Público, aqui.
1 comentário
Infelizmente nem os Portugueses têm consciência disto!!!
Devido a questões políticas, alguns egos, e às habituais tendências revisionistas, existem alguns ‘enganos’ temporais… os Descobrimentos não começaram com o Infante D. Henrique, o início do projecto marítimo Português, nasce no reinado de D. Dinis: Universidade de Coimbra, Ordem de Cristo, Manuel Pessanha… e até o Espírito Santo!!!!!
Pedro Nunes, Garcia da Orta, Zacuto, João de Castro, Pedro Reinel… Se estas personagens, tivessem nascido e trabalhado em Inglaterra, hoje seriam referências globais, assim, até em Portugal são ‘quase’ anónimos!!!
Abraços