“Uma mentira dita mil vezes torna-se verdade”. Atribuída ao Ministro da Propaganda da Alemanha Nazista, Joseph Goebbels, essa frase parece se adequar com extrema precisão a uma tendência presente em redes sociais e outros segmentos da Internet: a propagação de conteúdos fraudulentos. Estes são conhecidos como “hoax”, termo inglês que significa farsa, trote, pregar uma peça.
Em muitas ocasiões, tais materiais emergem com uma conotação caricata. No ano passado, uma montagem envolvendo o ex-Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, era compartilhada à exaustão em mídias sociais. Na foto, o político lia um livro (o Aleph, de Paulo Coelho) de cabeça para baixo. Detalhe é que tal material fora editado por um anônimo a partir de uma foto publicada pelo próprio Coelho em seu perfil no Twitter, em 2010, na qual Lula segurava (corretamente) a obra.
Deparar-se com a propagação de mentiras ainda mais espetaculosas e alarmistas que essa, contudo, está distante de ser algo incomum na Internet. Sobram histórias dignas de produções cinematográficas de Hollywood. E a astronomia – ou melhor, a pseudoastronomia – é um prato cheio aos falsificadores da web.
Nibiru, duas Luas no céu, bloqueio da luz solar pelo cometa Elenin, alinhamentos planetários capazes de causar terremotos devastadores na Terra, tempestades solares com potencial para destruir o Planeta, fim do mundo… “Sempre houve o medo ‘que o céu caísse sobre nós’”, ressalta o astrônomo, educador científico e coordenador-geral do blog AstroPT, Carlos Oliveira. “O terror vindo dos céus, assim como o medo em figuras celestes, sempre estiveram presentes na mitologia humana”.
Um exemplo notório de farsa na Grande Rede relacionada à astronomia é Hideaway. Claro que seu conteúdo não se enquadra no perfil apocalíptico dos disparates mencionados no parágrafo anterior. No entanto, mais de sete anos já se passaram desde as primeiras disseminações da imagem por fóruns, blogs e, até mesmo, e-mails. Ainda é comum vê-la compartilhada em redes sociais sob a atribuição que possuía em 2006: a de que se trata de um registro do “pôr do Sol no Polo Norte”.
A realidade, claro, é outra.
Hideaway é uma ilustração desenvolvida por uma estudante alemã de física, chamada Inga Nielsen, por meio do Terragen, software de desenho para criação de paisagens. Fascinada por ficção científica, Inga possui vários trabalhos semelhantes a Hideaway. Alguns destes, aliás, podem ser encontrados em seu site (www.gatetonowhere.de). “Faço arte digital há anos”, afirma a alemã. “Ela permite que eu visualize meus sonhos”.
Em meio à polêmica causada pela imagem, o site da agência espacial norte-americana Nasa publicou Hideaway, mais precisamente no canal de fotos diárias sobre astronomia, em 2006. E, logicamente, tratou de “desmitificar” a obra. “Tal cena não poderia existir em lugar algum da Terra, pois nosso Planeta, a Lua e o Sol sempre tem quase o mesmo tamanho angular. Isto fica claro, por exemplo, durante eclipses”.
Mentira a um simples clique
Para Łukasz Dębowski, físico e linguista polonês, o segredo do sucesso para que uma farsa pareça verdade está em transmitir a ideia com uma frase curta. E repeti-la inúmeras vezes. Nesse contexto, as redes sociais parecem o cenário ideal para espalhar mentiras em larga escala. Há muito público: o Twitter, por exemplo, possui mais de 500 milhões de contas; já o Facebook ultrapassou a marca de um bilhão de usuários ativos em 2012.
Entretanto, a questão não se restringe a números. “As redes sociais são o cenário ideal para esse tipo de mensagem, pois todo mundo busca ser descolado, antenado e o centro das atenções”, alerta o especialista em Internet e publicitário Camilo Coutinho. “Por isso, muitas vezes, os usuários propagam mensagens absurdas. É mais ou menos como uma disputa de ‘eu vi primeiro’”.
A rapidez e a facilidade oferecidas pelas redes sociais no compartilhamento de conteúdos também são pontos que fazem com que esses sites sejam poderosos vetores para propagação de fraudes. Bastam alguns cliques para que os usuários possam espalhar uma mensagem e assim se tornarem “fontes”, eventuais formadores de opinião. Em abril do ano passado, no Twitter, um boato indicava a morte do vocalista da banda de rock Guns N’ Roses, Axl Rose. Pouco tempo bastou para se tornar assunto mais comentado no microblog. Diante da repercussão, a assessoria do norte-americano emitiu, pela própria rede social, um breve comunicado, no qual afirmava que Axl estava vivo – e passava bem.
Em junho deste ano, foi a vez de Nelson Mandela “morrer” nas redes sociais. Muitos caíram nas enganações, inclusive o tenista espanhol Rafael Nadal. “Hoje perdemos uma das pessoas mais relevantes de nosso mundo. Descanse em paz #nelsonmandela”, tuitou o atual número dois do ranking da ATP. Logo, reparou o equívoco e tratou de esclarecê-lo.
O ministro da Cultura do Chile, o escritor Roberto Ampuero, também caiu na farsa.
Muito além das redes sociais
Apesar do poder de disseminação de conteúdos e da enorme popularidade, o segmento de redes sociais está longe de ser a única praça aos falsificadores na Web. “As grandes farsas online ganharam muito mais relevância e adeptos quando utilizam todas as ferramentas (mídias sociais, e-mail, sites, etc.) juntas”, ressalta Camilo Coutinho. “Parece uma receita, mas é cada vez mais comum ver a estratégia dos criadores de hoax em disseminar um pouquinho de cada ponto da mentira em cada ferramenta”.
Assim como ocorre com as redes sociais, os números impressionam quando o assunto é e-mail. Inclusive os relacionados aos famigerados spams. Conforme mensuração efetuada pela empresa de segurança virtual Trend Micro, em 2011, nada menos que 102 milhões de e-mails indesejados foram registrados em um único dia (14 de janeiro).
Segundo a companhia, estima-se que a marca anual brasileira seja de 300 milhões de spams. Em 80% desses casos, o objetivo dos remetentes é o roubo de informações bancárias dos internautas. Para isso, são desenvolvidos diversos meios para atrair a atenção dos destinatários: desde o envio de notificações de prêmio em loterias até notícias impactantes, em “primeira mão”. “Os grandes hoax nasceram no e-mail e ainda existem, mesmo com os filtros anti-spam cada vez mais fortes”, ressalta Coutinho.
No caso de farsas, onde o único interesse dos falsificadores é pregar peças aos demais internautas, qual seria o “atrativo” – sobretudo em conta que geralmente são efetuadas em anonimato? “Cada caso é um caso”, define a professora de filosofia e escritora Ivy Judensnaider. “Há casos de pessoas que criam novas personas, mantendo a própria identidade em uma condição de anonimato. A pessoa pode estar se protegendo, se o produto criado for ousado ou controverso demais. O benefício ao autor, então, seria o de conseguir maior liberdade no ato de criação, aí desvinculada do contexto de uma autoria já conhecida e ‘decifrada’ pelo público”. Aliás, você pode conferir a opinião completa de Ivy sobre o assunto no blog AstroPT.
Logicamente, não devemos nos culpar se, em dada altura, compartilhamos – ou simplesmente acreditamos – em conteúdos falsos. No entanto, vale sempre ter em mente que o fato de um conceito ser muito difundido, qualquer seja o segmento de comunicação, não representa prova inequívoca de sua credibilidade. “Não só para a astronomia, mas para qualquer pessoa em qualquer área em que não seja especialista, deve pesquisar em várias fontes credíveis para saber sobre a validade da notícia”, indica Carlos Oliveira.
4 comentários
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Falando em mentiras
http://aquariuspage.blogspot.com.br/2013/09/iapetus-nave-mae-orbita-saturno.html
“Estes são conhecidos como “hoax”, termo inglês que significa trote, pregar uma peça.”
?????
Hoax quer dizer embuste. Trote é um andamento do cavalo.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Trote_%28tro%C3%A7a%29
abraços
Mais sobre o Tema..
Li por aê.. hoje (1/10/13) é mais um fim do mundo!! hehe
tinha que ser feriado, esses fins de mundo né
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