A revista Activa de Janeiro de 2012 já está nas bancas.
A Activa é uma revista mensal que se destina ao público feminino.
Esta edição inclui um artigo sobre o suposto fim do mundo em 2012, relacionado com a suposta Profecia Maia.
A jornalista Bárbara Bettencourt contactou-me para ter algumas informações sobre isso.
Esta é parte de uma página, das 4 páginas dedicadas ao tema:
Se quiserem ler tudo, comprem a revista 😉
O artigo está muito bem conseguido.
No entanto, na minha opinião, a entrevista que ela fez foi muito melhor… sendo que as respostas tiveram que ser condensadas por motivos de espaço.
Como havia vários pontos de interesse, cá ficam algumas das respostas que dei, sendo que as perguntas tipo telex que aparecem aqui são da minha inteira responsabilidade de modo a melhor dividir as respostas aqui no blog (as perguntas originais da jornalista foram obviamente muito mais coerentes e estruturadas):
Alinhamento com a galáxia?
A Terra tem uma inclinação de cerca de 23.5 graus. No Solstício de Inverno essa inclinação no Pólo Norte está mais distante do Sol. Isto acontece todos os anos.
A Terra tem também um movimento de Precessão. Este movimento demora cerca de 25.800 anos a completar-se. Não é um movimento que tenha princípio ou fim. Não existe qualquer “ano novo”. É simplesmente um movimento gradual contínuo.
Se se criar uma linha imaginária entre o Sol, a Terra e o centro galáctico, nessa data do Solsticio de Inverno, parece que os 3 estão alinhados nessa data. Na verdade, o movimento de Precessão leva tanto tempo, que parece que já estamos alinhados há vários anos. Para ser ainda mais detalhado, esse alinhamento foi mais preciso (com o centro do Sol) em 1998. Já na altura, os ignorantes andavam a dizer que íamos morrer todos devido a isso. Nada aconteceu nesse ano, ou nos seguintes em que estivemos praticamente alinhados. Não há qualquer efeito do alinhamento. E em 2012 estaremos menos alinhados que em 1998 ou nos anos seguintes.
Passagem pelo plano galáctico?
Já explicado, aqui.
Era do Aquário?
Os signos não fazem sentido, como se pode ler aqui e aqui.
Supostamente uns desenhos no céu afectam os humanos, dependendo da forma como os Humanos unem esses pontos. Se tiver 3 pontos e desenhar um carneiro, é porque é teimosa. Se com os mesmos 3 pontos desenhar uma zebra, é porque gosta do Boavista. Enfim, não faz qualquer sentido.
Há quem incrivelmente imagine que o movimento aparente do Sol nos nossos céus faz com que ao passar por determinados desenhos subjectivos, nós fiquemos com a característica desse desenho. Isto é puro geocentrismo psicológico.
Ainda menos sentido faz quando as constelações (astronómicas) têm tamanhos diferentes. Logo, o Sol não fica nelas 1 mês, mas fica sim tempos diferentes: numas fica mais, noutras fica menos.
O movimento de Precessão da Terra também faz o eixo da Terra inclinar-se para uma determinada constelação um determinado número de tempo. Mede-se (os astrólogos) esse tempo no Equinócio de Primavera, para onde o Sol estiver a apontar nessa altura, de acordo com a inclinação da Terra. Deixe-me repetir o que disse atrás: as constelações têm tamanhos diferentes, logo o Sol no seu movimento aparente fica tempos diferentes em diferentes constelações (astronómicas). Infelizmente, há quem não perceba informação simples. Vai daí, tal como fizeram para os signos, também dividiram as “Eras Astrológicas” em tempos iguais (como se as constelações tivessem o mesmo tamanho). Daí que, segundo eles, cada Era tem 2150 anos (divide-se 25.800 anos de Precessão por 12 signos). Na verdade, os signos são 13 (porque esse é o número de constelações que o Sol passa no seu movimento aparente), mas ninguém quer saber das informações correctas. Como isto não é ciência, mas simplesmente desejos pessoais de quem não está contente com a vida mas não quer fazer nada para modificá-la (prefere esperar por milagres, ou insignificantes alinhamentos que aconteçam no céu), então há opiniões para todos os gostos. Eu desde que nasci que ouço dizer que já vamos entrar na Era de Aquário. Se contar as vezes de que se falou no fim-do-mundo nas últimas décadas, percebe que entramos na Era do Falso Aquário já dezenas de vezes. Aliás, se vir na wikipedia, irá perceber que já andam a dizer isso desde 1884. Aposto que daqui por 100 anos vai-me poder fazer a mesma pergunta. E eu responderei da mesma forma. O Falso Aquário está à espreita…
Mudança no pólo magnético da Terra?
Já explicado, aqui.
Actividade Solar?
O pico será em 2013 (e não em 2012), e as previsões apontam para um máximo bem moderado… o mais moderado dos últimos ciclos. Ou seja, fraquito.
Claro que mesmo assim poderá dar problemas, porque como bem referiu cada vez temos mais tecnologia lá por cima que pode ser “frita” por essas explosões solares. Mas se isso acontecer, é devido à probabilidade desse evento ser maior recentemente devido a haver mais tecnologia em risco, e não por os efeitos solares serem mais fortes que há 11 anos ou há 22 anos atrás.
Impacto de asteróides?
Há poucos fundos e poucas pessoas a trabalhar nesse sistema de detecção.
Os chamados killer asteroids podem não ser aqueles que detectamos.
Deve-se informar?
Essa pergunta sobre se informariam ou não caso soubessem, faço-a aos meus alunos. Supondo que nada haveria a fazer, e soubessem de um “killer asteroid”, avisariam as pessoas? As opiniões dos meus alunos divergem: uns informariam e outros não. Eu sou sincero: provavelmente não. Se não há nada a fazer, então avisar só iria provocar o pânico e muitas mortes antes do evento. No entanto, aqui no blog, costumo contar o que vou sabendo… por isso, se calhar até contava, a bem da verdade.
Penso sobretudo que se fosse eu a decidir, numa primeira fase não diria nada. Com as ferramentas da NASA tentaria primeiro resolver o problema, sem causar o caos em ninguém. Se corresse bem, depois contaria o perigo que tinha sido combatido. Se corresse mal, diria para as pessoas fazerem o que sempre desejaram nos últimos dias de vida.
Penso que era melhor não fomentar o pânico com anos de antecedência… mas aproveitar esse tempo para tentar resolver o problema.
Mas seria virtualmente impossível calar todos os astrónomos amadores. Nem faria sentido. Seria uma estratégia absurda por parte da NASA ou de outras agências.
O perigo é outro!
De qualquer modo, essa é uma questão que acho que nem se vai pôr. Nós não conhecemos a maior parte dos asteróides que poderão bater aqui, e a verdade é que há uma enorme probabilidade de um asteróide bater aqui sem ninguém o ver antes.
É o que tem acontecido por vezes. Em 2009, foi na Indonésia: se em vez de 10 metros, ele tinha 1 km, duvido que estivessemos aqui a fazer perguntas e a responder.
Em 2003, estava eu a dar uma palestra numa escola em Portugal sobre impactos de asteróides, e 4 dias antes tinha passado um asteróide por aqui, que se tivesse batido, tinha acabado com a Humanidade. O asteróide tinha sido detectado 2 dias antes da minha palestra… Ou seja, o asteróide só foi detectado após ter passado pela Terra. Se tivesse batido, ninguém tinha sabido antes. E não foi porque o Governo ou os cientistas não informaram as pessoas – foi mesmo porque ninguém o tinha visto antes.
Estes são o verdadeiro perigo. Todos os asteróides que não conseguimos detectar, e que podem bater aqui.
Não se sabe quando baterá um. Pode ser daqui por um mês. Ou pode ser daqui por 100 milhões de anos. Vai bater de certeza. Só não sabemos quando. E o mais provável é que nem demos por ele…
Parece-me assim que quem acredita que a NASA esconde informações sobre isso, nem sequer se apercebe que esse não é o verdadeiro perigo: o maior perigo não está nos asteróides que a NASA detecte.
Defesa contra impacto de asteróides?
Quanto a podermo-nos defender contra “ataque de asteróides”, com tempo, à distância, é muito fácil desviar asteróides. Basta colocar uma pequena sonda ao lado, atrás, ou à frente do asteróide. A simples gravidade da sonda faria com que o asteróide, respectivamente, se desviasse da Terra, ou se atrasasse (e por isso a Terra já teria passado por esse ponto da órbita), ou se adiantasse (e por isso a Terra ainda não teria chegado a esse ponto da órbita). Por isso, desviar asteróides não é complicado. É preciso é ter tempo para isso. Para vermos o asteróide com tempo, temos que ter muito melhores técnicas de detecção.Mas temos? A ironia das ironias da resposta é que o filme Armageddon custou mais a fazer do que custam os programas de detecção de asteróides que temos actualmente. E agora entravamos no assunto das péssimas escolhas de prioridades feitas pelos centros decisores humanos, sobretudo políticos. Se fossem os cientistas a decidir, tenho a certeza que poriam muito $$$ nesses sistemas de detecções… Como são os políticos, o $$$ é gasto em guerrinhas aqui e acolá. Basta ver que um dia de guerra no Iraque permitiria mais uma missão robótica a Marte que duraria muitos anos. Por isso a pergunta é: deve-se financiar um dia de guerra ou utilizar esse mesmo $$ para explorar o sistema solar durante muitos anos? Os centros decisores, sobretudo políticos, escolhem um dia de guerra. Infelizmente a irracionalidade persiste…
Será isto então uma espécie de roleta russa meteórica?
A expressão é na “mouche”.
Tem muito a ver com a probabilidade de risco.
O risco é mínimo… 1 vez em cada 100 milhões de anos ou algo similar… sendo o risco mínimo e sendo a Terra tão grande (ou seja, pode cair em qualquer lado), é muito difícil convencer um governo de um só país a apostar nisso. Isso são políticas de muito longo prazo. Já a política rege-se pelo curto prazo. Nesta perspectiva, compreende-se a não-aposta.
Exemplo: Vamos supôr que o Bill Clinton, quando era presidente, tinha apostado nisso e gasto milhões de dólares para nos proteger. Tinha sido $$$ deitado fora, porque nada tinha prevenido, porque nada aconteceu.
As coisas não são bem assim em longo prazo… mas no curto prazo é isto que conta.
12 comentários
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Sinceramente o que disse faz todo o sentido, o medo vende, e não é pouco.
Obrigado pelo esclarecimento
Continuação de um bom Trabalho.
Boas.
Sei que não tem nada haver com astronomia, mas gostava de saber se sabe algo sobre o assunto dos bunkers que estão a ser construídos, alias já estão pelos vistos, tem sido ate feito muito transporte de comida la para os bunkers, armamento e tudo isso.
Consegue explicar-me porque essa criação desses bunkers? porque tanto armamento ( tanques e tudo isso ), que esta ser levado para esses túneis subterrâneos? Espero que consiga esclarecer me estas duvidas, porque acho completamente estranho tudo isso, Há alguma razão especifica ?
Espero que possa responder me a estas questões
Agradeço a disponibilidade.
Abraço.
Author
Há vários bunkers que estão a ser construídos por motivos económicos. Porque há sempre pessoas ricas e papalvas a comprarem espaço neles.
http://www.astropt.org/2010/06/30/fim-do-mundo-do-colbert/
http://www.astropt.org/2011/10/07/2012-pornografico/
Quanto a transportes que andam a ser feitos e que se vê em vídeos do Youtube são puras imbecilidades:
http://www.astropt.org/2011/10/29/fema-no-brasil/
Note-se igualmente que estes disparates não são originais. Dizia-se o mesmo em 1997, em 1999, em 2000, em 2003, em 2005, em 2011… enfim, é que nem criativos os vigaristas conseguem ser 😉
abraços 😉
Author
O artigo já está online, aqui:
http://aeiou.activa.pt/vida/sociedade/2012/02/17/2012-o-ano-da-profecia
Excelente artigo 🙂 Tendo em conta que não são uma publicação cientifica e que têm de adaptar a linguagem e os temas ao tipo de publico-alvo que pretendem atingir, a jornalista Bárbara Bettencourt foi excelente nessa conjugação. Já para não falar do limite de espaço que têm, não sendo possível usar tudo. Acho q resumiu na perfeição tudo o q necessitava de ser dito e teve um importante contributo na divulgação de ciência e esclarecimento das pessoas.
Olha, à Bárbara B. eu digo: OBRIGADAAAAAAAA 🙂 Nem ela sabe o quão nos ajuda com artigos inteligentes destes.
Confesso q costumo ler a Activa por isso mesmo. 😛 porque confio nas jornalistas, nomeadamente a Bárbara Bettencourt e a Catarina Fonseca. Por vezes retiro informação e tento assimilar a forma como elas explicam as coisas ao público delas. A Activa não é a revista feminina típica, não é fútil e tem conteúdos muito interessantes.
E a jornalista em questão, bem como a colega Catarina, ou até a nossa Maria João Pratt, são a prova de que há excelentes jornalistas neste bananal. 🙂 Admiro a capacidade q têm de pegar em assuntos q não são da formação delas e em expo-los tão bem e coerentemente.
PARABÉNS E OBRIGADA! :):):)
E, Carlos, boa! 😉 Sempre a esclarecer os leitores 🙂
Ah, mas enganaste a jornalista 😛 toda a gente aqui sabe que és um astrólogo do texas a fazer mestrado em nasseiquê 😀 😀 BAZINGA!
Author
Já agora, para que não restem dúvidas quanto às perguntas tipo telex em cima, elas são da minha responsabilidade.
A jornalista Bárbara Bettencourt foi super-profissional, bastante interessada, muito coerente e completa nas perguntas que fazia, e com uma ideia já bastante estruturada do que queria.
Além disso, teve comentários e interpretações que considerei bastante oportunas e muito inteligentes, como a expressão “espécie de roleta russa meteórica” que foi uma expressão que ela utilizou para definir o risco de impacto de asteróides.
Muito bom! Mas acho que boa parte das leitoras não vai gostar daquilo que disseste sobre a astrologia, é normalmente o público alvo 😛
Author
a parte da astrologia não aparece no artigo 😉
ahahha, pois, essa parte não pode ir… por falta de espaço e porque duvido q a deixassem. O publico-alvo consome isso… têm de ser coerentes e de não ser postas na rua… 🙁
Excelente, interessante ver que revistas que regra geral são associadas a alguma futilidade de pensamento se preocupem em informar os seus leitores recorrendo a pessoas que sabem e não a pessoas que se limitam a dizer que sabem.
Excelente!
Carlos Oliveira, o seu trabalho na “desmistificação” do fim do mundo é, como todos conhecemos, magnifico e altamente meritório.
O cuidado da jornalista Bárbara Bettencourt, merece, na minha opinião, uma saudação pelo profissionalismo que demonstrou, documentando-se junto de fontes crediveis, logo, o meu aplauso pelo seu trabalho, contrapondo com outros pseudo-jornalistas, capazes de, com total iressponsabilidade, quer pesooal, quer editorial, em publicações pseudo classificadas, como “referências” , de “alinhavarem” as mais “grotescas” – ‘afirmações’ – que conduzem os seus leitores para a total “desinformação”.
Boa, pode ser que as/os leitoras/leitores acreditem menos em tarólogas, astrologia, pseudociências e afins. 🙂
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