Esta é mais uma daquelas conspirações estúpidas inventadas pelos negacionistas: o objetivo é misturar tudo, para confundir as pessoas, mentindo-lhes, de modo a lhes incutir o medo das vacinas.
Os negacionistas (os que sobreviveram sem mazelas) andam agora a divulgar que a vacina contra a COVID-19 é a responsável por causar hepatite aguda nas crianças. E, segundo eles, um estudo da Pfizer demonstra isso.
Ora, a hepatite aguda em crianças tem realmente sido um problema recentemente, quer na Europa quer nos EUA: com muitas crianças doentes e algumas a morrerem.
Existe a hipótese – que está a ser estudada (por cientistas, e não por negacionistas ou conspiradores ignorantes) – de que a COVID-19 está relacionada com este surto de hepatite aguda em crianças.
Um estudo publicado na revista científica The Lancet e dados de vários países apontam uma relação entre as duas doenças.
Ainda outro estudo aponta para o SARS-CoV-2 ter um efeito facilitador nas inflamações do organismo quando as crianças são infetadas pelo adenovírus 41F.
A confirmação dessa relação (da hipótese inicial) só virá após mais estudos.
Mas para já, todas as evidências apontam nessa direção.
Ou seja, o que se sabe para já (com estudos e não especulações absurdas nas redes sociais), é que a enorme maioria das crianças que tiveram a hepatite aguda tinham tido uma infeção prévia com um adenovírus, sendo que grande parte delas tinham presença do subtipo 41F (conhecido por inflamações gástricas).
Assim, as crianças tiveram a infeção por SARS-CoV-2 (que causa a COVID-19) e tiveram uma outra infeção (posteriormente ou anteriormente) por um adenovírus de subtipo 41F.
Conclusão: muito provavelmente existe uma relação da hepatite aguda com a COVID-19, mas isso é porque as crianças são infetadas pelo SARS-CoV-2.
Como dizem os investigadores: “A infeção por COVID-19 pode resultar na formação de um reservatório viral” e “uma persistência viral do SARS-CoV-2 no trato gastrointestinal pode levar a uma subida da ativação imunitária”, que pode provocar a hepatite aguda, que afeta sobretudo crianças, jovens e doentes imunossuprimidos.
Nada disto tem a ver com vacinas!
Na verdade, a grande maioria das crianças afetadas pela hepatite aguda nem sequer receberam a vacina contra a COVID-19!
Ao contrário do que dizem os negacionistas, se calhar foi precisamente devido às crianças não terem recebido a vacina, que posteriormente apanharam o SAR-CoV-2, e seguidamente ficaram doentes com hepatite aguda. A vacina protege!
Por fim, nada disto tem a ver com o estudo da Pfizer.
A Pfizer não fez qualquer estudo sobre a hepatite aguda em crianças.
O estudo a que os negacionistas se referem diz respeito a: “Transcrição reversa intracelular da vacina de mRNA da Pfizer BioNTech COVID-19 BNT162b2 in vitro em linha de células de fígado humano” (artigo científico).
Como diz uma das investigadoras, Yang de Marinis: este “é o primeiro estudo in vitro sobre a conversão da vacina de mRNA em DNA, dentro de células de origem humana”. É um estudo in vitro, em placas de Petri, sobre “se o DNA convertido se integra no DNA das células e ao genoma e, caso positivo, se há alguma consequência”. É só isto.
O estudo não é sobre a vacina alterar o genoma humano.
E nada tem a ver com vacinas causarem hepatite!
Entretanto, quando foram corrigidos, os negacionistas começaram a apontar a outro estudo, aqui.
Os cientistas estudaram o primeiro caso conhecido de uma mulher de 35 anos, que 3 meses após o parto da sua filha, e 1 semana após ser vacinada contra a COVID-19, desenvolveu a hepatite.
Mas este estudo diz textualmente: Não se conseguiu determinar uma relação causal entre a vacina e a hepatite. Pode ser só uma coincidência.
Nas palavras dos investigadores: “As causality cannot be proven, it is possible that this association is just coincidental.”
O que eles tomaram como hipótese foi (transcrito do artigo científico): “severe cases of SARS-CoV-2 infection are characterized by an autoinflammatory dysregulation that contributes to tissue damage. As the viral spike protein appears to be responsible for this, it is plausible that spike-directed antibodies induced by vaccination may also trigger autoimmune conditions in predisposed individuals. In support of this, several cases of ITP have been reported days after COVID-19 vaccination.”
Ou seja, como o SARS-CoV-2 provoca inflamações desreguladas, devido à proteína spike, é possível que anti-corpos produzidos para atacar o vírus baseados nessa proteína (seja pela vacina ou naturalmente pelo corpo) também possam provocar alguma inflamação.
Mas lá está, neste caso, a vacina nunca provocaria problemas mais graves que o próprio vírus.
A verdade, como diz o artigo nas conclusões, é que mesmo esta relação não está determinada: “Whether there exists a causal relationship between COVID-19 vaccination and the development of autoimmune hepatitis remains to be determined.”
Este artigo não mostra qualquer evidência dessa relação.
Por isso, mais uma vez, os negacionistas mentiram ao apontarem este estudo como evidência de que a vacina causa a hepatite.
Podem ler o artigo no Polígrafo, a explicar um pouco mais esta problemática, aqui.
E podem ver o segmento do Polígrafo SIC, sobre esta questão, aqui.
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