Explosão estelar permite-nos observar linha de neve da água

O Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) obteve a primeira observação bem resolvida de uma linha de neve de água no interior de um disco protoplanetário.

Esta linha marca o lugar onde a temperatura no disco que rodeia uma estrela jovem decresce o suficiente para que se possa formar neve.

O aumento drástico no brilho da jovem estrela V883 Orionis aqueceu a zona interior do disco, empurrando a linha de neve da água para uma distância muito maior do que o que é normal numa protoestrela, permitindo assim observá-la pela primeira vez.

Estes resultados foram publicados a 14 de julho de 2016 na revista Nature.

Impressão artística da linha de neve da água em torno da jovem estrela V883 Orionis. Créditos: A. Angelich (NRAO/AUI/NSF) / ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)

Impressão artística da linha de neve da água em torno da jovem estrela V883 Orionis.
Créditos: A. Angelich (NRAO/AUI/NSF) / ALMA (ESO/NAOJ/NRAO)

As estrelas jovens encontram-se muitas vezes rodeadas por densos discos de gás e poeira em rotação, os chamados discos protoplanetários, a partir dos quais os planetas se formam. O calor de uma estrela jovem do tipo solar faz com que a água no seio do disco protoplanetário se mantenha no estado gasoso até uma distância de cerca de 3 UA da estrela — menos de 3 vezes a distância média entre a Terra e o Sol — ou cerca de 450 milhões de km. (Esta linha situava-se entre as órbitas de Marte e Júpiter durante a formação do Sistema Solar e por isso os planetas rochosos — Mercúrio, Vénus, Terra e Marte — formaram-se no interior desta linha, enquanto os planetas gasosos — Júpiter, Saturno, Urano e Neptuno — se formaram para lá dela.) Mais longe, devido à pressão extremamente baixa, as moléculas de água passam diretamente do estado gasoso a uma camada de gelo que cobre grãos de poeira e outras partículas. A região no disco protoplanetário onde a água passa da fase gasosa para a fase sólida é chamada linha de neve da água.

No entanto, a estrela V883 Orionis é invulgar. Um aumento drástico no seu brilho empurrou a linha de neve para uma distância de cerca de 40 UA (cerca de 6 mil milhões de km ou aproximadamente o tamanho da órbita do planeta anão Plutão no nosso Sistema Solar). Este enorme aumento, combinado com a resolução do ALMA para grandes linhas de base, permitiu à equipa, liderada por Lucas Cieza (Millennium ALMA Disk Nucleus e Universidad Diego Portales, Santiago, Chile) obter as primeiras observações resolvidas de uma linha de neve de água num disco protoplanetário.

Imagem ALMA do disco protoplanetário em torno da V883 Orionis. Créditos: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO) / L. Cieza

Imagem ALMA do disco protoplanetário em torno da V883 Orionis.
Créditos: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO) / L. Cieza

O brilho repentino que a V883 Orionis sofreu é um exemplo do que acontece quando enormes quantidades de material do disco que rodeia a estrela jovem caem na sua superfície. A V883 Orionis é apenas 30% mais massiva que o Sol, mas devido a esta explosão que está a ocorrer, a sua luminosidade é atualmente 400 vezes maior que a do Sol, apresentando-se também muito mais quente.

O autor principal Lucas Cieza explica: “As observações ALMA revelaram-se surpreendentes para todos nós. As nossas observações estavam preparadas para procurar fragmentações no disco, as quais levam à formação de planetas. Não vimos nada disso, no entanto encontrámos o que parece ser um anel a 40 UA. Isto mostra bem o poder transformador do ALMA, que nos dá resultados excitantes mesmo não sendo os que estamos à procura.”

O deslocamento da linha de neve da água na V883 Orionis. Créditos: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO) / L. Cieza

O deslocamento da linha de neve da água na V883 Orionis.
Créditos: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO) / L. Cieza

A ideia estranha de neve em órbita no espaço é fundamental para a formação planetária. A presença de água regula a eficiência da coalescência dos grãos de poeira — a primeira etapa da formação planetária. É no interior da linha de neve, onde a água se evapora, que se pensa que nasçam os planetas rochosos mais pequenos, como a Terra. Para lá da linha de neve, a presença de gelo de água permite a rápida formação de bolas de neve cósmicas, que eventualmente irão formar planetas gasosos massivos como Júpiter.

A descoberta de que estas explosões na estrela podem lançar a linha de neve da água para cerca de 10 vezes o seu raio típico é bastante significativa para o desenvolvimento de bons modelos de formação planetária. Pensa-se que estas explosões sejam uma etapa da evolução da maioria dos sistemas planetários, por isso esta pode bem tratar-se da primeira observação de uma ocorrência comum. Neste caso, esta observação do ALMA poderá contribuir de modo significativo para uma melhor compreensão de como é que os planetas se formam e evoluem no Universo.

Este é um artigo do ESO, que pode ser lido aqui.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado.

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.