Muão desafia o Modelo Padrão

Este é um artigo muito interessante.

Leiam o artigo com uma certa cautela. Porque os resultados ainda não estão comprovados. E podem existir erros variados a afetar os potenciais fantásticos resultados. Lembrem-se que alegações extraordinárias requerem evidências extraordinárias.

Mas leiam de forma entusiasmada devido às potenciais consequências destes resultados.

Faço notar também que, ao contrário do que popularmente se pensa, estes resultados são fantásticos para os cientistas. É uma “chatice” comprovar o que já se sabe. Abrir novas avenidas de entendimento é o que procuram os cientistas no “cutting edge of science”.

“Um parente mais pesado do eletrão, chamado muão, está a desafiar o “Modelo Padrão” de todas as partículas no universo.

Numa experiência marcante, os cientistas encontraram novas evidências de que uma partícula subatómica está a desobedecer a uma das teorias mais rígidas da ciência, o Modelo Padrão da física de partículas. A lacuna entre as previsões deste modelo e o comportamento medido recentemente da partícula sugere que o universo pode conter partículas invisíveis e forças que estão para além do nosso alcance atual.

(…)

Tal como os eletrões, os muões têm uma carga elétrica negativa e uma propriedade quântica chamada centrifugação, que faz com que as partículas atuem como minúsculos piões oscilantes quando colocado num campo magnético. Quanto mais forte o campo magnético, mais depressa o muão oscila.

O Modelo Padrão, desenvolvido na década de 1970, é a melhor explicação matemática que a humanidade tem para a forma como todas as partículas do universo se comportam, e também prevê a frequência de oscilação de um muão com extrema precisão. Mas em 2001, o Laboratório Nacional de Brookhaven em Upton, Nova Iorque, descobriu que os muões parecem oscilar um pouco mais depressa do que o previsto no Modelo Padrão.

Agora, duas décadas depois, a experiência Muon g-2 do Fermilab realizou a sua própria versão da experiência do laboratório de Brookhaven – e observou a mesma anomalia. Quando os investigadores combinaram os dados das duas experiências, descobriram que as probabilidades de esta discrepância ser simplesmente um acaso eram de cerca de 1 em 40.000, um sinal de que partículas e forças adicionais podem estar a afetar o comportamento do muão.

“Já era sem tempo”, diz Mark Lancaster, físico da Universidade de Manchester e membro da colaboração Muon g-2, uma equipa de mais de 200 cientistas de sete países. “Muitos de nós trabalhamos nisto há décadas.”

“Isto é realmente o nosso equivalente à aterragem de uma sonda em Marte”, acrescenta Chris Polly, cientista do Fermilab que trabalhou na experiência Muon g-2, bem como na experiência anterior em Brookhaven.

De acordo com os padrões rigorosos da física de partículas, estes resultados ainda não são uma “descoberta”. Essa fronteira só será alcançada quando os resultados atingirem uma certeza estatística de cinco sigma, ou uma probabilidade de 1 em 3.5 milhões de que uma flutuação aleatória provocou a lacuna entre a teoria e a observação, em vez de uma diferença real.

Os novos resultados (…) baseiam-se em apenas 6% do total de dados que a experiência vai recolher. Se os resultados do Fermilab permanecerem consistentes, chegar aos cinco sigma pode levar alguns anos. “A atitude a adotar é a de uma espécie de otimismo cauteloso”, diz Nima Arkani-Hamed, físico teórico do Instituto de Estudos Avançados em Princeton, Nova Jersey, que não esteve envolvido na investigação.

(…)

O Modelo Padrão é indiscutivelmente a teoria científica mais bem-sucedida, capaz de previsões incrivelmente precisas de como se comportam as partículas fundamentais do universo. Mas os cientistas sabem que o modelo está incompleto. Por exemplo, falta uma descrição da gravidade, e o modelo não menciona a misteriosa matéria negra que parece estar espalhada por todo o cosmos.

Para descobrir o que está para além do Modelo Padrão, os físicos tentam levá-lo até um ponto de rutura através de experiências em laboratório. Contudo, a teoria tem teimosamente passado teste após teste, incluindo anos de medições de alta energia no Large Hadron Collider (LHC) do CERN, que em 2012 encontrou uma partícula que tinha sido prevista pelo Modelo Padrão: o bosão de Higgs, que desempenha um papel fundamental na atribuição de massa a algumas outras partículas.

Ao contrário do LHC, que colide partículas para formar novos tipos de partículas, a experiência Muon g-2 do Fermilab mede partículas conhecidas com extrema precisão, procurando desvios subtis na teoria do Modelo Padrão.

(…)

Por coincidência, os resultados do Fermilab chegaram duas semanas depois de outro laboratório – a experiência LHCb do CERN – ter encontrado evidências independentes de muões com um comportamento inadequado. Essa experiência monitoriza partículas de vida curta chamadas mesões B e rastreia a forma como decaem. O Modelo Padrão prevê que algumas dessas partículas em decomposição expelem pares de muões. Mas a experiência LHCb encontrou evidências de que estas decomposições de muões acontecem com menos frequência do que o previsto, com as probabilidades de um acaso a rondarem valores de um em mil.

Tal como a experiência do Fermilab, a experiência LHCb precisa de mais dados para poder reivindicar uma nova descoberta. Ainda assim, a combinação dos dois resultados “entusiasmou os físicos”, diz Aida El-Khadra.

A etapa seguinte é replicar os resultados. (…)”

Fonte (transcrição parcial): National Geographic
Fonte: comunicado de imprensa.

1 comentário

    • Armando Graça on 16/04/2021 at 20:05
    • Responder

    Caro Carlos Oliveira
    Segui o seu conselho e li atenta e cautelosamente este artigo. Creio ter compreendido as muitas dúvidas que subsistem à volta do estudo em causa.
    Mas, o mais importante, pelo menos para mim, é a triste constatação de me sentir analfabeto perante a complexidade destas matérias. Dei comigo a pensar no que sentirão os ainda tantos que não sabem ler nem escrever. E assustei-me quando me recordei que alguns “sábios” afirmam que a ignorância é um dos melhores caminhos para o encontro da felicidade.
    Nascido no final da II Guerra Mundial, perante a evolução assombrosa das tecnologias, estava convencido, como tantos, que o saber geral caminharia num crescendo que nos levaria a um mundo melhor.
    É pena que, para as ciências sociais e humanas, não exista um Modelo-padrão…
    Será que o ser humano só consegue sobreviver num quase caos?

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